quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Banalização da violência

Ao lado da crise política e econômica que se abateu sobre o Brasil, outra tragédia maior se destaca no ano que se inicia. A banalização da morte provocada pela violência. A leitura dos jornais diários, com suas informações sobre o país selvagem em que nos tornamos, é um verdadeiro soco no estômago. Assistir ao noticiário da televisão rouba o sono de qualquer pessoa com um mínimo de noção de civilidade. Dois jovens espancando até a morte, no metrô de São Paulo, um ambulante que tentou defender homosexuais , é das cenas mais dantescas dos últimos tempos. Cada pancada, cada pontapé na cabeça do homem já caído no chão ressoa na consciência dos que ainda preservam lucidez.

Mas não se ouve uma voz oficial sobre o ocorrido. É como se esse tipo de crime fosse completamente aceitável no nosso dia a dia, não havendo razão para providências capazes de impedi-lo, ou ao menos dificultá-lo. Nenhuma reflexão por parte das nossas lideranças políticas sobre as razões para o crescimento desse tipo de violência. Estão todos muito ocupados com a próxima eleição dos Presidentes da Câmara e do Senado e no loteamento dos cargos das suas mesas diretoras. Os dois assassinos foram detidos, é verdade, mas com certeza logo estarão nas ruas novamente. Há também os casos patológicos, como o homem que assassinou 12 pessoas da mesma família, incluindo um filho de oito anos e a ex-esposa. Parece que ninguém fica mais chocado com essas mortes brutais. Anestesia geral. Pelo menos, enquanto não forem atingidos pessoalmente.

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Cerca de 60 presos foram mortos numa penitenciária de Manaus. Logo invocadas as repetidas explicações creditando a carnificina à disputas de quadrilhas ligadas ao tráficos. Uma cadeia com capacidade para apenas 580 pessoas encerrava amontoadas, no momento da tragédia, cerca de1800. Mas a culpa é dos traficantes ali detidos e não da falta de interesse dos nossos dirigentes em resolver os graves problemas das penitenciárias brasileiras e todos os demais que interessam à maioria da população. Não é de hoje que pessoas mais responsáveis e especialistas no assunto denunciam esses fatos, mas somente quanto ocorre a repetição de um novo Carandiru, noticiado pela imprensa, é que as autoridade se manifestam Afinal,precisam dizer qualquer coisa aos jornalistas.

O Ministro da Justiça se dispõe até a enviar forças especiais e a aceitar a transferência de alguns dos delinqüentes para prisões federais. Não é caso para rir, mas ele até vai lá. É claro que não será isso que vai resolver o problema, mas como a autoridade não quer ficar mal na fotografia, é preciso marcar presença, com toda certeza amplamente divulgada pela assessoria de imprensa do Ministério. Mas esse assunto, que logo será esquecido, não interessa aos nossos dirigentes e políticos, ocupados que estão com questões que consideram mais importantes para sua sobrevivência eleitoral.

Em meio a quase 3000 mil acidentes nas rodovias brasileiras, nesse final de ano, cerca de 10% resultaram em mortes, mas isso também virou nota de rodapé. Mais grave é que estamos todos ficando acostumados com a violência, assassinatos brutais, mortes torpes, atrocidades e o estado de barbárie que se implantou no Brasil. Este é um dos mais acentuados sinais do abismo onde caímos. E que mais uma vez expõe o país à critica da imprensa internacional por tão insólitos e macabros acontecimentos. Aos quais se soma o assassinato do Embaixador da Grécia, em circunstâncias que chocaram o mundo civilizado.

É possível apontar dezenas de causas e explicações para esse estado de coisas, mas, entre elas, destaca-se a desigualdade social que tornou o Brasil um local onde sentimos medo,insegurança,desamparo e falta de perspectiva. A desigualdade social é altamente corrosiva e alimenta mais violência. A desigualdade apodrece a sociedade internamente. A repercussão da alta concentração de riqueza no país levou algum tempo para se desnudar. Mas já não é possível deixar de enxergar suas terríveis conseqüências.

Cada vez mais os poucos que detém o máximo de riqueza experimentam uma crescente sensação de superioridade, proporcional aos seus bens materiais. Indiferentes e obstruindo iniciativas capazes de reverter essa situação, prosseguem na sua trajetória egoísta como se fosse impossível construir um mundo melhor e mais justo. Cristalizam-se os preconceitos contra os mais pobres, agravando todas as formas de violência contra o ser humano. A herança da criação desregulada da riqueza é atualmente nosso maior legado.

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