O ano de 2016 não foi o de nossos sonhos. Cobramos muito dos políticos, dos juízes e dos empreiteiros. Cobramos ética, honestidade, austeridade, caráter, cidadania. O Brasil atravessa crise de valores. Pode ser positiva no final. Se temos instrução e dinheiro – raro privilégio no Brasil –, precisamos fazer nossa parte como pais e mães.
Não estamos fazendo.
Um exemplo são as festas nababescas e regadas a coma alcoólico, organizadas no Rio de Janeiro pela empresa FormaIdeal Obah para a formatura, no ensino médio, de jovens e adolescentes. Publiquei em ÉPOCA, em 2014, “Uma elite perdida”, sobre a festa de R$ 800 mil do Santo Inácio. A elite citada se descabelou, me xingou. Pais e rebentos do Santo Inácio se reuniram, o reitor soltou uma nota.
Interessante é que, agora, houve uma cisão dos alunos do Santo Inácio – uma ala consciente celebrou a formatura com festa bem mais modesta. A Forma ignorou o ano da crise: 180 pais do Santo Inácio pagaram R$ 2.700 para participar. E foram vendidos 2 mil convites avulsos de R$ 300. Ou seja, R$ 1.086.000, por baixo, foram arrecadados pela Forma com os convites. A Forma não tem nada de “Ideal”. Só de “Obah”.
A festa do PH, colégio cujo slogan é “Escreva seu futuro com PH”, foi descrita pela jornalista Kika Gama Lobo em seu perfil no Facebook. Eis trechos de seu depoimento de mãe de meninas com juízo. Mãe trabalhadora e “quase solteira”, agora casada pela segunda vez, Kika nunca foi careta, mas se chocou com o clima de Sodoma e Gomorra.
“Foi uma superprodução tipo Hollywood. Paguei caríssimo, em 12 vezes. Linda decoração, comida a rodo, rodízio de japonês, som de prima, vestidos de Oscar, rapazes de tuxedo, mas me pergunto: pra que tanta bebida? Vi quatro ilhas de vodkas, cervejas, espumantes, drinks, energéticos – tipo festa de Bacco. A certa hora eram zumbis sacolejantes, com olhares perdidos dando PT (na gíria deles, ‘perda total’, nada a ver com partido, se bem que podia ser). Uma excitação forçada, uma alegria de gôndola, garotos e garotas vulgarmente em transe... (...) Vi meninas dançando em cima de pufes, vestidos curtíssimos, saltos altíssimos, decotes profundos – balinhas rolando, maconha no ar, mistura de etílicos, o som de proibidões que bradavam a cultura da bunda, do sexo, da droga, das armas, e as patricinhas se igualando a meninas da periferia em gingado e atitudes. No banheiro, a imagem da decadência, com vômitos e sujeira. (...) Eles já não tinham mais sapato, gravatas, enfeites do cabelo, bolsas... eram apenas corpos entregues... Os meninos pareciam lobos, caçando... As presas estavam ali. (...) Na volta, na fila do táxi, meninas sozinhas ou em duplas – seminuas e alteradas pela bebida – entrando nos ubers da vida... (...) Ainda acho que temos de educar melhor nossos filhos. Me incluo nisso. Passei tempo demais fora de casa, trabalhando, me desculpando por isso...” A festa do PH se intitulou “Reborn of the Sphinx”. Existe tema mais cafona – e num inglês totalmente errado, porque o certo seria “Rebirth of the Sphinx”? Vamos checar algumas regras da Forma para curtir saudavelmente essas festas cheias de menores.
■ Não jurarás amor, mas jurarás pinga.
■ Valorizarás cada GOTA de bebida.
■ O juízo perderás.
■ Se manterás impuro.
■ Não se preocuparás com o que a sociedade pensará.
■ Sarrarás.
■ Rebolarás o bumbum.
■ Com a língua, matarás.
■ Jamais se intimidarás com grandes copos e grandes doses, pois dessas demonstrações de coragem (sic) virão os grandes porres e a noite mais épica da sua vida.
Depois de publicar “Uma elite perdida”, recebi mensagem de um médico, Manuel Alexandre da Silva, que trabalhava no Hospital Municipal da Mulher Fernando Magalhães, referência em atendimento a vítimas de violência sexual:
“Atendemos no fim de 2013 uma adolescente de 15 anos, uma americana, filha de pai brasileiro que tinha vindo passar as festas de fim de ano com os parentes no Rio. Levada por sua prima à festa de formatura do colégio Santo Inácio, após embriagar-se, foi levada da festa por um desconhecido que a estuprou no interior de um táxi. Desnecessário comentar as condições psicológicas desta menor e de seus pais, diante de tamanha brutalidade. Parabéns pelo artigo, que espero repercutir nas consciências dos pais que patrocinam tal descalabro”.
Os pais que ousam criticar custos e formato das festas da FormaIdeal são expulsos da organização. Mas pagam a festa. Capitulam, por medo de desgostar os filhos e por achar a festa importante para “o futuro profissional dos filhos”. Não, nós não estamos fazendo nosso papel – e não adianta exigir da escola ou dos governos o que somos incapazes de fazer em casa. Vamos mudar para poder protestar.
Não estamos fazendo.
Um exemplo são as festas nababescas e regadas a coma alcoólico, organizadas no Rio de Janeiro pela empresa FormaIdeal Obah para a formatura, no ensino médio, de jovens e adolescentes. Publiquei em ÉPOCA, em 2014, “Uma elite perdida”, sobre a festa de R$ 800 mil do Santo Inácio. A elite citada se descabelou, me xingou. Pais e rebentos do Santo Inácio se reuniram, o reitor soltou uma nota.
Interessante é que, agora, houve uma cisão dos alunos do Santo Inácio – uma ala consciente celebrou a formatura com festa bem mais modesta. A Forma ignorou o ano da crise: 180 pais do Santo Inácio pagaram R$ 2.700 para participar. E foram vendidos 2 mil convites avulsos de R$ 300. Ou seja, R$ 1.086.000, por baixo, foram arrecadados pela Forma com os convites. A Forma não tem nada de “Ideal”. Só de “Obah”.
A festa do PH, colégio cujo slogan é “Escreva seu futuro com PH”, foi descrita pela jornalista Kika Gama Lobo em seu perfil no Facebook. Eis trechos de seu depoimento de mãe de meninas com juízo. Mãe trabalhadora e “quase solteira”, agora casada pela segunda vez, Kika nunca foi careta, mas se chocou com o clima de Sodoma e Gomorra.
“Foi uma superprodução tipo Hollywood. Paguei caríssimo, em 12 vezes. Linda decoração, comida a rodo, rodízio de japonês, som de prima, vestidos de Oscar, rapazes de tuxedo, mas me pergunto: pra que tanta bebida? Vi quatro ilhas de vodkas, cervejas, espumantes, drinks, energéticos – tipo festa de Bacco. A certa hora eram zumbis sacolejantes, com olhares perdidos dando PT (na gíria deles, ‘perda total’, nada a ver com partido, se bem que podia ser). Uma excitação forçada, uma alegria de gôndola, garotos e garotas vulgarmente em transe... (...) Vi meninas dançando em cima de pufes, vestidos curtíssimos, saltos altíssimos, decotes profundos – balinhas rolando, maconha no ar, mistura de etílicos, o som de proibidões que bradavam a cultura da bunda, do sexo, da droga, das armas, e as patricinhas se igualando a meninas da periferia em gingado e atitudes. No banheiro, a imagem da decadência, com vômitos e sujeira. (...) Eles já não tinham mais sapato, gravatas, enfeites do cabelo, bolsas... eram apenas corpos entregues... Os meninos pareciam lobos, caçando... As presas estavam ali. (...) Na volta, na fila do táxi, meninas sozinhas ou em duplas – seminuas e alteradas pela bebida – entrando nos ubers da vida... (...) Ainda acho que temos de educar melhor nossos filhos. Me incluo nisso. Passei tempo demais fora de casa, trabalhando, me desculpando por isso...” A festa do PH se intitulou “Reborn of the Sphinx”. Existe tema mais cafona – e num inglês totalmente errado, porque o certo seria “Rebirth of the Sphinx”? Vamos checar algumas regras da Forma para curtir saudavelmente essas festas cheias de menores.
■ Não jurarás amor, mas jurarás pinga.
■ Valorizarás cada GOTA de bebida.
■ O juízo perderás.
■ Se manterás impuro.
■ Não se preocuparás com o que a sociedade pensará.
■ Sarrarás.
■ Rebolarás o bumbum.
■ Com a língua, matarás.
■ Jamais se intimidarás com grandes copos e grandes doses, pois dessas demonstrações de coragem (sic) virão os grandes porres e a noite mais épica da sua vida.
Depois de publicar “Uma elite perdida”, recebi mensagem de um médico, Manuel Alexandre da Silva, que trabalhava no Hospital Municipal da Mulher Fernando Magalhães, referência em atendimento a vítimas de violência sexual:
“Atendemos no fim de 2013 uma adolescente de 15 anos, uma americana, filha de pai brasileiro que tinha vindo passar as festas de fim de ano com os parentes no Rio. Levada por sua prima à festa de formatura do colégio Santo Inácio, após embriagar-se, foi levada da festa por um desconhecido que a estuprou no interior de um táxi. Desnecessário comentar as condições psicológicas desta menor e de seus pais, diante de tamanha brutalidade. Parabéns pelo artigo, que espero repercutir nas consciências dos pais que patrocinam tal descalabro”.
Os pais que ousam criticar custos e formato das festas da FormaIdeal são expulsos da organização. Mas pagam a festa. Capitulam, por medo de desgostar os filhos e por achar a festa importante para “o futuro profissional dos filhos”. Não, nós não estamos fazendo nosso papel – e não adianta exigir da escola ou dos governos o que somos incapazes de fazer em casa. Vamos mudar para poder protestar.
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