terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Caverna de Ali Babá

É curioso como os preconceitos desumanizam. Ficamos estarrecidos com o ato terrorista que, na Alemanha, invadiu uma feira de Natal e ao ver as imagens, em São Paulo, de um vendedor ambulante sendo cruelmente pisoteado por dois assassinos. Mas quem se importa com a morte de dezenas de presos na penitenciária de Manaus?

Os mortos em Berlim eram gente como a gente. O ambulante paulista, um trabalhador honesto que ganhava a vida no comércio informal. Mas e os presos? Não vemos autoridades públicas proclamarem, sem o menor pudor, que “bandido bom é bandido morto”? A Justiça de São Paulo não considerou que o massacre do Carandiru, que deixou 111 mortos, foi apenas um “ato de legítima defesa” da PM?

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Ao preconceito étnico que sonega ao preso a sua condição humana para reduzi-lo a mero “elemento” ou “verme” soma-se o de classe. Se amanhã houver uma rebelião na penitenciária de São Carlos do Pinhal (PR) e um único preso da Lava Jato morrer no confronto, então será um deus nos acuda!

O Brasil necessita urgente de uma profunda reforma do sistema prisional. Todos sabem que a omissão do poder público, contentando-se em usá-lo como mero depósito de presos, favorece o empoderamento de facções criminosas. Dentro das grades elas se organizam para comandar o crime aqui fora e assim obter recursos para pagar advogados, corromper funcionários públicos, fomentar o tráfico de drogas e comprar armas.

Em suma, nossas penitenciárias são a caverna do Ali Babá. Embora a chave da caverna esteja nas mãos da Justiça, lá de dentro ele comanda o crime aqui fora, e quem o mantém preso quase nada faz para resgatá-lo à sociedade.

Quando já nem os sinos dobram por homens entregues ao cuidado do poder público é sinal de que a nossa humanidade se esvai na cegueira, na surdez e na indiferença.

Frei Betto

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