domingo, 31 de julho de 2016
Um breve exercício de cidadania
Embora timidamente, a reforma política parece estar retornando à agenda nacional. A questão de fundo permanece: não é a sociedade que diz aos congressistas como quer ser representada, eles é que dizem a ela como pretendem seguir se autorrepresentando. Ainda assim – ou exatamente por isso –, penso que seria útil a cidadania saudar o reaparecimento da questão enviando um breve exercício aos excelentíssimos senhores deputados e senadores.
Dou por inegável que a atual classe política rebaixou a vida partidária brasileira a um nível sem precedentes, mesmo pelos sabidamente frouxos padrões da nossa República.
Considere-se, por exemplo, a proliferação de siglas, que se acelerou na última eleição e parece fadada a fugir ao controle nas próximas. No momento, salvo melhor juízo, há 26 partidos representados na Câmara dos Deputados, 32 registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e outros 30, segundo consta, na fila, esperando por registro. Numa primeira aproximação, o número de siglas pode ser examinado sob duas diferentes perspectivas.
A teoria da representação proporcional recomenda um amplo pluralismo, pois se baseia no pressuposto de que as agremiações existem para dar voz a ideologias ou a interesses consistentes e preexistentes na sociedade. Além de antidemocrático, restringir-lhes o número seria disfuncional para o sistema político, pois implicaria alijar do Parlamento correntes de ideias e grupos importantes, dificultando, em vez de facilitar, o manejo dos conflitos que lavram continuamente na sociedade.
A segunda perspectiva não é necessariamente oposta à que venho de expor. Afirma que cada caso é um caso, podendo existir algum país onde as coisas se passem como foi mencionado, devendo-se, pois, aceitar a proliferação como um mal menor que a exclusão de interesses relevantes. Mas, como disse, cada caso é um caso.
No Brasil, decorridas três décadas do restabelecimento do regime civil, é forçoso reconhecer que o pluralismo partidário se transformou de fato na pilhéria prevista já ao tempo da Comissão Afonso Arinos, em 1985-1986, à qual coube a tarefa de elaborar um anteprojeto de Constituição. Neste ano da graça de 2016, todas ou quase todas as 32 siglas registradas se declaram de centro-esquerda; duas dúzias, pelo menos, são rechaçadas com o cabível sarcasmo pela maioria do eleitorado, que nelas não discerne um vestígio sequer de seriedade. Não foi por acaso que, desde 2013, a opinião pública optou por se manifestar na avenida; declarou que a praça é do povo como o céu é do condor. Engajando-se numa memorável onda de protestos, manteve todos os partidos a uma asséptica distância.
Esta é, pois, a situação: o Brasil chegou ao século 21 com um sistema político institucionalmente razoável, extremamente generoso, direi mesmo permissivo, no tocante à abrangência do sufrágio e às facilidades para a criação de partidos, mas deficiente, para não dizer fraudado e fraudulento, noutros aspectos cruciais do regime político que denominamos democracia representativa.
Acontece – e aqui retomo a segunda perspectiva – que nenhum regime político ou sistema de governo existe para lidar com apenas uma ou com umas poucas necessidades. Todos são multipurpose, ou seja, existem para e são de fato forçados a lidar ao mesmo tempo com numerosos objetivos e valores. Objetivos e valores nem sempre compatíveis entre si, diga-se de passagem. Eis por que, se me permitem invocar brevemente o conselheiro Acácio, governo tem de governar escolhendo os objetivos que esteja de fato disposto a implementar e ignorando ou rechaçando os que não esteja.
Pelo menos em dois momentos, portanto, a importância dos partidos políticos deve ser ressaltada. Primeiro, cumpre-lhes refletir a diferenciação subjacente de interesses e ideologias, caso ela exista, ou estabelecer balizas para que ela se constitua – obviamente, dentro de limites, em se tratando de um regime democrático. Nessa função, se não querem ser cúmplices no fraudar a vontade popular, os partidos têm de ser estáveis no que toca a suas formas de organização e liderança, e doutrinariamente inteligíveis – o que nem de longe significa rigidez ou fanatismo ideológico. O segundo momento, ou função, é o que pedantemente se costuma chamar de governabilidade. Assim como devem ajudar a organizar a opinião pública, os partidos devem também organizar as correntes parlamentares, incutindo nelas a altivez necessária para defender a instituição legislativa, mas também flexibilidade para colaborar com o Executivo no que este tiver de sério a propor.
Isto posto, volto à ideia de enviar aos nossos representantes um breve exercício de cidadania. Não incluiria nele os cidadãos sinceramente satisfeitos com a situação atual: os que se sentem bem servidos com o funcionamento atual da representação proporcional e do pluripartidarismo. Aos insatisfeitos e aos que se encontram em dúvida, eu proporia algumas indagações. Dada a complexidade do tema, limitaria minha enquete a detentores de diplomas universitários em nível de pós-graduação.
Primeira indagação: indique os nomes de metade (16) das 32 siglas registradas. Segunda: descreva (genericamente...) as ideologias ou os interesses que as referidas 16 se propõem a representar. Terceira: as principais lideranças de cada uma.
Meu teste nada tem de malicioso. Se a razão de termos 32 siglas registradas e outras tantas na linha de montagem é a necessidade de dar voz a ideologias, interesses ou projetos consistentes, parece-me razoável indagar se pelo menos a faixa mais escolarizada do País as conhece. Caso contrário, não estará na hora de adotarmos cláusulas legais fortemente redutoras, que nos ajudem a construir um sistema político mais sério?
Bolívar Lamounier
Dou por inegável que a atual classe política rebaixou a vida partidária brasileira a um nível sem precedentes, mesmo pelos sabidamente frouxos padrões da nossa República.
Considere-se, por exemplo, a proliferação de siglas, que se acelerou na última eleição e parece fadada a fugir ao controle nas próximas. No momento, salvo melhor juízo, há 26 partidos representados na Câmara dos Deputados, 32 registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e outros 30, segundo consta, na fila, esperando por registro. Numa primeira aproximação, o número de siglas pode ser examinado sob duas diferentes perspectivas.
A segunda perspectiva não é necessariamente oposta à que venho de expor. Afirma que cada caso é um caso, podendo existir algum país onde as coisas se passem como foi mencionado, devendo-se, pois, aceitar a proliferação como um mal menor que a exclusão de interesses relevantes. Mas, como disse, cada caso é um caso.
No Brasil, decorridas três décadas do restabelecimento do regime civil, é forçoso reconhecer que o pluralismo partidário se transformou de fato na pilhéria prevista já ao tempo da Comissão Afonso Arinos, em 1985-1986, à qual coube a tarefa de elaborar um anteprojeto de Constituição. Neste ano da graça de 2016, todas ou quase todas as 32 siglas registradas se declaram de centro-esquerda; duas dúzias, pelo menos, são rechaçadas com o cabível sarcasmo pela maioria do eleitorado, que nelas não discerne um vestígio sequer de seriedade. Não foi por acaso que, desde 2013, a opinião pública optou por se manifestar na avenida; declarou que a praça é do povo como o céu é do condor. Engajando-se numa memorável onda de protestos, manteve todos os partidos a uma asséptica distância.
Esta é, pois, a situação: o Brasil chegou ao século 21 com um sistema político institucionalmente razoável, extremamente generoso, direi mesmo permissivo, no tocante à abrangência do sufrágio e às facilidades para a criação de partidos, mas deficiente, para não dizer fraudado e fraudulento, noutros aspectos cruciais do regime político que denominamos democracia representativa.
Acontece – e aqui retomo a segunda perspectiva – que nenhum regime político ou sistema de governo existe para lidar com apenas uma ou com umas poucas necessidades. Todos são multipurpose, ou seja, existem para e são de fato forçados a lidar ao mesmo tempo com numerosos objetivos e valores. Objetivos e valores nem sempre compatíveis entre si, diga-se de passagem. Eis por que, se me permitem invocar brevemente o conselheiro Acácio, governo tem de governar escolhendo os objetivos que esteja de fato disposto a implementar e ignorando ou rechaçando os que não esteja.
Pelo menos em dois momentos, portanto, a importância dos partidos políticos deve ser ressaltada. Primeiro, cumpre-lhes refletir a diferenciação subjacente de interesses e ideologias, caso ela exista, ou estabelecer balizas para que ela se constitua – obviamente, dentro de limites, em se tratando de um regime democrático. Nessa função, se não querem ser cúmplices no fraudar a vontade popular, os partidos têm de ser estáveis no que toca a suas formas de organização e liderança, e doutrinariamente inteligíveis – o que nem de longe significa rigidez ou fanatismo ideológico. O segundo momento, ou função, é o que pedantemente se costuma chamar de governabilidade. Assim como devem ajudar a organizar a opinião pública, os partidos devem também organizar as correntes parlamentares, incutindo nelas a altivez necessária para defender a instituição legislativa, mas também flexibilidade para colaborar com o Executivo no que este tiver de sério a propor.
Isto posto, volto à ideia de enviar aos nossos representantes um breve exercício de cidadania. Não incluiria nele os cidadãos sinceramente satisfeitos com a situação atual: os que se sentem bem servidos com o funcionamento atual da representação proporcional e do pluripartidarismo. Aos insatisfeitos e aos que se encontram em dúvida, eu proporia algumas indagações. Dada a complexidade do tema, limitaria minha enquete a detentores de diplomas universitários em nível de pós-graduação.
Primeira indagação: indique os nomes de metade (16) das 32 siglas registradas. Segunda: descreva (genericamente...) as ideologias ou os interesses que as referidas 16 se propõem a representar. Terceira: as principais lideranças de cada uma.
Meu teste nada tem de malicioso. Se a razão de termos 32 siglas registradas e outras tantas na linha de montagem é a necessidade de dar voz a ideologias, interesses ou projetos consistentes, parece-me razoável indagar se pelo menos a faixa mais escolarizada do País as conhece. Caso contrário, não estará na hora de adotarmos cláusulas legais fortemente redutoras, que nos ajudem a construir um sistema político mais sério?
Bolívar Lamounier
Lula culpa o Brasil
Fingir que não é com ele, mentir para livrar a sua cara e a sua pele são traços impressos na personalidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sempre foi assim. Desde os palanques de São Bernardo do Campo -- quando recitava palavras de ordem óbvias diante da massa e de uma ditadura que lhe era dócil --, até à quase inacreditável petição contra o Estado brasileiro que impetrou, na quinta-feira, junto à Comissão de Direitos Humanos da ONU. Uma alma narcisa que só pensa em si. Que xinga e elogia, soca e abraça por conveniência e só age na primeira pessoa.
O mesmo Lula que em 1993 escorraçou a Câmara dos Deputados afirmando que ela abrigava “300 picaretas” dedicou loas à Casa, 10 anos depois, ao receber a Suprema Distinção Legislativa: “não existe nada mais nobre que um mandato parlamentar”.
Pouco despois de se eleger em 2002, desfilou de braços dados com José Sarney, a quem já acusara de ser “grileiro”. Adulou Renan Calheiros para ficar em pé durante o processo do mensalão; bajulou Paulo Maluf – que já fora o mal em si – para eleger Fernando Haddad, o prefeito mais impopular que São Paulo já teve.
Algumas lembranças do Lula de ocasião fazem arrepiar até a esquerda cativa que ainda hoje o aplaude. Collor de Mello que o diga. A entrevista ao Bom Dia Brasil, na TV Globo, pouco antes de ser eleito presidente da República pela primeira vez, é simbólica. Ali, elogiou, em alto e bom som, os governos de Garrastazu Médici e Ernesto Geisel, que “pensavam o Brasil estrategicamente”. E discordou de bate-pronto da afirmativa do entrevistador sobre as altas taxas de inflação que os generais deixaram como herança. “Não é verdade”, assegurou.
Depois de vencer a eleição, Lula soltou ainda mais a verve. Fez do hoje condenado e preso José Dirceu o “capitão do time”, para depois puxar-lhe o tapete. Foi a público, em cadeia de rádio e TV, pedir desculpas pela traição dos seus no escândalo do mensalão, ocorrência que, meses depois, passou a negar peremptoriamente.
Quando se vê sem alternativas, escolhe a categoria de vítima, posando como perseguido da mídia e da elite. A mesma elite que lhe prestou favores pessoais e garantiu os bilhões para custear o sonho da hegemonia petista. Tudo à custa de generosas propinas nos negócios públicos.
Ainda que um pouco chamuscado, livrou-se do mensalão. E, se já podia tudo, Lula acreditou no infinito. Inventou Dilma Rousseff, enfiou-a goela abaixo do PT e dos aliados, provocando uma indigestão que nem todos os bilhões desviados de obras públicas, dos fundos de pensão e do sabe-se lá mais onde, foram suficientes para curar.
Vieram a Lava-Jato, o processo de impeachment de Dilma, a incerteza, o medo da cadeia.
O Lula que agora recorre à ONU não é mais o mesmo. Está fragilíssimo.
Por ironia da história, virou réu em Brasília – não em Curitiba -- quase que simultaneamente à sua tentativa de estender ao mundo a sua versão de mártir.
Mas suas bravatas já não ecoam. O processo que tenta impor em Genebra é um amontoado de mentiras. O cerne da peça -- o juiz Sérgio Moro age arbitrariamente para forçar delações de prisioneiros e não há tribunais para rever as sentenças – desintegrou-se em uma simples nota da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe): “O sistema processual brasileiro garante três instâncias recursais e, até o momento, menos de 4% das decisões do juiz Sérgio Moro foram reformadas”. E a tentativa de dizer que as acusações que pairam sobre si não passam de uma ação articulada de forças conservadoras para impedir a sua candidatura em 2018 beira o ridículo.
O Lula que agora recorre à ONU, seja para criar um fato novo em pré-impeachment ou facilitar uma eventual solicitação de asilo político no futuro, se mostra miúdo, debilitado, anêmico.
Ao acusar a Polícia Federal, a mesma que ele tanto elogiava durante o seu governo, e a Justiça, para a qual ele e sua sucessora indicaram 13 ministros, oito dos onze em atividade na Suprema Corte, Lula enterra-se, definitivamente, na lama.
Sua defesa age como se todas as instituições brasileiras – incluindo a imprensa, é claro -- fossem criminosas. E ele, só ele, inocente. O Lula que agora recorre à ONU é patético.
O mesmo Lula que em 1993 escorraçou a Câmara dos Deputados afirmando que ela abrigava “300 picaretas” dedicou loas à Casa, 10 anos depois, ao receber a Suprema Distinção Legislativa: “não existe nada mais nobre que um mandato parlamentar”.
Pouco despois de se eleger em 2002, desfilou de braços dados com José Sarney, a quem já acusara de ser “grileiro”. Adulou Renan Calheiros para ficar em pé durante o processo do mensalão; bajulou Paulo Maluf – que já fora o mal em si – para eleger Fernando Haddad, o prefeito mais impopular que São Paulo já teve.
Depois de vencer a eleição, Lula soltou ainda mais a verve. Fez do hoje condenado e preso José Dirceu o “capitão do time”, para depois puxar-lhe o tapete. Foi a público, em cadeia de rádio e TV, pedir desculpas pela traição dos seus no escândalo do mensalão, ocorrência que, meses depois, passou a negar peremptoriamente.
Quando se vê sem alternativas, escolhe a categoria de vítima, posando como perseguido da mídia e da elite. A mesma elite que lhe prestou favores pessoais e garantiu os bilhões para custear o sonho da hegemonia petista. Tudo à custa de generosas propinas nos negócios públicos.
Ainda que um pouco chamuscado, livrou-se do mensalão. E, se já podia tudo, Lula acreditou no infinito. Inventou Dilma Rousseff, enfiou-a goela abaixo do PT e dos aliados, provocando uma indigestão que nem todos os bilhões desviados de obras públicas, dos fundos de pensão e do sabe-se lá mais onde, foram suficientes para curar.
Vieram a Lava-Jato, o processo de impeachment de Dilma, a incerteza, o medo da cadeia.
O Lula que agora recorre à ONU não é mais o mesmo. Está fragilíssimo.
Por ironia da história, virou réu em Brasília – não em Curitiba -- quase que simultaneamente à sua tentativa de estender ao mundo a sua versão de mártir.
Mas suas bravatas já não ecoam. O processo que tenta impor em Genebra é um amontoado de mentiras. O cerne da peça -- o juiz Sérgio Moro age arbitrariamente para forçar delações de prisioneiros e não há tribunais para rever as sentenças – desintegrou-se em uma simples nota da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe): “O sistema processual brasileiro garante três instâncias recursais e, até o momento, menos de 4% das decisões do juiz Sérgio Moro foram reformadas”. E a tentativa de dizer que as acusações que pairam sobre si não passam de uma ação articulada de forças conservadoras para impedir a sua candidatura em 2018 beira o ridículo.
O Lula que agora recorre à ONU, seja para criar um fato novo em pré-impeachment ou facilitar uma eventual solicitação de asilo político no futuro, se mostra miúdo, debilitado, anêmico.
Ao acusar a Polícia Federal, a mesma que ele tanto elogiava durante o seu governo, e a Justiça, para a qual ele e sua sucessora indicaram 13 ministros, oito dos onze em atividade na Suprema Corte, Lula enterra-se, definitivamente, na lama.
Sua defesa age como se todas as instituições brasileiras – incluindo a imprensa, é claro -- fossem criminosas. E ele, só ele, inocente. O Lula que agora recorre à ONU é patético.
O peso das imagens de Dilma e Lula
O desespero cresce à medida que se aproxima o impeachment e, com isso, Dilma Rousseff vai perdendo a noção do ridículo. A mulher dita honesta, acuada pela sanha golpista dos inimigos do povo e confinada na solidão de um palácio de mentirinha, volta-se, explicitamente, contra seu próprio partido, a quem atribui a responsabilidade por qualquer malfeito que tenha sido cometido nas duas bem-sucedidas campanhas eleitorais de que participou. Mas o sentimento de rejeição é recíproco: está aberta nas hostes lulopetistas a discussão sobre a conveniência de manter Dilma Rousseff afastada da campanha municipal. O PT já se deu conta de que mal poderá arcar com o peso negativo da própria imagem. Dispensa o abraço de afogado.
Para a presidente afastada, a confissão de seu ex-marqueteiro oficial de que recebeu via caixa 2 pelos serviços prestados na campanha presidencial de 2010 não a atinge: “Ele diz que recebeu isso em 2013. Ora, a campanha começa em 2010 e até o final do ano, antes da diplomação, ela é encerrada. A partir do momento em que ela é encerrada, tudo o que ficou pendente de pagamento da campanha passa a ser responsabilidade do partido”.
Equivoca-se a mulher honesta. Mesmo que o cipoal legislativo que regula a matéria dê margem a eventuais interpretações pontuais discrepantes, o bom senso impõe a observância do princípio da responsabilidade solidária de candidatos e partidos sobre os gastos eleitorais, principalmente quando se trata de pleito majoritário. No caso, o marqueteiro João Santana, responsável pelo marketing eleitoral de Dilma em 2010, só conseguiu receber US$ 5 milhões que lhe eram devidos – na verdade, US$ 500 mil a menos – em 2013, depositados em conta no exterior.
Ninguém imagina que um candidato à Presidência da República seja obrigado a cobrir gastos de campanha. Mas é óbvio que ele é responsável, solidário com o partido, por esses gastos, inclusive do ponto de vista da legislação eleitoral. É, aliás, exatamente por essa razão que está sendo julgada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) uma ação movida pelo PSDB contra a chapa Dilma-Temer, relativa aos gastos de campanha de 2014. É simplesmente ridícula, portanto, a alegação da presidente afastada de que, como a campanha de 2010 foi encerrada antes de o pagamento ser feito ao marqueteiro, a responsabilidade exclusiva por esse pagamento é do PT.
De resto, essa atitude revela, no mínimo, o desapreço que Dilma tem pelo partido pelo qual se elegeu duas vezes presidente da República. O que suscitaria a questão – se é que ela acredita realmente que possa voltar ao Palácio do Planalto – de saber com o apoio de quem ela contaria para recompor seu governo.
Ao tentar transferir para o PT toda a responsabilidade pelos golpes eleitorais que alavancaram suas eleições, Dilma nada mais fez do que imitar o comportamento de seu criador e mestre, Lula da Silva. Mentor e maior beneficiário do mensalão e do petrolão, peças do mesmo esquema de corrupção com os quais procurou em vão consolidar seu projeto pessoal de poder, o hóspede contumaz do famoso sítio de Atibaia passou oito anos na Presidência da República comportando-se como se qualquer suspeita de seu envolvimento em trambiques fosse crime de lesa-majestade. A diferença entre Dilma e Lula é que este, muito mais esperto, não perdia oportunidade de passar a mão na cabeça de quem operava o jogo sujo para ele.
Hoje, a agenda dos restos do PT concentra-se na sua sobrevivência política, o que passa necessariamente por um desempenho se possível um pouco mais do que medíocre no pleito municipal de outubro. A estratégia eleitoral a ser adotada divide suas lideranças. Por um lado, os que preferem a uma abordagem mais “ideológica” insistem que o mais adequado é a “nacionalização” da campanha, levando para os palanques municipais o tema do “golpe” de que o PT estaria sendo vítima com o impeachment de Dilma. De outra parte, os mais pragmáticos entendem que, numa eleição de prefeitos e vereadores, o que garante voto são as questões locais.
Seja qual for a estratégia, predomina entre as lideranças petistas, nos âmbitos federal, regional e municipal, a convicção de que, com a exceção talvez do Nordeste, as presenças nos palanques de Lula e, principalmente, de Dilma, não são desejáveis. São as voltas que a política dá.
Para a presidente afastada, a confissão de seu ex-marqueteiro oficial de que recebeu via caixa 2 pelos serviços prestados na campanha presidencial de 2010 não a atinge: “Ele diz que recebeu isso em 2013. Ora, a campanha começa em 2010 e até o final do ano, antes da diplomação, ela é encerrada. A partir do momento em que ela é encerrada, tudo o que ficou pendente de pagamento da campanha passa a ser responsabilidade do partido”.
Ninguém imagina que um candidato à Presidência da República seja obrigado a cobrir gastos de campanha. Mas é óbvio que ele é responsável, solidário com o partido, por esses gastos, inclusive do ponto de vista da legislação eleitoral. É, aliás, exatamente por essa razão que está sendo julgada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) uma ação movida pelo PSDB contra a chapa Dilma-Temer, relativa aos gastos de campanha de 2014. É simplesmente ridícula, portanto, a alegação da presidente afastada de que, como a campanha de 2010 foi encerrada antes de o pagamento ser feito ao marqueteiro, a responsabilidade exclusiva por esse pagamento é do PT.
De resto, essa atitude revela, no mínimo, o desapreço que Dilma tem pelo partido pelo qual se elegeu duas vezes presidente da República. O que suscitaria a questão – se é que ela acredita realmente que possa voltar ao Palácio do Planalto – de saber com o apoio de quem ela contaria para recompor seu governo.
Ao tentar transferir para o PT toda a responsabilidade pelos golpes eleitorais que alavancaram suas eleições, Dilma nada mais fez do que imitar o comportamento de seu criador e mestre, Lula da Silva. Mentor e maior beneficiário do mensalão e do petrolão, peças do mesmo esquema de corrupção com os quais procurou em vão consolidar seu projeto pessoal de poder, o hóspede contumaz do famoso sítio de Atibaia passou oito anos na Presidência da República comportando-se como se qualquer suspeita de seu envolvimento em trambiques fosse crime de lesa-majestade. A diferença entre Dilma e Lula é que este, muito mais esperto, não perdia oportunidade de passar a mão na cabeça de quem operava o jogo sujo para ele.
Hoje, a agenda dos restos do PT concentra-se na sua sobrevivência política, o que passa necessariamente por um desempenho se possível um pouco mais do que medíocre no pleito municipal de outubro. A estratégia eleitoral a ser adotada divide suas lideranças. Por um lado, os que preferem a uma abordagem mais “ideológica” insistem que o mais adequado é a “nacionalização” da campanha, levando para os palanques municipais o tema do “golpe” de que o PT estaria sendo vítima com o impeachment de Dilma. De outra parte, os mais pragmáticos entendem que, numa eleição de prefeitos e vereadores, o que garante voto são as questões locais.
Seja qual for a estratégia, predomina entre as lideranças petistas, nos âmbitos federal, regional e municipal, a convicção de que, com a exceção talvez do Nordeste, as presenças nos palanques de Lula e, principalmente, de Dilma, não são desejáveis. São as voltas que a política dá.
Cuidado nosso de cada dia
Ela (a linguagem) nos permite ingressar no mundo luminoso e arejado dos conceitos. Mas isso tem igualmente seu preço. Este mundo de luz e de ar é também um mundo em que os ventos doutrinários se desencadeiam, destruidores. Em que, ilusórios sóis artificiais surgem do horizonte; em que venenos de toda espécie brotam das fábricas de propaganda, das usinas de tolices.
Vivendo como anfíbios, metade nos fatos e metade nas palavras, metade na experiência imediata e metade em noções abstratas, empregamos a maior parte do tempo em conseguir o que há de pior nesses dois mundos. Usamos tão mal a linguagem que nos tornamos escravos de nossos chavões e nos transformamos quer em Babbits conformados, que em fanáticos e doutrinários. E utilizamos tão mal a experiência imediata que ficamos cegos às realidades de nossa própria natureza e insensíveis ao mundo que nos rodeia.
Aldous Huxley, "Adonis e o alfabeto"
O voto e a cabeça do eleitor
Qual é o roteiro para se conquistar o voto? Quando um eleitor opta por um candidato, que fatores balizam sua decisão? Esta é a instigante questão que os competidores tentarão descobrir na mais renhida disputa eleitoral desses turbulentos tempos que agitam o país. A resposta abriga componentes relacionados à identidade do candidato e ao ambiente social e econômico que cerca os eleitores.
No primeiro caso, o eleitor leva em consideração valores como honestidade/seriedade; simplicidade; competência/preparo; capacidade de comunicação; identificação com o novo contra o velho; o entendimento dos problemas da cidade; arrogância/prepotência; simpatia; cordialidade. Sob outra abordagem, o voto quer significar protesto, um castigo aos atuais governantes e a candidatos identificados com os velhos costumes, vontade de mudar ou mesmo aprovação aos perfis que darão continuidade à administração. Neste caso, os pesos da balança assumem o significado de satisfação e insatisfação; ou confiança e desconfiança.
A questão seguinte é saber qual a ordem em que o eleitor coloca essas posições na cabeça e por onde ele começa a decidir seu voto. Não há uma ordem natural. O eleitor tanto pode começar a decidir por um valor representado pelo candidato – empatia, carga conceitual, novidade, capacidade de comunicação - como pelo cinturão social e econômico que o aperta: carestia, violência, desemprego, insatisfação com os serviços públicos precários etc. Os dois blocos de fatores tendem a formar massas conceituais - boas e ruins - na cabeça das pessoas.
A exposição dos candidatos na mídia forma um conjunto de impressões na audiência. Serge Tchakhotine, em seu denso livro Mistificação das Massas pela Propaganda Política, refere-se a essas impressões como engramas. São responsáveis pelas associações mentais que as pessoas estabelecem, relacionadas aos nossos desejos e necessidades, convergindo para situações e valores como fome, conforto, esperança, ambição, progresso, sexualidade, fraternidade, vaidade, mudança, melhoria de vida. Esse escopo, por sua vez, opera sob a forma de reflexos condicionados, que atuam sobre a maquinaria psíquica.
Essas impressões serão mais positivas ou mais negativas, de acordo com a capacidade de o candidato formular idéias e apresentar respostas aprovadas ou desaprovadas pelo sistema de cognição dos eleitores. E daí, qual a lógica para a priorização que o eleitor confere às idéias dos candidatos? Nesse ponto, cabe uma pontuação de natureza psicológica. As pessoas tendem a selecionar coisas (fatos, ideias, eventos, perfis) de acordo com os instintos natos de conservação do indivíduo e preservação da espécie.
Ou seja, o discurso mais impactante e atraente é o que dá garantias às pessoas de que elas estarão a salvo, tranquilas, alimentadas. O discurso voltado ao estômago do eleitor, ao bolso, à saúde é prioritário. Tudo que diz respeito à melhoria das condições de vida desperta a atenção. (Lembram-se da equação BO+BA+CO+CA – Bolso, Barriga, Coração, Cabeça - sempre recorrente nos textos deste consultor?). Depois, as pessoas são atraídas pelo discurso emotivo, relacionado à solidariedade, ao companheirismo, à vida familiar.
Esses apelos disparam os mecanismos de escolha. Se a insatisfação social for muito alta, os cidadãos tendem a se abrigar no guarda-chuva de candidatos da oposição. Se candidatos com forte tom mudancista provocarem medo, as pessoas recolhem-se na barreira da cautela, temendo que um candidato impetuoso vire a mesa abruptamente. Assim, mesmo rejeitando candidatos apoiados pela situação, os eleitores assumem a atitude dos três macaquinhos: tampam a boca, os ouvidos e olhos e acabam votando em candidatos situacionistas.
O maior desafio de um candidato de oposição, dentro dessa lógica, é o de convencer o eleitorado de que não só garantirá como aumentará as conquistas dos seus antecessores, promovendo mudanças que melhorarão a vida das pessoas. Mas o efeito demonstração se faz necessário. Simples promessa não adiantará: é preciso comprovar tim-tim por tim-tim como executará as propostas.
Por isso mesmo, quando o candidato agrega valores positivos, a capacidade de convencimento do eleitor será maior. Não se trata apenas de fazer marketing, mas de expressar caráter, personalidade, a história do candidato. Uma história amparada na coerência, na experiência, na lealdade, na coragem e determinação de cumprir compromissos. Proposta séria e factível transmitida por candidato desacreditado não colará. Cairá no vazio. A desconfiança anula a seriedade da mensagem positiva. Os dois tipos de componentes que determinam as decisões do eleitor - as características pessoais dos candidatos e o quadro de dificuldades da vida cotidiana – caminham, portanto, juntos, amalgamando o processo de decisões dos cidadãos.
Marketing bem feito é aquele que procura juntar essas duas bandas, costurando os aspectos pessoais com os fatores conjunturais, conciliando posições, arrumando os discursos, analisando as demandas das populações, criando ênfases e alinhando as prioridades. O que a comunicação faz, na verdade, é acentuar os estímulos para que o eleitor possa, a partir deles, tomar decisões. E os estímulos começam com a apresentação pessoal dos candidatos, a maneira de se expressar, de se vestir. Os cenários aguçam ou atenuam a atenção.
A fluidez de comunicação, a linguagem mais aberta, solta e coloquial, cria um clima de intimidade com o eleitor. Propostas precisam ganhar objetividade, clareza e consistência. As influências sociais e até as características espaciais e temporais despertam ou aquecem as vontades.
O eleitor é uma incógnita. Na eleição de outubro próximo, procurará se esconder mais que em campanhas anteriores. Está desconfiado e crítico. De costas para as velhas promessas. Não quer comprar gato por lebre. Decide com racionalidade, sem esquecer a indignação. Tentar desvendar o que se passa em sua mente – eis o maior desafio dos candidatos.
No primeiro caso, o eleitor leva em consideração valores como honestidade/seriedade; simplicidade; competência/preparo; capacidade de comunicação; identificação com o novo contra o velho; o entendimento dos problemas da cidade; arrogância/prepotência; simpatia; cordialidade. Sob outra abordagem, o voto quer significar protesto, um castigo aos atuais governantes e a candidatos identificados com os velhos costumes, vontade de mudar ou mesmo aprovação aos perfis que darão continuidade à administração. Neste caso, os pesos da balança assumem o significado de satisfação e insatisfação; ou confiança e desconfiança.
A questão seguinte é saber qual a ordem em que o eleitor coloca essas posições na cabeça e por onde ele começa a decidir seu voto. Não há uma ordem natural. O eleitor tanto pode começar a decidir por um valor representado pelo candidato – empatia, carga conceitual, novidade, capacidade de comunicação - como pelo cinturão social e econômico que o aperta: carestia, violência, desemprego, insatisfação com os serviços públicos precários etc. Os dois blocos de fatores tendem a formar massas conceituais - boas e ruins - na cabeça das pessoas.
A exposição dos candidatos na mídia forma um conjunto de impressões na audiência. Serge Tchakhotine, em seu denso livro Mistificação das Massas pela Propaganda Política, refere-se a essas impressões como engramas. São responsáveis pelas associações mentais que as pessoas estabelecem, relacionadas aos nossos desejos e necessidades, convergindo para situações e valores como fome, conforto, esperança, ambição, progresso, sexualidade, fraternidade, vaidade, mudança, melhoria de vida. Esse escopo, por sua vez, opera sob a forma de reflexos condicionados, que atuam sobre a maquinaria psíquica.
Essas impressões serão mais positivas ou mais negativas, de acordo com a capacidade de o candidato formular idéias e apresentar respostas aprovadas ou desaprovadas pelo sistema de cognição dos eleitores. E daí, qual a lógica para a priorização que o eleitor confere às idéias dos candidatos? Nesse ponto, cabe uma pontuação de natureza psicológica. As pessoas tendem a selecionar coisas (fatos, ideias, eventos, perfis) de acordo com os instintos natos de conservação do indivíduo e preservação da espécie.
Ou seja, o discurso mais impactante e atraente é o que dá garantias às pessoas de que elas estarão a salvo, tranquilas, alimentadas. O discurso voltado ao estômago do eleitor, ao bolso, à saúde é prioritário. Tudo que diz respeito à melhoria das condições de vida desperta a atenção. (Lembram-se da equação BO+BA+CO+CA – Bolso, Barriga, Coração, Cabeça - sempre recorrente nos textos deste consultor?). Depois, as pessoas são atraídas pelo discurso emotivo, relacionado à solidariedade, ao companheirismo, à vida familiar.
Esses apelos disparam os mecanismos de escolha. Se a insatisfação social for muito alta, os cidadãos tendem a se abrigar no guarda-chuva de candidatos da oposição. Se candidatos com forte tom mudancista provocarem medo, as pessoas recolhem-se na barreira da cautela, temendo que um candidato impetuoso vire a mesa abruptamente. Assim, mesmo rejeitando candidatos apoiados pela situação, os eleitores assumem a atitude dos três macaquinhos: tampam a boca, os ouvidos e olhos e acabam votando em candidatos situacionistas.
O maior desafio de um candidato de oposição, dentro dessa lógica, é o de convencer o eleitorado de que não só garantirá como aumentará as conquistas dos seus antecessores, promovendo mudanças que melhorarão a vida das pessoas. Mas o efeito demonstração se faz necessário. Simples promessa não adiantará: é preciso comprovar tim-tim por tim-tim como executará as propostas.
Por isso mesmo, quando o candidato agrega valores positivos, a capacidade de convencimento do eleitor será maior. Não se trata apenas de fazer marketing, mas de expressar caráter, personalidade, a história do candidato. Uma história amparada na coerência, na experiência, na lealdade, na coragem e determinação de cumprir compromissos. Proposta séria e factível transmitida por candidato desacreditado não colará. Cairá no vazio. A desconfiança anula a seriedade da mensagem positiva. Os dois tipos de componentes que determinam as decisões do eleitor - as características pessoais dos candidatos e o quadro de dificuldades da vida cotidiana – caminham, portanto, juntos, amalgamando o processo de decisões dos cidadãos.
Marketing bem feito é aquele que procura juntar essas duas bandas, costurando os aspectos pessoais com os fatores conjunturais, conciliando posições, arrumando os discursos, analisando as demandas das populações, criando ênfases e alinhando as prioridades. O que a comunicação faz, na verdade, é acentuar os estímulos para que o eleitor possa, a partir deles, tomar decisões. E os estímulos começam com a apresentação pessoal dos candidatos, a maneira de se expressar, de se vestir. Os cenários aguçam ou atenuam a atenção.
A fluidez de comunicação, a linguagem mais aberta, solta e coloquial, cria um clima de intimidade com o eleitor. Propostas precisam ganhar objetividade, clareza e consistência. As influências sociais e até as características espaciais e temporais despertam ou aquecem as vontades.
O eleitor é uma incógnita. Na eleição de outubro próximo, procurará se esconder mais que em campanhas anteriores. Está desconfiado e crítico. De costas para as velhas promessas. Não quer comprar gato por lebre. Decide com racionalidade, sem esquecer a indignação. Tentar desvendar o que se passa em sua mente – eis o maior desafio dos candidatos.
Aliança do escárnio
Um soco no olho, outro na boca, chutes e esganamento enquanto o oponente está no chão. Embora seja mais afeita aos ringues de MMA, e nesses casos incentivada por fãs ensandecidos, tal sequência de golpes aconteceu dentro de uma residência, foi desferida por um homem contra sua mulher e testemunhada pela filha do próprio casal, uma menina de 5 anos de idade. Fim de papo.
Fim de papo? Não quando se trata de Brasil, muito menos de Rio de Janeiro, tampouco quando envolve a avacalhada cena política carioca.
Digo, não bastasse a teimosia de Paes em apoiar Pedro Paulo, sujeito que deveria estar preso se este fosse um país digno, eis que, agora, no afã de encontrar uma figura feminina capaz de empanar os episódios de violência doméstica protagonizados pelo candidato, os grão-mestres do PMDB decidem reavivar uma tabelinha antiga, ao anunciarem a deputada estadual Cidinha Campos (PDT) como vice da chapa.
Decerto graças às mazelas que emanavam da Vila Olímpica, não atentamos como deveríamos para mais esta costura política deletéria, entretanto ela extrapola o acinte e assim precisa ser encarada.
A persona da mulher destemida e com verve irrefreável forjada por Cidinha confunde-se com a própria guinada do brizolismo no Rio de Janeiro. Não é por acaso. Maria Aparecida Campos Straus, a própria, filiou-se ao PDT em 1982 e desde então destacou-se como uma ferrenha defensora deste arremedo ideológico destinado a acabar com o Rio.
Anotem aí pois afirmo sem o menor medo de errar: para cariocas como eu, que viram de perto o populismo chinfrim asfixiar as menores fagulhas de discurso moderno que pudessem surgir, que presenciaram a institucionalização de uma ditadura da maioria e, talvez o mais grave, a formação de uma escola de políticos determinada a perpetuar Leonel Brizola, é horripilante voltar a ouvir o nome de Cidinha Campos com pompa e circunstância.
Mas, então, se Cidinha realmente provoca tanta repulsa assim, por que foi escolhida? De onde veio a indicação? Voltando à tese inicial, teriam Jorge Picciani e Sergio Cabral lembrado de suas atuações histriônicas na Alerj e então enxergado nela a candidata ideal para escudar Pedro Paulo?
Até faz sentido, vá lá, entretanto convém esquecer de vez a cartada da mulher que referenda o acusado. Quero dizer, alguém com a pachorra de, logo nas primeiras entrevistas, regurgitar boçalidades como “eu sou contra violência doméstica, mas quando é contra as pessoas desvalidas”, vamos combinar, não merece ter sua opinião sobre o tema respeitada.
Qual seria o motivo, então? Cacife moral? Mas, como, se ainda em 1994 Cidinha era alardeada aos quatro ventos como beneficiária de propina do jogo do bicho? Que fim leva a retórica da superioridade moral desta forma?
Insisto, para os cariocas da minha geração, os que nasceram no início dos anos 70, Cidinha não passa de um bolor. E, se pensarmos bem, ao atinarmos para a visível fragilidade física de Dornelles em suas últimas aparições, mesmo com a perpetuação de Moreira Franco pelos corredores do poder, a sensação que fica é de desespero. Como se estivéssemos enfiados até o gogó na areia movediça.
Pedro Paulo merece toda a repulsa possível do povo carioca, disto eu não tenho dúvida. Ainda que sua candidatura signifique a continuidade daquele que já pode ser considerado o melhor prefeito do Rio nas últimas décadas, existem situações na vida que ultrapassam todos os limites do aceitável e bater em mulher é uma delas.
Quanto a presença de Cidinha Campos, só me resta pensar em desespero, na falta de idéias de uma campanha que, se bobear, mais ajuda aos adversários do que a si mesma quando faz embarcar alguém tão fora do prumo e capaz de incitar sentimentos ruins.
Por fim, é duro admitir, mas, entre as alianças de Crivella e Garotinho, Pedro Paulo e Cidinha, sem falar no ignóbil Freixo ou no falso arrependido Molon, a melhor saída para o carioca talvez seja o Galeão.
Lula, à beira do abismo, só falta dar um passo para frente...
O conluio entre Lula e família e as grandes empreiteiras acaba de desaguar na transformação do ex-presidente da República em réu de crimes capazes de levá-lo à prisão, tanto quanto a quadrilha por tanto tempo acostumada às suas benesses e falcatruas. Se acontecer, junto com o necessário afastamento definitivo de Dilma Rousseff, nem por isso estará o país livre da rachadura. Mesmo com o PT posto em frangalhos, a divisão entre as elites e as massas tornará as ruas e as consciências intransitáveis.
Batalhas entre o Brasil formal e o Brasil real visam impedir opções e espaço para a conciliação. Isso, só depois da explosão, de resultados imprevisíveis. Raras vezes tem-se verificado dicotomia tão profunda em nossa História, recaindo a responsabilidade pelo embate na avidez das lideranças das duas porções em choque. Perderão ambas, mas o que resultará do mútuo esgotamento das partes?
Tempo ainda há, muito curto, para evitar o pior. Antecipar as eleições gerais para breve pode constituir-se em solução, ainda que tanto as elites quanto as massas apresentem suas soluções inconciliáveis. Imaginar a terceira alternativa sempre será possível, ainda que geralmente ilusória. O radicalismo de um lado e de outro obstará a conciliação, deixando mínimo espaço para desenvolver-se. Como se trata da derradeira oportunidade de evitar o caos, quem sabe?
Não é hora de fulanizar, porque mesmo disfarçados, os grupos em choque serão facilmente identificáveis. À beira do abismo, porém, tudo é possível para evitar a queda.
Deu a louca no mundo virtual
Dia desses li que 2,4 bilhões de seres humanos - praticamente um terço da população mundial - fazem uso da Internet. Eis aí, sem a menor sombra de dúvida, uma das mais importantes inovações da nossa era, dotada de um poder revolucionário virtualmente inimaginável.
E eis que, surfando na fascinante onda desta novidade, apareceu um cidadão buscando facilitar o adultério! O dito cujo montou um sítio na Internet especializado em viabilizar encontros com pessoas casadas. Logo na página inicial fica clara a intenção da ideia: a vida é curta, tenha um caso.
Um outro elemento resolveu estabelecer um serviço de telegramas para o além. Basta digitar a mensagem a ser transmitida para algum morto, ao custo de US$ 5 por palavra, e o telegrama será devidamente entregue através de um portador - algum doente terminal que se disponha a memorizar a mensagem para repeti-la, depois de morto, lá nas paragens celestiais. Aliás, por falar nisso, encontrei um outro sítio cuja única finalidade é definir o dia de sua morte - assim você pode até se oferecer para levar algum telegrama para o além.
Descobri também um serviço especializado em proporcionar experiências com seres de outros planetas. Segundo li, uma equipe composta de profissionais altamente treinados, incluindo médicos, hipnotizadores e até técnicos especializados em implantes de memória, o fará experimentar a sensação de ser abduzido por algum ET.
A propósito, há na Internet um sítio vendendo uma apólice de seguro para o caso de você ser realmente carregado por um alienígena. O serviço custa US$ 19,95 mais US$ 5 de despesas postais. A partir daí, basta algum ET carregá-lo para um disco voador e você ganhará US$ 10 milhões, na qualidade de um feliz segurado!
Você quer ficar infeliz? Deseja alcançar um estado de depressão ouvindo palavras amargas? Está cansado de ouvir palavras de incentivo? Neste caso, conte com um sítio cujo lema é descobrimos a cura para a esperança. Por preços módicos, pode-se comprar ali até um calendário de desmotivação, a fim de que a cada novo dia você tenha uma razão nova para ficar deprimido.
Curioso, também, é o sítio para imbecis. A ideia é proporcionar um centro virtual de acolhimento aos idiotas deste mundo. Funciona assim: na entrada o candidato se submete a um teste de QI, e em ficando constatado que o dito cujo é uma anta a aceitação como sócio neste seleto clube é imediata.
Não menos interessante é o sítio através do qual pode-se adquirir terrenos na Lua, em Marte e em Vênus. Os preços começam em uns R$ 56,20 para um acre até R$ 315,40 para um lote de dez acres. Acompanha a escritura um mapa do local (Lua, Marte ou Vênus, repito), a fim de que você encontre o terreno com facilidade quando por lá resolver aparecer.
Encerro esta lista com o inacreditável sítio alemão dedicado a intermediar a compra e venda de votos nas eleições realizadas naquele país. Através dele os eleitores procuram compradores para seus votos, recebendo 10 Euros por cada um. Eles devem preencher um formulário, comprometendo-se a votar no partido ou político comprador. Clientes podem comprar pacotes de votos - 1.000 por 6.250 Euros ou 10.000 por 59.000 Euros.
Dizem alguns que a evolução espiritual da humanidade não tem acompanhado o avanço de sua tecnologia. Daí, talvez, a exclamação de Rivarol, segundo quem os povos mais civilizados acham-se tão próximos da barbárie como o ferro polido está perto da ferrugem.
Pedro Valls Feu Rosa
E eis que, surfando na fascinante onda desta novidade, apareceu um cidadão buscando facilitar o adultério! O dito cujo montou um sítio na Internet especializado em viabilizar encontros com pessoas casadas. Logo na página inicial fica clara a intenção da ideia: a vida é curta, tenha um caso.
Um outro elemento resolveu estabelecer um serviço de telegramas para o além. Basta digitar a mensagem a ser transmitida para algum morto, ao custo de US$ 5 por palavra, e o telegrama será devidamente entregue através de um portador - algum doente terminal que se disponha a memorizar a mensagem para repeti-la, depois de morto, lá nas paragens celestiais. Aliás, por falar nisso, encontrei um outro sítio cuja única finalidade é definir o dia de sua morte - assim você pode até se oferecer para levar algum telegrama para o além.
Descobri também um serviço especializado em proporcionar experiências com seres de outros planetas. Segundo li, uma equipe composta de profissionais altamente treinados, incluindo médicos, hipnotizadores e até técnicos especializados em implantes de memória, o fará experimentar a sensação de ser abduzido por algum ET.
A propósito, há na Internet um sítio vendendo uma apólice de seguro para o caso de você ser realmente carregado por um alienígena. O serviço custa US$ 19,95 mais US$ 5 de despesas postais. A partir daí, basta algum ET carregá-lo para um disco voador e você ganhará US$ 10 milhões, na qualidade de um feliz segurado!
Você quer ficar infeliz? Deseja alcançar um estado de depressão ouvindo palavras amargas? Está cansado de ouvir palavras de incentivo? Neste caso, conte com um sítio cujo lema é descobrimos a cura para a esperança. Por preços módicos, pode-se comprar ali até um calendário de desmotivação, a fim de que a cada novo dia você tenha uma razão nova para ficar deprimido.
Curioso, também, é o sítio para imbecis. A ideia é proporcionar um centro virtual de acolhimento aos idiotas deste mundo. Funciona assim: na entrada o candidato se submete a um teste de QI, e em ficando constatado que o dito cujo é uma anta a aceitação como sócio neste seleto clube é imediata.
Não menos interessante é o sítio através do qual pode-se adquirir terrenos na Lua, em Marte e em Vênus. Os preços começam em uns R$ 56,20 para um acre até R$ 315,40 para um lote de dez acres. Acompanha a escritura um mapa do local (Lua, Marte ou Vênus, repito), a fim de que você encontre o terreno com facilidade quando por lá resolver aparecer.
Encerro esta lista com o inacreditável sítio alemão dedicado a intermediar a compra e venda de votos nas eleições realizadas naquele país. Através dele os eleitores procuram compradores para seus votos, recebendo 10 Euros por cada um. Eles devem preencher um formulário, comprometendo-se a votar no partido ou político comprador. Clientes podem comprar pacotes de votos - 1.000 por 6.250 Euros ou 10.000 por 59.000 Euros.
Dizem alguns que a evolução espiritual da humanidade não tem acompanhado o avanço de sua tecnologia. Daí, talvez, a exclamação de Rivarol, segundo quem os povos mais civilizados acham-se tão próximos da barbárie como o ferro polido está perto da ferrugem.
Pedro Valls Feu Rosa
Corrupção incide mais sobre educação e saúde
A Controladoria-Geral da União, rebatizada sob Michel Temer de Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle, realizou 221 operações especiais anticorrupção entre 2003 e o primeiro semestre de 2016. Executadas em parceria com a Polícia Federal e a Procuradoria da República, essas ações produziram uma estatística estarrecedora: 67% dos casos de desvio de verbas federais repassadas a Estados e municípios ocorreram nas áreas de educação e saúde.
Repetindo: o roubo é mais frequente nos cofres da educação e da saúde. Pense nisso sem pensar no resto. Esqueça por um instante o desemprego e a inflação. Pense só nisso. A verba da educação e da saúde, que já é insuficiente, fica mais escassa por conta dos assaltos. As escolas e os hospitais brasileiros são escandalosos em parte porque a gestão da dinheiro público nessas áreas tornou-se um escárnio.
“A Lava Jato é apenas o começo”, disse o ministro Torquato Jardim (Transparência) ao comentar o flagelo da corrupção em conversa com o blog. As seis operações mais relevantes realizadas no primeiro semestre de 2016 resultaram na descoberta de desvios de R$ 143 milhões. Os seis casos mais importantes desbaratados ao longo de 2015 somaram R$ 452 milhões. Perto dos bilhões da Lava Jato, as cifras são modestas.
Mas Torquato pondera: “Admitido o critério da proporcionalidade, esses casos não são menores do que a Lava Jato. Para mim, tudo isso é muito chocante. Em 13 anos, mais de 200 operações, 67% dos desvios na saúde e na educação. É dinheiro de merenda e saneamento. Quer dizer: são gestores públicos que estão destruindo a próxima geração de brasileiros.”
Torquato não exagera. Estudo repassado a Michel Temer anota: 1) na educação, a maioria dos casos de corrupção pilhados pelos órgãos de controle ocorre no Fundeb (38%), fundo que se destina ao desenvolvimento do ensino básico, e no PNAE (24%), programa de merenda escolar. Na saúde, a corrupção avança mais sobre as verbas do saneamento básico (18%) e do programa ‘Saúde da Família’ (13%), que fornece cuidados básicos de saúde por meio de visitas periódicas aos lares de brasileiros pobres.
A maior parte das operações especiais anticorrupção tem origem em denúncias. Das 221 operações especiais realizadas nos últimos 13 anos, 105 nasceram no âmbito da Polícia Federal, 87 foram deflagradas na antiga CGU e 29 surgiram no Ministério Público Federal. O que mais deixa inquieto o ministro da Transparência é a reincidência do roubo.
“Está acontecendo agora”, disse Torquato Jardim. “Tem um município, que vou me permitir nao citar o nome, em que a prefeita foi autuada pela segunda vez. Trata-se da avó de um deputado federal muito conhecido. Autuada no primeiro mandato, a prefeita continuou a praticar os delitos no segundo mandato.
O ministro realçou que o fenômeno da reiteração criminosa tornou-se latente. “No plano federal, enquanto se julgava o mensalão já se operava o petrolão. Do ponto de vista cultural, isso é uma barbaridade. Há poucos dias, com a Operação Zelotes a todo vapor, um conselheiro do Carf foi encontrar-se com um diretor do Itaú de quem tnha exigido uma bola de R$ 1,5 milhão. Apesar de tudo o que está acontecendo, o sujeito faz uma coisa dessas no shopping!”
Repetindo: o roubo é mais frequente nos cofres da educação e da saúde. Pense nisso sem pensar no resto. Esqueça por um instante o desemprego e a inflação. Pense só nisso. A verba da educação e da saúde, que já é insuficiente, fica mais escassa por conta dos assaltos. As escolas e os hospitais brasileiros são escandalosos em parte porque a gestão da dinheiro público nessas áreas tornou-se um escárnio.
“A Lava Jato é apenas o começo”, disse o ministro Torquato Jardim (Transparência) ao comentar o flagelo da corrupção em conversa com o blog. As seis operações mais relevantes realizadas no primeiro semestre de 2016 resultaram na descoberta de desvios de R$ 143 milhões. Os seis casos mais importantes desbaratados ao longo de 2015 somaram R$ 452 milhões. Perto dos bilhões da Lava Jato, as cifras são modestas.
Mas Torquato pondera: “Admitido o critério da proporcionalidade, esses casos não são menores do que a Lava Jato. Para mim, tudo isso é muito chocante. Em 13 anos, mais de 200 operações, 67% dos desvios na saúde e na educação. É dinheiro de merenda e saneamento. Quer dizer: são gestores públicos que estão destruindo a próxima geração de brasileiros.”
Torquato não exagera. Estudo repassado a Michel Temer anota: 1) na educação, a maioria dos casos de corrupção pilhados pelos órgãos de controle ocorre no Fundeb (38%), fundo que se destina ao desenvolvimento do ensino básico, e no PNAE (24%), programa de merenda escolar. Na saúde, a corrupção avança mais sobre as verbas do saneamento básico (18%) e do programa ‘Saúde da Família’ (13%), que fornece cuidados básicos de saúde por meio de visitas periódicas aos lares de brasileiros pobres.
A maior parte das operações especiais anticorrupção tem origem em denúncias. Das 221 operações especiais realizadas nos últimos 13 anos, 105 nasceram no âmbito da Polícia Federal, 87 foram deflagradas na antiga CGU e 29 surgiram no Ministério Público Federal. O que mais deixa inquieto o ministro da Transparência é a reincidência do roubo.
“Está acontecendo agora”, disse Torquato Jardim. “Tem um município, que vou me permitir nao citar o nome, em que a prefeita foi autuada pela segunda vez. Trata-se da avó de um deputado federal muito conhecido. Autuada no primeiro mandato, a prefeita continuou a praticar os delitos no segundo mandato.
O ministro realçou que o fenômeno da reiteração criminosa tornou-se latente. “No plano federal, enquanto se julgava o mensalão já se operava o petrolão. Do ponto de vista cultural, isso é uma barbaridade. Há poucos dias, com a Operação Zelotes a todo vapor, um conselheiro do Carf foi encontrar-se com um diretor do Itaú de quem tnha exigido uma bola de R$ 1,5 milhão. Apesar de tudo o que está acontecendo, o sujeito faz uma coisa dessas no shopping!”
sábado, 30 de julho de 2016
Collor e Dilma - abuso de poder e voluntarismo
Confirmando-se em agosto o impedimento de Dilma Rousseff, o Brasil terá experimentado dois impeachments em 28 anos da democracia. O número é elevado: dois em sete períodos de governo.
Mas não há que ver nisso sinal de fragilidade do regime de 1988. Ao contrário, nos dois casos o Congresso interrompeu o mandato de presidentes que abusaram do poder que lhes foi concedido pelas urnas. No caso de Fernando Collor de Mello o estopim foi a acusação de corrupção, de ter recebido recursos das operações suspeitas de PC Farias, tesoureiro de sua campanha. Este teria usado seu vínculo com o presidente para tomar dinheiro de empresas que dependiam de decisões do governo. No caso de Dilma Rousseff, as “pedaladas” de que é acusada constituíram abuso do poder que o Executivo tem sobre os bancos públicos, obrigando-os a conceder à União empréstimos disfarçados para gastar mais do podia. Assim, de uma ou de outra forma, os dois abusaram do poder, cometendo crime de responsabilidade. A frequência do impeachment é, pois, sinal de força da democracia brasileira. Ela tem sabido reagir aos chefes de Estado que ultrapassam os limites da autoridade recebida pela eleição.
O impeachment de Fernando Collor e o que atingirá Dilma Rousseff não decorreram, porém, apenas dos abusos mencionados. As crises que atingiram seus governos, embora bem diversas, resultaram em parte do seu extremovoluntarismo. O abuso de poder foi apenas uma das manifestações desse voluntarismo, normalmente obediente à ordem legal. Claro que os voluntarismos dos dois tiveram orientações políticas muito diversas: Collor orientou-se pela crença no valor do mercado e Dilma, pela crença nas virtudes da intervenção estatal.
O voluntarismo de Collor expressou-se, por exemplo, na edição de mais de uma centena de medidas provisórias no seu primeiro ano de governo e na tentativa, posterior, de forçar reformas liberalizantes que exigiam mudanças na Constituição e, portanto, grande maioria parlamentar, quando mal conseguia maioria simples no Congresso. Assim, o presidente buscou, com sucesso variável, impor sua vontade graças ao uso intenso dos poderes do Executivo, mas desconhecendo ou menosprezando os interesses políticos sediados nos partidos e no Congresso. Atuava como se os votos recebidos na eleição de 1989 lhe tivessem dado superior legitimidade em relação aos demais Poderes de Estado. Isso até o início de 1992, quando foi obrigado a recuar e tomar em conta a força e a legitimidade dos demais Poderes. Mas não o fez na medida necessária para retomar o controle da situação.
O voluntarismo de Dilma está mais à flor da nossa memória. Todos se lembram da dádiva maravilhosa de 20% na conta da luz, anunciada em setembro de 2012 juntamente com a renovação antecipada de todas as concessões no setor elétrico. A vontade presidencial foi feita, a despeito dos protestos das empresas do segmento de eletricidade e da desorganização do setor, mas teve de ser paga depois pelo consumidor, cujos gastos em 2015 aumentaram em cerca de 50% para compensar a benesse antes recebida. Caso similar foi a contenção dos preços dos combustíveis abaixo do nível internacional desde 2007 e, especialmente, a partir do início de 2011. Em nome do controle da inflação, esse voluntarismo presidencial trouxe prejuízos elevadíssimos à Petrobrás (US$ 50 bilhões até o final de 2014) e ao setor produtor de álcool combustível. Esses e outros casos de imposição da vontade se expressaram em formas de intervenção estatal que fizeram pouco da lógica própria dos mercados, incluídos aqueles em que empresas estatais tinham e têm parte relevante.
Contudo talvez tenham sido as decisões políticas que Dilma Rousseff tomou depois da vitória eleitoral de 2014 que mais corroeram sua capacidade de governar. A mais relevante foi a decisão de adotar o “ajuste fiscal” como diretriz da política econômica do novo governo e convidar um banqueiro para conduzi-la, desdizendo tudo o que afirmara na campanha eleitoral. Além de contrariar o seu partido, que vivia na ilusão de que gasto é sempre igual a desenvolvimento, transformou a tristeza da derrota oposicionista em revolta contra o estelionato eleitoral sofrido. A mentira indiretamente revelada e reconhecida reduziu, antes mesmo da posse, a legitimidade não da democracia, mas da presidente recém-eleita.
Na sequência, ela escolheu uma equipe ministerial que a afastou mais ainda da corrente majoritária do PT. E decidiu disputar, com candidato do PT, o comando da Câmara dos Deputados (para o qual se vinha preparando o deputado Eduardo Cunha), corroendo a já precária aliança com o PMDB, que lhe dera o vice, votos e um bom naco de tempo no rádio e na televisão. A derrota fragorosa nessa disputa evidencia, mais que tudo, o voluntarismo político da presidente. Ela se inclinou quase sempre a tomar pouco em conta os interesses de partidos e lideranças com os quais interagia, como se eles tivessem de curvar-se à vontade presidencial por terem menos legitimidade. É verdade que o sistema presidencial brasileiro dá ao chefe de Estado um poder muito grande. Mas o impeachment de Collor demonstrou que para governar o presidente precisa manter liderança sobre uma coalizão partidária majoritária. Se não consegue fazê-lo, perde condições de bem exercer o cargo.
Seguramente abuso de poder e voluntarismo presidenciais não explicam, por si sós, a crise política atual. Mas sublinham que a democracia não exige apenas eleições; demanda também responsabilidade no exercício do poder, tanto pelo respeito aos limites da lei como por levar em consideração os interesses legítimos dos demais atores. Infelizmente, Collor e Dilma, não se mostraram capazes disso.
Mas não há que ver nisso sinal de fragilidade do regime de 1988. Ao contrário, nos dois casos o Congresso interrompeu o mandato de presidentes que abusaram do poder que lhes foi concedido pelas urnas. No caso de Fernando Collor de Mello o estopim foi a acusação de corrupção, de ter recebido recursos das operações suspeitas de PC Farias, tesoureiro de sua campanha. Este teria usado seu vínculo com o presidente para tomar dinheiro de empresas que dependiam de decisões do governo. No caso de Dilma Rousseff, as “pedaladas” de que é acusada constituíram abuso do poder que o Executivo tem sobre os bancos públicos, obrigando-os a conceder à União empréstimos disfarçados para gastar mais do podia. Assim, de uma ou de outra forma, os dois abusaram do poder, cometendo crime de responsabilidade. A frequência do impeachment é, pois, sinal de força da democracia brasileira. Ela tem sabido reagir aos chefes de Estado que ultrapassam os limites da autoridade recebida pela eleição.
O impeachment de Fernando Collor e o que atingirá Dilma Rousseff não decorreram, porém, apenas dos abusos mencionados. As crises que atingiram seus governos, embora bem diversas, resultaram em parte do seu extremovoluntarismo. O abuso de poder foi apenas uma das manifestações desse voluntarismo, normalmente obediente à ordem legal. Claro que os voluntarismos dos dois tiveram orientações políticas muito diversas: Collor orientou-se pela crença no valor do mercado e Dilma, pela crença nas virtudes da intervenção estatal.
O voluntarismo de Collor expressou-se, por exemplo, na edição de mais de uma centena de medidas provisórias no seu primeiro ano de governo e na tentativa, posterior, de forçar reformas liberalizantes que exigiam mudanças na Constituição e, portanto, grande maioria parlamentar, quando mal conseguia maioria simples no Congresso. Assim, o presidente buscou, com sucesso variável, impor sua vontade graças ao uso intenso dos poderes do Executivo, mas desconhecendo ou menosprezando os interesses políticos sediados nos partidos e no Congresso. Atuava como se os votos recebidos na eleição de 1989 lhe tivessem dado superior legitimidade em relação aos demais Poderes de Estado. Isso até o início de 1992, quando foi obrigado a recuar e tomar em conta a força e a legitimidade dos demais Poderes. Mas não o fez na medida necessária para retomar o controle da situação.
Contudo talvez tenham sido as decisões políticas que Dilma Rousseff tomou depois da vitória eleitoral de 2014 que mais corroeram sua capacidade de governar. A mais relevante foi a decisão de adotar o “ajuste fiscal” como diretriz da política econômica do novo governo e convidar um banqueiro para conduzi-la, desdizendo tudo o que afirmara na campanha eleitoral. Além de contrariar o seu partido, que vivia na ilusão de que gasto é sempre igual a desenvolvimento, transformou a tristeza da derrota oposicionista em revolta contra o estelionato eleitoral sofrido. A mentira indiretamente revelada e reconhecida reduziu, antes mesmo da posse, a legitimidade não da democracia, mas da presidente recém-eleita.
Na sequência, ela escolheu uma equipe ministerial que a afastou mais ainda da corrente majoritária do PT. E decidiu disputar, com candidato do PT, o comando da Câmara dos Deputados (para o qual se vinha preparando o deputado Eduardo Cunha), corroendo a já precária aliança com o PMDB, que lhe dera o vice, votos e um bom naco de tempo no rádio e na televisão. A derrota fragorosa nessa disputa evidencia, mais que tudo, o voluntarismo político da presidente. Ela se inclinou quase sempre a tomar pouco em conta os interesses de partidos e lideranças com os quais interagia, como se eles tivessem de curvar-se à vontade presidencial por terem menos legitimidade. É verdade que o sistema presidencial brasileiro dá ao chefe de Estado um poder muito grande. Mas o impeachment de Collor demonstrou que para governar o presidente precisa manter liderança sobre uma coalizão partidária majoritária. Se não consegue fazê-lo, perde condições de bem exercer o cargo.
Seguramente abuso de poder e voluntarismo presidenciais não explicam, por si sós, a crise política atual. Mas sublinham que a democracia não exige apenas eleições; demanda também responsabilidade no exercício do poder, tanto pelo respeito aos limites da lei como por levar em consideração os interesses legítimos dos demais atores. Infelizmente, Collor e Dilma, não se mostraram capazes disso.
Rio 2016, hora do xadrez
Dilma e Lula não vão à Olimpíada. Foram pegos no antidoping.
O laboratório da Lava-Jato descobriu que a campanha da presidente afastada derramava milhões de reais numa empresa de fachada do setor de informática, entre outros anabolizantes criminosos. No caso do ex-presidente, uma nova substância ilegal foi atestada em laudo da Polícia Federal — constatando que as reformas no sítio de Lula que não é de Lula foram orientadas pelo próprio. Só a repaginação da cozinha custou 252 mil reais.
O ex-presidente já avisou que não vai deixar barato. De fato, nada que envolva Lula é barato. Perguntem aos laranjas da Odebrecht que compraram um prédio para o Instituto Lula. E lá foi o maior palestrante do mundo para Genebra, com sua comitiva, denunciar à ONU a perseguição que está sofrendo no Brasil.
A elite vermelha está rica, pode rodar o mundo se quiser, alardeando o seu sofrimento, protegida por seus advogados milionários. Há de conseguir uma rede internacional de solidariedade, para que todos tenham direito de matar a fome em cozinhas de luxo, e não falte a ninguém uma empreiteira de estimação.
A ONU é a instância perfeita para o apelo de Lula. É uma entidade recheada de burocratas bem pagos para fomentar a indústria do alarme e da vitimização. Mas a ONU não é perfeita como Lula: parte de suas ações tem efetividade, manchando o ideal do proselitismo 100% parasitário. Deve ter sido um frisson em Genebra a chegada do ídolo brasileiro — que passou 13 anos liderando um governo oprimido, sugando um país inteiro sem perder a ternura, e permanecendo livre, leve e solto, voando por aí. Um mago.
É justamente para continuar livre e solto que Lula foi à ONU. Ele sabe que será condenado por Sérgio Moro. Acaba de virar réu por obstrução de Justiça, no caso Delcídio-Cerveró. Nessas horas é melhor mesmo recorrer aos gigolôs da bondade internacional. É uma turma capaz de ignorar numa boa as obras completas do mensalão e do petrolão, e tratar Lula como um pobre coitado, perseguido por um juiz fascista. A lenda do filho do Brasil cola muito mais fácil do que a do filho adotivo da Odebrecht.
Os plantonistas da solidariedade cenográfica já bateram um bolão na resistência ao golpe contra Dilma. Claro que toda a picaretagem revelada por João Santana não comove essa gente. Nem as confissões da Andrade Gutierrez sobre a rota da propina montada com um assessor direto da companheira afastada, injustiçada e perseguida. Muito menos o buraco em que esses heróis progressistas jogaram o Brasil, escondendo déficits graças à arte da prostituição contábil. Nada disso é crime para os simpáticos jardineiros da fraude.
Os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro representam um momento histórico. Marcarão a demissão definitiva da mulher sapiens, e a devolução ao povo da frota federal que serve sua filha. Ainda tem gente escolarizada defendendo esse escárnio — contando ninguém acredita —, mas são cada vez menos. Até a vocação para o vexame tem seus limites. A Olimpíada do Rio encerra também a maratona de Lula correndo da polícia. Daí em diante, a prova é de 100 metros rasos. Se a democracia ultrapassar a demagogia, o ex-presidente vai ter que pagar pela ação entre amigos que depenou o Brasil.
A opinião pública segue, como sempre, em sua viagem na maionese. Segundo dois grandes institutos de pesquisa, a maioria quer eleições presidenciais antecipadas.
Ou a maioria não conhece a lei, ou não está interessada em cumpri-la. É a renovação da esperança para a escola de malandragem que o país, a tanto custo, está enxotando do poder. Os heróis providenciais estão todos aí, excitadíssimos, para herdar o rebanho petista. São os que, de forma mais ou menos envergonhada, combateram o impeachment da mulher honrada — aí incluídos os puritanos da Rede, PSOL e demais genéricos do PT. Prestem atenção: estarão todos nas eleições municipais atacando o governo de homens velhos, brancos, bobos e feios de Michel Temer.
Esse governo careta, recatado e do lar, que não tem mulher sapiens para divertir a plateia, está arrumando a casa. Não porque Temer seja um iluminado. Ele só percebeu — como Itamar duas décadas antes — que sua única chance era botar os melhores para tomar conta do dinheiro. E botou. Saiu a delinquência fisiológica, entrou a eficiência. É assustador para os parasitas das lendas humanitárias ver a máquina nas mãos de profissionais.
O vento já virou, o Brasil vai melhorar, e isso é terrível. Como na época do Plano Real, os solidários de butique correm o risco de voltar a pregar no deserto, enquanto a vida da população desgraçadamente progride. Quem vai comprar ideologia vagabunda num cenário desses?
Só pedindo socorro à ONU. Mas se apressem, porque depois da Rio 2016 será a hora do xadrez.
Guilherme Fiuza
O laboratório da Lava-Jato descobriu que a campanha da presidente afastada derramava milhões de reais numa empresa de fachada do setor de informática, entre outros anabolizantes criminosos. No caso do ex-presidente, uma nova substância ilegal foi atestada em laudo da Polícia Federal — constatando que as reformas no sítio de Lula que não é de Lula foram orientadas pelo próprio. Só a repaginação da cozinha custou 252 mil reais.
O ex-presidente já avisou que não vai deixar barato. De fato, nada que envolva Lula é barato. Perguntem aos laranjas da Odebrecht que compraram um prédio para o Instituto Lula. E lá foi o maior palestrante do mundo para Genebra, com sua comitiva, denunciar à ONU a perseguição que está sofrendo no Brasil.
A elite vermelha está rica, pode rodar o mundo se quiser, alardeando o seu sofrimento, protegida por seus advogados milionários. Há de conseguir uma rede internacional de solidariedade, para que todos tenham direito de matar a fome em cozinhas de luxo, e não falte a ninguém uma empreiteira de estimação.
É justamente para continuar livre e solto que Lula foi à ONU. Ele sabe que será condenado por Sérgio Moro. Acaba de virar réu por obstrução de Justiça, no caso Delcídio-Cerveró. Nessas horas é melhor mesmo recorrer aos gigolôs da bondade internacional. É uma turma capaz de ignorar numa boa as obras completas do mensalão e do petrolão, e tratar Lula como um pobre coitado, perseguido por um juiz fascista. A lenda do filho do Brasil cola muito mais fácil do que a do filho adotivo da Odebrecht.
Os plantonistas da solidariedade cenográfica já bateram um bolão na resistência ao golpe contra Dilma. Claro que toda a picaretagem revelada por João Santana não comove essa gente. Nem as confissões da Andrade Gutierrez sobre a rota da propina montada com um assessor direto da companheira afastada, injustiçada e perseguida. Muito menos o buraco em que esses heróis progressistas jogaram o Brasil, escondendo déficits graças à arte da prostituição contábil. Nada disso é crime para os simpáticos jardineiros da fraude.
Os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro representam um momento histórico. Marcarão a demissão definitiva da mulher sapiens, e a devolução ao povo da frota federal que serve sua filha. Ainda tem gente escolarizada defendendo esse escárnio — contando ninguém acredita —, mas são cada vez menos. Até a vocação para o vexame tem seus limites. A Olimpíada do Rio encerra também a maratona de Lula correndo da polícia. Daí em diante, a prova é de 100 metros rasos. Se a democracia ultrapassar a demagogia, o ex-presidente vai ter que pagar pela ação entre amigos que depenou o Brasil.
A opinião pública segue, como sempre, em sua viagem na maionese. Segundo dois grandes institutos de pesquisa, a maioria quer eleições presidenciais antecipadas.
Ou a maioria não conhece a lei, ou não está interessada em cumpri-la. É a renovação da esperança para a escola de malandragem que o país, a tanto custo, está enxotando do poder. Os heróis providenciais estão todos aí, excitadíssimos, para herdar o rebanho petista. São os que, de forma mais ou menos envergonhada, combateram o impeachment da mulher honrada — aí incluídos os puritanos da Rede, PSOL e demais genéricos do PT. Prestem atenção: estarão todos nas eleições municipais atacando o governo de homens velhos, brancos, bobos e feios de Michel Temer.
Esse governo careta, recatado e do lar, que não tem mulher sapiens para divertir a plateia, está arrumando a casa. Não porque Temer seja um iluminado. Ele só percebeu — como Itamar duas décadas antes — que sua única chance era botar os melhores para tomar conta do dinheiro. E botou. Saiu a delinquência fisiológica, entrou a eficiência. É assustador para os parasitas das lendas humanitárias ver a máquina nas mãos de profissionais.
O vento já virou, o Brasil vai melhorar, e isso é terrível. Como na época do Plano Real, os solidários de butique correm o risco de voltar a pregar no deserto, enquanto a vida da população desgraçadamente progride. Quem vai comprar ideologia vagabunda num cenário desses?
Só pedindo socorro à ONU. Mas se apressem, porque depois da Rio 2016 será a hora do xadrez.
Guilherme Fiuza
O maior legado da Olimpíada.
Esses apartamentos inacabados na Vila Olímpica não são nada para mim. Nada, diante da grande vergonha, de dimensões planetárias, que é a catástrofe ambiental do Rio de Janeiro. É pavoroso o crime de omissão (e provável desvio de verba) de sucessivos governos estaduais no cenário natural mais belo e majestoso do mundo. Pelo menos o crime está sendo exposto para o mundo. Viva a Olimpíada!
Além de carioca, sou militante desta Cidade Maravilhosa, nasci em Copacabana quando “arrastão” nada mais era que pescadores chegando com suas redes à areia coalhada de conchas e tatuís, peixes brilhando ao sol, águas cristalinas. Quando o Rio de Janeiro foi escolhido sede dos Jogos, em 2009, concorrendo com Madri, Tóquio e Chicago, vibrei. Era o momento de investir com seriedade. A adesão do povo foi impressionante: 85% queriam muito que o Rio fosse escolhido. Ingenuidade? Otimismo? Uma pesquisa da revista Forbes com 10 mil pessoas em 20 países acabava de eleger o Rio como “a cidade mais feliz do mundo”.
Meu artigo, há sete anos, parafraseava Barack Obama no título: “Sim, nós podemos”. Escrevi que cobraríamos o cumprimento de promessas porque estávamos “cansados de testemunhar falcatruas e projetos megalomaníacos que enchem os bolsos de políticos e são inúteis para a população”. Confiava em “uma virada” se houvesse “planejamento e responsabilidade”.
Nesse balneário com vistas de tirar o fôlego e clima ameno, havia três desafios a ser confrontados com a garra de atletas que buscam o ouro no pódio: a despoluição da Baía de Guanabara, a segurança pública e a infraestrutura urbana, com transporte adequado. Sabíamos como Barcelona havia aproveitado a oportunidade para se tornar um polo internacional de turismo. Por que não o Rio?
Até o prefeito Eduardo Paes me contradiz agora. Para o jornal inglêsThe Guardian, ele disse que “sim, nós perdemos”. “Esta [Olimpíada] é uma oportunidade perdida para o Brasil. Não estamos nos apresentando bem. Com todas essas crises econômicas e políticas, com todos esses escândalos, não é o melhor momento para estar nos olhos do mundo”, comentou, mas também reclamou de exagero nas críticas. “Isso me deixa louco. Se você ler os meios de comunicação internacionais, parece que tudo aqui é zika e pessoas atirando umas nas outras.”
Além de carioca, sou militante desta Cidade Maravilhosa, nasci em Copacabana quando “arrastão” nada mais era que pescadores chegando com suas redes à areia coalhada de conchas e tatuís, peixes brilhando ao sol, águas cristalinas. Quando o Rio de Janeiro foi escolhido sede dos Jogos, em 2009, concorrendo com Madri, Tóquio e Chicago, vibrei. Era o momento de investir com seriedade. A adesão do povo foi impressionante: 85% queriam muito que o Rio fosse escolhido. Ingenuidade? Otimismo? Uma pesquisa da revista Forbes com 10 mil pessoas em 20 países acabava de eleger o Rio como “a cidade mais feliz do mundo”.
Meu artigo, há sete anos, parafraseava Barack Obama no título: “Sim, nós podemos”. Escrevi que cobraríamos o cumprimento de promessas porque estávamos “cansados de testemunhar falcatruas e projetos megalomaníacos que enchem os bolsos de políticos e são inúteis para a população”. Confiava em “uma virada” se houvesse “planejamento e responsabilidade”.
Nesse balneário com vistas de tirar o fôlego e clima ameno, havia três desafios a ser confrontados com a garra de atletas que buscam o ouro no pódio: a despoluição da Baía de Guanabara, a segurança pública e a infraestrutura urbana, com transporte adequado. Sabíamos como Barcelona havia aproveitado a oportunidade para se tornar um polo internacional de turismo. Por que não o Rio?
Até o prefeito Eduardo Paes me contradiz agora. Para o jornal inglêsThe Guardian, ele disse que “sim, nós perdemos”. “Esta [Olimpíada] é uma oportunidade perdida para o Brasil. Não estamos nos apresentando bem. Com todas essas crises econômicas e políticas, com todos esses escândalos, não é o melhor momento para estar nos olhos do mundo”, comentou, mas também reclamou de exagero nas críticas. “Isso me deixa louco. Se você ler os meios de comunicação internacionais, parece que tudo aqui é zika e pessoas atirando umas nas outras.”
Vídeo tailandês satirizando 'limpeza' olímpica da Baía de Guanabara
Torcemos para a Olimpíada dar certo, em paz, sem ataques terroristas, sem assaltos a delegações e turistas, sem mortes de inocentes. E que sejam contornáveis os problemas na organização. Já nem são medalhas a nossa prioridade.
Um legado da Olimpíada talvez seja o reconhecimento de nosso vexame maior: as águas imundas e poluídas do Rio. Especialistas em saúde deram aos nadadores e velejadores um conselho. Fiquem de boca fechada para evitar doenças com dejetos, lixo, bactérias, rotavírus. “Os atletas estrangeiros estarão literalmente nadando em m... humana e correm o risco de adoecer por conta de todos aqueles micro-organismos”, disse ao jornal The New York Times Daniel Becker, pediatra carioca.
No ano passado, almocei com o governador Pezão e mencionei o fracasso de seu compromisso de despoluir a Baía até a Olimpíada. “Ruth, isso também é exagero do pessoal. Tem uns sacos boiando, uns pneus... a gente vai conseguir limpar.” Em 2014, ele dizia que a meta era ter 80% do esgoto tratado. Mas empurrou a meta com a barriga. Nas águas da Baía, há geladeiras, sofás, resíduos químicos de fábricas, óleo dos petroleiros. E, volta e meia, cadáveres.
Só pode ser gozação chamar de “ecobarco” aquele troço que faz papel de Comlurb na Baía de Guanabara, retirando toneladas de “lixo flutuante”. “Ecoboat” e ecobarreira não são nem paliativos. A 11 dias dos Jogos, foi retirada uma geladeira da água. Lars Grael, medalhista olímpico nas Olimpíadas de Seul e de Atlanta, disse que será “uma competição de vela com obstáculos”. Seu diagnóstico, em dia sem chuva: “Bastante sujeira, muito óleo na superfície e detritos. Plásticos, latas, engradados. Imagina, em plena regata, essa quantidade de lixo prendendo no casco da embarcação”.
Não foi por falta de planos bilionários ou de doações internacionais. Até ajuda do Japão o Rio já teve. As instalações de tratamento de esgoto são abandonadas ou sofrem vandalismo. As bombas param de funcionar e fica tudo por isso mesmo. Foi é por falta de vergonha.
Muita gente culpa “o brasileiro”, esse povo sem cultura ambiental. É verdade. Mesmo brasileiro com doutorado não sabe cuidar do lixo ou sai emporcalhando as praias. Mas o buraco é muito mais embaixo. Mais de 100 milhões de brasileiros não têm saneamento básico. Metade da população do país não tem coleta de esgoto! Depois da Olimpíada, talvez mude a cultura ambiental. É só a gente não ficar de boca fechada.
Um legado da Olimpíada talvez seja o reconhecimento de nosso vexame maior: as águas imundas e poluídas do Rio. Especialistas em saúde deram aos nadadores e velejadores um conselho. Fiquem de boca fechada para evitar doenças com dejetos, lixo, bactérias, rotavírus. “Os atletas estrangeiros estarão literalmente nadando em m... humana e correm o risco de adoecer por conta de todos aqueles micro-organismos”, disse ao jornal The New York Times Daniel Becker, pediatra carioca.
No ano passado, almocei com o governador Pezão e mencionei o fracasso de seu compromisso de despoluir a Baía até a Olimpíada. “Ruth, isso também é exagero do pessoal. Tem uns sacos boiando, uns pneus... a gente vai conseguir limpar.” Em 2014, ele dizia que a meta era ter 80% do esgoto tratado. Mas empurrou a meta com a barriga. Nas águas da Baía, há geladeiras, sofás, resíduos químicos de fábricas, óleo dos petroleiros. E, volta e meia, cadáveres.
Só pode ser gozação chamar de “ecobarco” aquele troço que faz papel de Comlurb na Baía de Guanabara, retirando toneladas de “lixo flutuante”. “Ecoboat” e ecobarreira não são nem paliativos. A 11 dias dos Jogos, foi retirada uma geladeira da água. Lars Grael, medalhista olímpico nas Olimpíadas de Seul e de Atlanta, disse que será “uma competição de vela com obstáculos”. Seu diagnóstico, em dia sem chuva: “Bastante sujeira, muito óleo na superfície e detritos. Plásticos, latas, engradados. Imagina, em plena regata, essa quantidade de lixo prendendo no casco da embarcação”.
Não foi por falta de planos bilionários ou de doações internacionais. Até ajuda do Japão o Rio já teve. As instalações de tratamento de esgoto são abandonadas ou sofrem vandalismo. As bombas param de funcionar e fica tudo por isso mesmo. Foi é por falta de vergonha.
Muita gente culpa “o brasileiro”, esse povo sem cultura ambiental. É verdade. Mesmo brasileiro com doutorado não sabe cuidar do lixo ou sai emporcalhando as praias. Mas o buraco é muito mais embaixo. Mais de 100 milhões de brasileiros não têm saneamento básico. Metade da população do país não tem coleta de esgoto! Depois da Olimpíada, talvez mude a cultura ambiental. É só a gente não ficar de boca fechada.
Lula, um caso perdido
O título acima expressa minha convicção de que o ex-presidente está condenado a uma das muitas grades em que se pode conter um ser humano: as que o amarram ao pequeno séquito dos que compartilham os mesmos vícios e desvios morais.
Entenda-me o leitor. Assim como os dependentes químicos se reúnem, qual escombros humanos, em terrenos baldios e obscuros recantos das cidades, assim também pessoas na situação moral e legal de Lula agrupam-se por semelhança e fogem do convívio com pessoas de bem. O mal feito às ocultas, nos porões, um dia é proclamado desde os telhados. E o que estava nas páginas dos processos, nas denúncias, nas provas e nos privilégios de foro, vai para as manchetes dos jornais. Acaba o teatro e a vida real começa. Pode ser curto, muito curto, o caminho entre a conduta viciosa ou criminosa e essa forma de reclusão por rejeição e repulsa social.
Será ele preso, condenado e cumprirá pena? Sei lá! No dia em que eu entender a Justiça em nosso país e, de modo especial, nossa Suprema Corte, que certamente exercerá o último grau de jurisdição no processo de todos os notáveis hoje investigados, provavelmente haverá outra composição por lá e nós estaremos vivendo num Brasil melhor. Não, não tenho resposta para essa pergunta. Nosso STF faz "desacontecer" fatos que todos viram e ouviram. Mas Lula, ainda não como se espera, já está sendo punido. Está contido, preso. Basta vê-lo, como o vi agora, há poucos minutos, na TV.
Quando Delcídio Amaral perdeu o mandato de senador, agravou-se a situação do ex-presidente. O Procurador Geral da República pediu ao ministro Teori Zavascki que o processo - que incluía Lula - fosse enviado para Curitiba e para o juiz Sérgio Moro. Ouriçou-se a morofobia do estadista de Garanhuns que, por seu advogado, solicitou a remessa para a Justiça Federal de São Paulo. O ministro, porém, acabou enviando tudo para Brasília, considerando que lá foi praticada a maior parte dos atos denunciados.
Não poderia desabar sobre os muitos problemas do ex-presidente algo mais inoportuno do que a decisão do juiz Ricardo Leite tornando-o réu no exato momento em que choraminga perante a ONU as injustiças e perseguições que estaria sofrendo por parte de Sérgio Moro. Imagine só a situação: tapado de orgulho das próprias virtudes, inocente como um anjo de Rafael, vê seu delírio persecutório desfazer-se com o reconhecimento de outra robusta hipótese criminal em vara diferente, longe da tenebrosa Curitiba de seus mais freqüentes arrepios.
Orgulho, ambição e vaidade formam um explosivo coquetel. E Lula o bebeu até a última gota.
Percival Puggina
Entenda-me o leitor. Assim como os dependentes químicos se reúnem, qual escombros humanos, em terrenos baldios e obscuros recantos das cidades, assim também pessoas na situação moral e legal de Lula agrupam-se por semelhança e fogem do convívio com pessoas de bem. O mal feito às ocultas, nos porões, um dia é proclamado desde os telhados. E o que estava nas páginas dos processos, nas denúncias, nas provas e nos privilégios de foro, vai para as manchetes dos jornais. Acaba o teatro e a vida real começa. Pode ser curto, muito curto, o caminho entre a conduta viciosa ou criminosa e essa forma de reclusão por rejeição e repulsa social.
Quando Delcídio Amaral perdeu o mandato de senador, agravou-se a situação do ex-presidente. O Procurador Geral da República pediu ao ministro Teori Zavascki que o processo - que incluía Lula - fosse enviado para Curitiba e para o juiz Sérgio Moro. Ouriçou-se a morofobia do estadista de Garanhuns que, por seu advogado, solicitou a remessa para a Justiça Federal de São Paulo. O ministro, porém, acabou enviando tudo para Brasília, considerando que lá foi praticada a maior parte dos atos denunciados.
Não poderia desabar sobre os muitos problemas do ex-presidente algo mais inoportuno do que a decisão do juiz Ricardo Leite tornando-o réu no exato momento em que choraminga perante a ONU as injustiças e perseguições que estaria sofrendo por parte de Sérgio Moro. Imagine só a situação: tapado de orgulho das próprias virtudes, inocente como um anjo de Rafael, vê seu delírio persecutório desfazer-se com o reconhecimento de outra robusta hipótese criminal em vara diferente, longe da tenebrosa Curitiba de seus mais freqüentes arrepios.
Orgulho, ambição e vaidade formam um explosivo coquetel. E Lula o bebeu até a última gota.
Percival Puggina
O que é política hoje?
Nunca vi tanto ódio, incompreensão, agressão, despautério. Nesse Brasil, viramos inimigos um do outro. É um país dividido. Se você for defender uma ideia política, o cara pode te dar um tiro.
Eu peguei a Revolução Socialista, que ia mudar o mundo. Não mudou. Hoje, não sabemos o que pode mudar o mundo. Essa impotência é que paralisa. As tais utopias… Cadê? Quais são? O que é política hoje?Ignacio de Loyola Brandão
O álibi ultrajante de Cidinha Campos
No fim de tarde rodeando a casa modesta no topo de uma ladeira de Olinda, de onde se vê o sol desaparecer na fresta entre o horizonte e o mar, o pernambucano neto de escravos, de olhos, fala e coração mansos, reuniu parte da coleção de netos para começar a leitura de "A Vida dos Doze Césares". Meu avô trazia mapas, anotações e livros coadjuvantes: não era bem uma leitura, já que ele sabia tudo de cor e selecionava o que e como contar à audiência infantil; era mais uma folia regida para nos ensinar a intimidade entre leitura-literatura, conhecimento e afeto; e a lição de que os homens – todos poeira passageira, sejam imperadores ou escravos – agem pelo caráter, no Império Romano ou em Olinda. Começava narrando assim “isso foi bem antes desse velho preto nascer, mas nem tanto”.
Foi bem antes de existirem os portais da minha vida – minha mãe nascida da minha vó portuguesa alvíssima que não conheci de olhos verdes cuja cor adivinho nas fotos em branco e preto e que era rica e foi deserdada pela família porque cismou de casar com o preto magro e pobre só para ele ser meu avô e me dar esse apelido que usa botas nesta coluna – que Suetônio descreveu o choro de Júlio César diante do túmulo de Alexandre, o Grande, pois já ultrapassara a idade de 32 anos que o macedônio tinha quando morreu dono do mundo, mas o general romano só obteria glória parecida por volta dos 50 anos.
O Brasil inteiro deveria prantear o fato de chegar ao século 21 com apenas 48,6% da população atendida por rede de esgoto. Além desse dado, o site http://www.tratabrasil.org.br informa que apenas 40% do esgoto coletado recebe tratamento. Isso não me escandaliza mais; no país onde o básico é luxo, o que me intriga é como, depois de apenas 516 anos do descobrimento, quase metade da população já desfrute desse item civilizatório e a indiferença ultrajante dos 48,6% se soma à indigna pasmaceira dos 51,4% para resultar naquilo que boia nas águas olímpicas do Rio de Janeiro ou nas dos rios, córregos, praias, lagoas e lagos das cidades brasileiras: nossa cidadania rarefeita.
A consciência indigente do brasileiro a respeito das obrigações dos governantes degenerou, sob o lulopetismo, na indigência consciente do populismo de um governo do atraso cujas políticas primitivas se restringem a cotas, bolsa-disso-e-daquilo e ao discurso inaugurando ódios na pregação embusteira de que ele, sim, faz tudo pelos pobres, enquanto lhes nega dignidade. Flores desse mal são, por exemplo, Matilde Ribeiro (ministra da Secretaria da Igualdade Racial de Dilma Rousseff ) e Cidinha Campos (PDT-RJ).
Quando a então ministra disse que não era preconceito “se um negro se insurgir contra um branco”, pois “quem foi açoitado a vida inteira não tinha obrigação de gostar de quem o açoitou”, enviei-lhe um email informando que, apesar de branco, meu pai jamais açoitara alguém; como filha de mãe mulata, gostaria que nenhum dos dois fosse atacado em virtude da cor; e um governo preocupado com a igualdade racial não determina os preconceitos justos, mas combate todos, conciliando a nação. Não tinha expectativa de resposta e Matilde, como boa petista de quem sempre espero o pior, não me decepcionou. Agora, Cidinha Campos se diz contra a violência doméstica, desde que a vítima seja “desvalida” e não tenha como “se socorrer”.
Ela não está apenas afirmando que mulher rica tem a missão social de apanhar à vontade, nem apenas desprezando o fato de a violência não ser meio de resolver coisa nenhuma: também está pouco ligando para as mulheres pobres que apanham, pois enxerga nelas apenas a condição social como álibi ultrajante para ser a vice do intolerável Pedro Paulo, abstraindo o sofrimento concreto de mulheres reais. O limite da violência doméstica é o assassinato, mas a indecência dos políticos parece não ter limites.
Por esse critério, Sandra Gomide e Eliane de Grammond, por exemplo, tinham como se socorrer, então por que estão mortas? Ao costumeiro julgamento da vítima desses tipos de crime, será acrescentado agora o delito da riqueza; a garota carioca vítima de estupro coletivo foi acusada de ser branca e só por isso o caso teria repercutido; as feministas emudecem se são menores de idade os estupradores em casos de repercussão – será que algum dia desfrutaremos uma cidadania não seletiva e menos rala, que não preconize a porrada autorizada, o estupro merecido, o preconceito correto, a igualdade diferente perante a lei?
Essa inquietação é um dos principais nervos das manifestações pró-impeachment exposto na última delas, depois de Dilma nomear Lula ministro, colocando-o acima da lei a que todos devemos nos submeter. Compreendo que ele não queira ser preso, eu também não quero, por isso, ao contrário dele, não faço nada que enseje cadeia. O farsante recorrer à ONU como perseguido político, escarnecendo do país e da lei que lhe escancara todas as brechas exclusivas a quem, como ele, pode pagar (com que dinheiro?) para escancará-las, revela que Thomas Turbando continua o ato imundo na nossa cara e que é preciso voltarmos às ruas dia 31 exigindo o respeito que essa súcia miserável nos roubou antes de roubar nossa grana.
Cresci em São Paulo e um sotaque leve que a memória afetiva faz remanescente não é o bastante para as pessoas perceberem que sou pernambucana, portanto é comum ouvir de algumas delas uma opinião detestável e estereotipada sobre os nordestinos. Como a maioria deles votou em Lula e Dilma, a coisa piorou. No começo, argumentava que paulistas elegeram Pitta e Haddad e deram inexplicável longevidade política a Paulo Maluf, o Rio Grande do Sul elegera Tarso Genro, etc. Mas cansei, agora corto o papo, revelo minha origem e digo que aqueles termos são ofensivos mesmo se ela fosse outra. A reação de surpresa é acompanhada de um ainda mais ofensivo “Ah, mas você é uma nordestina diferente”. Não sou: como qualquer brasileiro, desvalido ou não, vivo sob a mesma matéria que boia nas águas momentaneamente olímpicas do país.
Em 2011, algumas semanas antes de completar 103 anos, meu avô disse que, para uma poeira passageira, já tinha durado demais e estava cansado. Dias depois, pegou um atalho no cochilo depois do almoço e não acordou mais. Lá no topo da ladeira de onde se vê o sol desaparecer na fresta entre o horizonte e o mar.
Foi bem antes de existirem os portais da minha vida – minha mãe nascida da minha vó portuguesa alvíssima que não conheci de olhos verdes cuja cor adivinho nas fotos em branco e preto e que era rica e foi deserdada pela família porque cismou de casar com o preto magro e pobre só para ele ser meu avô e me dar esse apelido que usa botas nesta coluna – que Suetônio descreveu o choro de Júlio César diante do túmulo de Alexandre, o Grande, pois já ultrapassara a idade de 32 anos que o macedônio tinha quando morreu dono do mundo, mas o general romano só obteria glória parecida por volta dos 50 anos.
O Brasil inteiro deveria prantear o fato de chegar ao século 21 com apenas 48,6% da população atendida por rede de esgoto. Além desse dado, o site http://www.tratabrasil.org.br informa que apenas 40% do esgoto coletado recebe tratamento. Isso não me escandaliza mais; no país onde o básico é luxo, o que me intriga é como, depois de apenas 516 anos do descobrimento, quase metade da população já desfrute desse item civilizatório e a indiferença ultrajante dos 48,6% se soma à indigna pasmaceira dos 51,4% para resultar naquilo que boia nas águas olímpicas do Rio de Janeiro ou nas dos rios, córregos, praias, lagoas e lagos das cidades brasileiras: nossa cidadania rarefeita.
A consciência indigente do brasileiro a respeito das obrigações dos governantes degenerou, sob o lulopetismo, na indigência consciente do populismo de um governo do atraso cujas políticas primitivas se restringem a cotas, bolsa-disso-e-daquilo e ao discurso inaugurando ódios na pregação embusteira de que ele, sim, faz tudo pelos pobres, enquanto lhes nega dignidade. Flores desse mal são, por exemplo, Matilde Ribeiro (ministra da Secretaria da Igualdade Racial de Dilma Rousseff ) e Cidinha Campos (PDT-RJ).
Quando a então ministra disse que não era preconceito “se um negro se insurgir contra um branco”, pois “quem foi açoitado a vida inteira não tinha obrigação de gostar de quem o açoitou”, enviei-lhe um email informando que, apesar de branco, meu pai jamais açoitara alguém; como filha de mãe mulata, gostaria que nenhum dos dois fosse atacado em virtude da cor; e um governo preocupado com a igualdade racial não determina os preconceitos justos, mas combate todos, conciliando a nação. Não tinha expectativa de resposta e Matilde, como boa petista de quem sempre espero o pior, não me decepcionou. Agora, Cidinha Campos se diz contra a violência doméstica, desde que a vítima seja “desvalida” e não tenha como “se socorrer”.
Ela não está apenas afirmando que mulher rica tem a missão social de apanhar à vontade, nem apenas desprezando o fato de a violência não ser meio de resolver coisa nenhuma: também está pouco ligando para as mulheres pobres que apanham, pois enxerga nelas apenas a condição social como álibi ultrajante para ser a vice do intolerável Pedro Paulo, abstraindo o sofrimento concreto de mulheres reais. O limite da violência doméstica é o assassinato, mas a indecência dos políticos parece não ter limites.
Por esse critério, Sandra Gomide e Eliane de Grammond, por exemplo, tinham como se socorrer, então por que estão mortas? Ao costumeiro julgamento da vítima desses tipos de crime, será acrescentado agora o delito da riqueza; a garota carioca vítima de estupro coletivo foi acusada de ser branca e só por isso o caso teria repercutido; as feministas emudecem se são menores de idade os estupradores em casos de repercussão – será que algum dia desfrutaremos uma cidadania não seletiva e menos rala, que não preconize a porrada autorizada, o estupro merecido, o preconceito correto, a igualdade diferente perante a lei?
Essa inquietação é um dos principais nervos das manifestações pró-impeachment exposto na última delas, depois de Dilma nomear Lula ministro, colocando-o acima da lei a que todos devemos nos submeter. Compreendo que ele não queira ser preso, eu também não quero, por isso, ao contrário dele, não faço nada que enseje cadeia. O farsante recorrer à ONU como perseguido político, escarnecendo do país e da lei que lhe escancara todas as brechas exclusivas a quem, como ele, pode pagar (com que dinheiro?) para escancará-las, revela que Thomas Turbando continua o ato imundo na nossa cara e que é preciso voltarmos às ruas dia 31 exigindo o respeito que essa súcia miserável nos roubou antes de roubar nossa grana.
Cresci em São Paulo e um sotaque leve que a memória afetiva faz remanescente não é o bastante para as pessoas perceberem que sou pernambucana, portanto é comum ouvir de algumas delas uma opinião detestável e estereotipada sobre os nordestinos. Como a maioria deles votou em Lula e Dilma, a coisa piorou. No começo, argumentava que paulistas elegeram Pitta e Haddad e deram inexplicável longevidade política a Paulo Maluf, o Rio Grande do Sul elegera Tarso Genro, etc. Mas cansei, agora corto o papo, revelo minha origem e digo que aqueles termos são ofensivos mesmo se ela fosse outra. A reação de surpresa é acompanhada de um ainda mais ofensivo “Ah, mas você é uma nordestina diferente”. Não sou: como qualquer brasileiro, desvalido ou não, vivo sob a mesma matéria que boia nas águas momentaneamente olímpicas do país.
Em 2011, algumas semanas antes de completar 103 anos, meu avô disse que, para uma poeira passageira, já tinha durado demais e estava cansado. Dias depois, pegou um atalho no cochilo depois do almoço e não acordou mais. Lá no topo da ladeira de onde se vê o sol desaparecer na fresta entre o horizonte e o mar.
Réu, Lula entra na faxina da era PT como detrito
Prestes a ser confirmado pelo Senado, o impeachment de Dilma Roussef marca o fim da era petista no poder federal —uma época que acaba com exames de consciência e uma tentativa de faxina. Convertido em réu pela primeira vez num processo relacionado à Lava Jato, Lula entra nesse pedaço da história brasileira como detrito.
Suprema ironia: um dia depois de recorrer ao Comitê de Direitos Humanos da ONU contra o juiz Sérgio Moro, Lula foi enviado ao banco dos réus por outro magistrado. O doutor Ricardo Leite, de Brasília, aceitou a denúncia em que a Procuradoria da República acusa Lula, o senador cassado Delcidio Amaral e outras cinco pessoas de tentar sabotar a Lava Jato comprando o silêncio do delator Nestor Cerveró por R$ 250 mil.
Esse pedaço do escândalo ficou em Brasília graças ao empenho da defesa de Lula para desmembrar a Lava Jato, afastando-a da mesa de Moro. O petismo soltou fogos quando o ministro Teori Zavaschi, relator do caso no STF, decidiu manter na Capital esse naco do inquérito. Deu chabu. A exemplo do que já sucedeu com partes do processo enviadas para outras praças, juízes de São Paulo e do Rio parecem acometidos de uma espécie de ‘efeito Moro’. Tomam decisões draconianas uma atrás da outra.
Para que outra época comece, a faxina é fundamental. É preciso recolocar o abajur em pé, desentortar a vara do trombone e certificar-se de que o governo de Michel Temer não continuará tentando esconder peemedebistas sujos sob o tapete. Dessa limpeza depende a qualidade da democracia brasileira.
Lula amou a democracia até o capítulo que estipulava que um ex-operário também pode chegar à Presidência da República. Passou a abominar o sistema depois que o Brasil se deu conta de que numa democracia plena todos são iguais perante a lei. Tratado como detrito e já meio farto de tanta democracia, Lula agora se queixa à ONU dos alegados excessos da “República de Curitiba”.
Suprema ironia: um dia depois de recorrer ao Comitê de Direitos Humanos da ONU contra o juiz Sérgio Moro, Lula foi enviado ao banco dos réus por outro magistrado. O doutor Ricardo Leite, de Brasília, aceitou a denúncia em que a Procuradoria da República acusa Lula, o senador cassado Delcidio Amaral e outras cinco pessoas de tentar sabotar a Lava Jato comprando o silêncio do delator Nestor Cerveró por R$ 250 mil.
Para que outra época comece, a faxina é fundamental. É preciso recolocar o abajur em pé, desentortar a vara do trombone e certificar-se de que o governo de Michel Temer não continuará tentando esconder peemedebistas sujos sob o tapete. Dessa limpeza depende a qualidade da democracia brasileira.
Lula amou a democracia até o capítulo que estipulava que um ex-operário também pode chegar à Presidência da República. Passou a abominar o sistema depois que o Brasil se deu conta de que numa democracia plena todos são iguais perante a lei. Tratado como detrito e já meio farto de tanta democracia, Lula agora se queixa à ONU dos alegados excessos da “República de Curitiba”.
Por que aceitamos os dramas do lixo?
Entra ano, sai ano e o panorama não muda. Há poucas semanas foi divulgado o índice de sustentabilidade em limpeza urbana para os municípios brasileiros. E a conclusão é melancólica: o número de aterros sanitários inadequados aumentou 52% no Estado de São Paulo em 2015, na comparação com o ano anterior, segundo a Companhia Ambiental do Estado. O Índice de Qualidade de Aterros de Resíduos mostrou descartes inadequados em 41 municípios paulistas (em 2015 eram 27).
Não se muda. Não se introduz a coleta seletiva, não se transforma, via compostagem, o lixo orgânico em adubo, não se economizam espaços com aterros. Segundo a Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais, apenas 3% dos resíduos sólidos urbanos no Brasil são reciclados, de um total de 76,8 milhões de toneladas produzidas – apesar de a Política Nacional de Resíduos Sólidos estabelecer há anos prioridade para esse objetivo. Continua-se a esperar que o poder público municipal destine recursos para a área. Já os governantes querem que os munícipes paguem pela coleta, pela reciclagem e pelo aterramento. Mas os cidadãos não aceitam pagar, acham que o custo dessa tarefa já está embutido nos impostos municipais. E não se avança.
Em todo o mundo só se consegue solução se o gerador do lixo o separar (seco e orgânico) e pagar por coleta, destinação e reciclagem. Por aqui aceitamos que 3 mil municípios dos mais de 5.500 ainda mantenham lixões.
O Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana para os Municípios Brasileiros, que veio a público agora (PWC , Sindicato de Empresas de Limpeza Urbana do Estado de São Paulo e ABLP), afirma que “não há referências quantitativas capazes de sintetizar as metas esperadas pela Política Nacional de Resíduos Sólidos em um cenário de vinte anos para os municípios brasileiros” – o que dificulta a formulação de políticas, financiamentos, monitoramento da qualidade de serviços, prioridades. Por isso se criou o novo índice, que foi avaliado em 3.500 municípios
Os problemas mais frequentes não surpreendem: inadimplência de prefeituras no pagamento de serviços contratados; ausência de coleta seletiva; manutenção de lixões; descaso ou ignorância das populações quanto às políticas da área; proliferação de doenças no setor. A Região Sul é a que tem os melhores índices de sustentabilidade, em seus três Estados. Nenhum município de porte maior se classificou entre os 50 com melhores índices. Menos de 50% dos municípios analisados têm arrecadação específica na área de limpeza urbana.
Há capítulos especialmente preocupantes na área. O site meioambiente.mg.gov.br divulga diagnóstico da Fundação Estadual de Meio Ambiente segundo o qual 57,24% do lixo gerado pelos estabelecimentos de saúde de 524 municípios mineiros (19,5 mil toneladas) vão indevidamente para aterro sanitário; o restante, para incineração (8,6 mil toneladas) ou para autoclavagem – 5,9 mil toneladas passaram por tratamento térmico seguido de destinação para aterro sanitários. Nas 524 cidades mineiras incluídas foram produzidas, no período analisado, 34,4 mil toneladas de resíduos de serviços de saúde. Apenas cinco municípios mineiros têm unidade de tratamento e destinação final dos resíduos desses serviços na própria cidade, o restante vai para outras localidades. Mas 95% dos municípios, a maioria de pequeno porte, “preferem enviar parte dos resíduos ou todos para a incineração”.
Área que merece cuidados extremos no Brasil – e da qual pouco se fala – é a dos resíduos eletrônicos, que, segundo órgãos da ONU (retoquejor, 5/7), gerou 1,4 milhão de toneladas de resíduos em 2015. Sem falar em que, segundo associação de empresas de tratamento de resíduos, mais de 500 milhões de aparelhos eletrônicos sem uso permanecem nas residências – podendo até causar problemas de saúde. São Paulo é o Estado que mais produz resíduos eletrônicos (448 mil toneladas anuais), seguido do Rio de Janeiro (165 mil) e de Minas Gerais (127 mil).
Não há ainda um acordo setorial amplo para o setor de resíduos eletrônicos – ao contrário, por exemplo, do setor de pneus. O acordo neste setor fez surgir a ONG Reciclamp, que coleta cerca de mil toneladas de pneus inservíveis em 900 pontos de 26 Estados. Na área de embalagens de óleo o primeiro acordo setorial foi assinado em 2012.
São áreas que merecem muito cuidado, uma vez que continua a desenvolver-se o chamado “colonialismo da imundície”, em que países do Primeiro Mundo exportam para países pobres seus resíduos eletrônicos. No Terceiro Mundo – como na Nigéria, por exemplo – formam-se gigantescos depósitos desses resíduos, que são separados e coletados pela população mais pobre, que os vende a preços ínfimos a empresas transformadoras.
O Brasil não está longe do problema. Várias publicações têm noticiado, por exemplo, que “o maior depósito de lixo a céu aberto da América Latina está no Distrito Federal”, a 15 quilômetros do Palácio do Planalto, e sustenta mais de 2 mil pessoas – é o “lixão da Estrutural”, uma área de 174 hectares. Na época em que foi secretário de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia no Distrito Federal, o autor destas linhas preparou um plano para dar fim ao lixão, implantar um depósito exemplar onde trabalhassem na separação do lixo, com salários dignos, aquelas 2 mil pessoas; a 500 metros de distância, uma usina de reciclagem moderna, administrada por uma cooperativa de catadores. Foi bombardeado por vários setores que tinham interesse na comercialização do lixo obtido a custos quase negativos. Nada foi para a frente. Não é diferente de muitos outros setores em que prevalece a exploração de trabalho quase escravo.
Mas no lixo as questões já foram longe gemais. É preciso que o poder público crie novas regras, novos formatos. A Política Nacional de Resíduos Sólidos deveria ter sido implantada até 2010, foi prorrogada e nada adiantou.
Washington Novaes
Não se muda. Não se introduz a coleta seletiva, não se transforma, via compostagem, o lixo orgânico em adubo, não se economizam espaços com aterros. Segundo a Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais, apenas 3% dos resíduos sólidos urbanos no Brasil são reciclados, de um total de 76,8 milhões de toneladas produzidas – apesar de a Política Nacional de Resíduos Sólidos estabelecer há anos prioridade para esse objetivo. Continua-se a esperar que o poder público municipal destine recursos para a área. Já os governantes querem que os munícipes paguem pela coleta, pela reciclagem e pelo aterramento. Mas os cidadãos não aceitam pagar, acham que o custo dessa tarefa já está embutido nos impostos municipais. E não se avança.
Em todo o mundo só se consegue solução se o gerador do lixo o separar (seco e orgânico) e pagar por coleta, destinação e reciclagem. Por aqui aceitamos que 3 mil municípios dos mais de 5.500 ainda mantenham lixões.
Os problemas mais frequentes não surpreendem: inadimplência de prefeituras no pagamento de serviços contratados; ausência de coleta seletiva; manutenção de lixões; descaso ou ignorância das populações quanto às políticas da área; proliferação de doenças no setor. A Região Sul é a que tem os melhores índices de sustentabilidade, em seus três Estados. Nenhum município de porte maior se classificou entre os 50 com melhores índices. Menos de 50% dos municípios analisados têm arrecadação específica na área de limpeza urbana.
Há capítulos especialmente preocupantes na área. O site meioambiente.mg.gov.br divulga diagnóstico da Fundação Estadual de Meio Ambiente segundo o qual 57,24% do lixo gerado pelos estabelecimentos de saúde de 524 municípios mineiros (19,5 mil toneladas) vão indevidamente para aterro sanitário; o restante, para incineração (8,6 mil toneladas) ou para autoclavagem – 5,9 mil toneladas passaram por tratamento térmico seguido de destinação para aterro sanitários. Nas 524 cidades mineiras incluídas foram produzidas, no período analisado, 34,4 mil toneladas de resíduos de serviços de saúde. Apenas cinco municípios mineiros têm unidade de tratamento e destinação final dos resíduos desses serviços na própria cidade, o restante vai para outras localidades. Mas 95% dos municípios, a maioria de pequeno porte, “preferem enviar parte dos resíduos ou todos para a incineração”.
Área que merece cuidados extremos no Brasil – e da qual pouco se fala – é a dos resíduos eletrônicos, que, segundo órgãos da ONU (retoquejor, 5/7), gerou 1,4 milhão de toneladas de resíduos em 2015. Sem falar em que, segundo associação de empresas de tratamento de resíduos, mais de 500 milhões de aparelhos eletrônicos sem uso permanecem nas residências – podendo até causar problemas de saúde. São Paulo é o Estado que mais produz resíduos eletrônicos (448 mil toneladas anuais), seguido do Rio de Janeiro (165 mil) e de Minas Gerais (127 mil).
Não há ainda um acordo setorial amplo para o setor de resíduos eletrônicos – ao contrário, por exemplo, do setor de pneus. O acordo neste setor fez surgir a ONG Reciclamp, que coleta cerca de mil toneladas de pneus inservíveis em 900 pontos de 26 Estados. Na área de embalagens de óleo o primeiro acordo setorial foi assinado em 2012.
São áreas que merecem muito cuidado, uma vez que continua a desenvolver-se o chamado “colonialismo da imundície”, em que países do Primeiro Mundo exportam para países pobres seus resíduos eletrônicos. No Terceiro Mundo – como na Nigéria, por exemplo – formam-se gigantescos depósitos desses resíduos, que são separados e coletados pela população mais pobre, que os vende a preços ínfimos a empresas transformadoras.
O Brasil não está longe do problema. Várias publicações têm noticiado, por exemplo, que “o maior depósito de lixo a céu aberto da América Latina está no Distrito Federal”, a 15 quilômetros do Palácio do Planalto, e sustenta mais de 2 mil pessoas – é o “lixão da Estrutural”, uma área de 174 hectares. Na época em que foi secretário de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia no Distrito Federal, o autor destas linhas preparou um plano para dar fim ao lixão, implantar um depósito exemplar onde trabalhassem na separação do lixo, com salários dignos, aquelas 2 mil pessoas; a 500 metros de distância, uma usina de reciclagem moderna, administrada por uma cooperativa de catadores. Foi bombardeado por vários setores que tinham interesse na comercialização do lixo obtido a custos quase negativos. Nada foi para a frente. Não é diferente de muitos outros setores em que prevalece a exploração de trabalho quase escravo.
Mas no lixo as questões já foram longe gemais. É preciso que o poder público crie novas regras, novos formatos. A Política Nacional de Resíduos Sólidos deveria ter sido implantada até 2010, foi prorrogada e nada adiantou.
Washington Novaes
Com investimento bilionário na Rio 2016, NBC cria 'corujão' esportivo nos EUA
Muitas pessoas que compraram ingressos para eventos de basquete, natação e vôlei de praia da Rio 2016 devem ter estranhado quando encontraram uma programação mais adequada para uma "balada" do que para uma competição esportiva - as finais na piscina, por exemplo, começam às 22h de Brasília.
Os horários pouco ortodoxos, bem como a escolha dos esportes "agraciados", são mais uma face da imensa influência que a rede de TV americana NBC tem sobre não apenas os Jogos Olímpicos, mas sobre o Comitê Olímpico Internacional (COI). Tudo isso por força do investimento de US$ 1,3 bilhão nos direitos de transmissão da Rio 2016.
Não é surpresa alguma, então, que a emissora dê prioridade ao mercado americano, em especial no que diz respeito a esportes que atraiam o interesse de sua audiência, como é o caso das modalidades citadas acima, ou de provas de interesse universal, como a final dos 100m rasos no atletismo, marcada para 22h30.
Mas na Rio 2016, a NBC tentou influenciar até o protocolo olímpico: no início da semana, a emissora pediu ao COI que mudasse a ordem de entrada das delegações no desfile da Cerimônia de Abertura, na próxima sexta-feira.
De acordo com a tradição, a ordem do desfile tem a Grécia, berço dos Jogos, abrindo o evento, e o país anfitrião fechando. A entrada do restante dos países obede à ordem alfabética de acordo com o idioma local.
Em um comunicado oficial, a NBC disse ter "discussões regulares com nossos parceiros comerciais e o COI sobre tudo que envolve proporcionar a melhor cobertura possível da Olimpíada à nossa audiência nos EUA".
Os executivos da emissora temem um esvaziamento de sua audiência porque, de acordo com a ortografia brasileira, a delegação americana desfilará entre os países iniciados com a letra "E", o que poderá fazer com que parte do público mude de canal depois da passagem dos 555 atletas dos EUA.
sexta-feira, 29 de julho de 2016
A nova carta
Apenas para reativar a memória, este foi o documento apresentado em junho de 2002 pelo então candidato a presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, em que se comprometia a obter o superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) que viesse a ser necessário para controlar a inflação e a dívida pública. Foi a senha que garantiria uma administração responsável das contas públicas e dos demais segmentos da política econômica, a mesma que depois foi colocada em prática nos seus primeiros anos de mandato.
A conversão de Dilma à religião verdadeira não convenceria ninguém
Não está claro qual seria o conteúdo dessa nova carta, a ser assinada pela presidente Dilma. Mas, pelas suas poucas manifestações sobre a política econômica adotada pelo presidente em exercício Michel Temer, parece que a presidente Dilma pretende comprometer-se a adotar uma política econômica de linha ortodoxa, caso seja reconduzida ao Palácio do Planalto.
Apenas essa intenção já implica reconhecimento implícito dos equívocos cometidos durante seu primeiro mandato. Se promete mudança de rumo é porque entendeu que o rumo anterior estava errado.
E já se antevê sua ineficácia, na medida em que seu objetivo não é propriamente convencer a opinião pública de que finalmente beijou a cruz, mas apenas tentar reverter a tendência do Senado em votar pelo impeachment. Depois se veria o que fazer.
A conversão de Dilma à religião verdadeira não convenceria ninguém depois de tudo o que disse e demonstrou sobre seus pontos de vista pessoais. Não é de um mês para o outro que alguém abandona tão arraigadas convicções autoritárias e voluntaristas, como as de que governar é botar o Tesouro para gastar além de suas possibilidades, para depois esconder (ou pedalar) os resultados nefastos, como se viu.
Afora isso, não há o que possa garantir o que agora Dilma parece disposta a admitir: que convidaria a mesma equipe econômica do seu desafeto Michel Temer para conduzir sua política econômica. É ingenuidade admitir que Meirelles, Serra, Goldfajn, Pedro Parente e Maria Sílvia Bastos Marques aceitariam compor seu eventual quadro econômico.
Também seria ingenuidade pretender que Dilma conseguiria reunir gente da mesma qualidade e competência entre os que vêm apoiando sua recondução ao governo.
Depois, não basta declarar as melhores intenções e certa disposição para colocá-las em prática. É preciso ver primeiro quais seriam, na prática, as condições políticas em caso de retomada do governo. Como, por exemplo, poderia Dilma conviver com a ala agora irreconciliável do PMDB liderada por Michel Temer e com um PT que condena com todas as forças “a política neoliberal favorável aos rentistas e aos banqueiros”, a mesma que pudesse ser defendida na nova carta ao povo brasileiro?
É claro que existem duendes. Mas não desse tipo.
A conversão de Dilma à religião verdadeira não convenceria ninguém
Não está claro qual seria o conteúdo dessa nova carta, a ser assinada pela presidente Dilma. Mas, pelas suas poucas manifestações sobre a política econômica adotada pelo presidente em exercício Michel Temer, parece que a presidente Dilma pretende comprometer-se a adotar uma política econômica de linha ortodoxa, caso seja reconduzida ao Palácio do Planalto.
Apenas essa intenção já implica reconhecimento implícito dos equívocos cometidos durante seu primeiro mandato. Se promete mudança de rumo é porque entendeu que o rumo anterior estava errado.
E já se antevê sua ineficácia, na medida em que seu objetivo não é propriamente convencer a opinião pública de que finalmente beijou a cruz, mas apenas tentar reverter a tendência do Senado em votar pelo impeachment. Depois se veria o que fazer.
A conversão de Dilma à religião verdadeira não convenceria ninguém depois de tudo o que disse e demonstrou sobre seus pontos de vista pessoais. Não é de um mês para o outro que alguém abandona tão arraigadas convicções autoritárias e voluntaristas, como as de que governar é botar o Tesouro para gastar além de suas possibilidades, para depois esconder (ou pedalar) os resultados nefastos, como se viu.
Afora isso, não há o que possa garantir o que agora Dilma parece disposta a admitir: que convidaria a mesma equipe econômica do seu desafeto Michel Temer para conduzir sua política econômica. É ingenuidade admitir que Meirelles, Serra, Goldfajn, Pedro Parente e Maria Sílvia Bastos Marques aceitariam compor seu eventual quadro econômico.
Também seria ingenuidade pretender que Dilma conseguiria reunir gente da mesma qualidade e competência entre os que vêm apoiando sua recondução ao governo.
Depois, não basta declarar as melhores intenções e certa disposição para colocá-las em prática. É preciso ver primeiro quais seriam, na prática, as condições políticas em caso de retomada do governo. Como, por exemplo, poderia Dilma conviver com a ala agora irreconciliável do PMDB liderada por Michel Temer e com um PT que condena com todas as forças “a política neoliberal favorável aos rentistas e aos banqueiros”, a mesma que pudesse ser defendida na nova carta ao povo brasileiro?
É claro que existem duendes. Mas não desse tipo.
Milionários, mas insatisfeitos
Nem mesmo dispondo de bilhões de reais que caem anual e automaticamente em suas contas bancárias – e dos quais não precisam prestar contas nem ao poder público nem a seus associados – as entidades sindicais estão satisfeitas. Sindicatos, federações, confederações e centrais, patronais e trabalhistas, querem mais dinheiro do trabalhador e das empresas para continuar fazendo o que costumam fazer: remunerar regiamente seus dirigentes, assegurando-lhes adicionalmente presença destacada no ambiente social e no cenário político, investir em imóveis para auferir ainda mais renda e resistir com tenacidade à necessária modernização das relações de trabalho. Uma ou outra vez, atuam na defesa dos interesses daqueles que dizem representar. Afinal, em teoria eles existem para isso.
Com raras exceções, assim funcionam as entidades sindicais, sustentadas em sua grande maioria por transferências feitas pelo governo do dinheiro que corresponde a uma parte do salário dos trabalhadores – sindicalizados ou não – e do capital social das empresas.
No ano passado, essas entidades receberam R$ 3,4 bilhões. Levantamento feito pelo jornal Valor mostrou que aproximadamente 100 entre as mais de 10 mil entidades sindicais formalmente registradas no Ministério do Trabalho e Previdência Social – e, por isso, com direito a uma fatia do imposto sindical, cujo nome oficial é contribuição sindical – recebem valores superiores a R$ 3,6 milhões. Essa quantia corresponde ao limite de faturamento para que uma empresa seja considerada micro ou pequena e possa ser inscrita no regime tributário do Simples. Ou seja, uma centena de entidades sindicais obtém sem nenhum problema e sem necessidade de comprovar nenhuma atividade ou iniciativa, desde que registrada no Ministério do Trabalho, uma receita anual que a enquadraria no mínimo entre as empresas médias do País.
Está em exame por uma comissão especial da Câmara projeto que trata do financiamento das entidades sindicais. Um de seus pontos principais é a regulamentação da chamada contribuição negocial ou assistencial, aquela que a maioria dos sindicatos cobra sobre o resultado das negociações coletivas. O Ministério Público do Trabalho tem acionado sindicatos que utilizam essa contribuição, que chega a 20% do salário mensal, impedindo sua cobrança de toda a categoria profissional e limitando-a ao quadro de associados. O projeto estende a cobrança para toda a categoria, permitindo a recusa do pagamento apenas a trabalhador que tenha participado da assembleia que criou o novo imposto ou a ele se oponha no prazo de dez dias.
Não parece difícil que a comissão aprove o projeto, pois seu presidente é o deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), o Paulinho da Força, assim conhecido por ser o presidente da Força Sindical. O parlamentar tem acesso fácil ao Palácio do Planalto.
Do lado patronal, dirigentes de entidades como a Confederação Nacional do Comércio – a maioria dos quais está no cargo há décadas – consideram defasada a alíquota que incide sobre o capital das empresas e pedem a atualização da base de cálculo da contribuição dos empregadores.
Patronais ou profissionais, as entidades sindicais utilizam o dinheiro para sustentar viagens, salários e outras vantagens de seus dirigentes e, quando há sobra, aplicam na expansão de seu patrimônio imobiliário ou na construção de sedes suntuosas. Algumas utilizam seus recursos – que têm outras fontes, como rendas ditas sociais e extraordinárias, como informou uma delas – para confeccionar patos amarelos utilizados numa campanha contra a alta carga tributária com o título “Não vou pagar o pato”. E quem paga o pato da campanha e outros gastos de entidades como essa?
Com raras exceções, assim funcionam as entidades sindicais, sustentadas em sua grande maioria por transferências feitas pelo governo do dinheiro que corresponde a uma parte do salário dos trabalhadores – sindicalizados ou não – e do capital social das empresas.
No ano passado, essas entidades receberam R$ 3,4 bilhões. Levantamento feito pelo jornal Valor mostrou que aproximadamente 100 entre as mais de 10 mil entidades sindicais formalmente registradas no Ministério do Trabalho e Previdência Social – e, por isso, com direito a uma fatia do imposto sindical, cujo nome oficial é contribuição sindical – recebem valores superiores a R$ 3,6 milhões. Essa quantia corresponde ao limite de faturamento para que uma empresa seja considerada micro ou pequena e possa ser inscrita no regime tributário do Simples. Ou seja, uma centena de entidades sindicais obtém sem nenhum problema e sem necessidade de comprovar nenhuma atividade ou iniciativa, desde que registrada no Ministério do Trabalho, uma receita anual que a enquadraria no mínimo entre as empresas médias do País.
As principais centrais sindicais (CUT, Força Sindical e UGT) são as maiores beneficiárias desse sistema de transferência automática de dinheiro criado pelo Estado Novo varguista e que vem sendo modificado sempre em benefício das organizações sindicais.
Está em exame por uma comissão especial da Câmara projeto que trata do financiamento das entidades sindicais. Um de seus pontos principais é a regulamentação da chamada contribuição negocial ou assistencial, aquela que a maioria dos sindicatos cobra sobre o resultado das negociações coletivas. O Ministério Público do Trabalho tem acionado sindicatos que utilizam essa contribuição, que chega a 20% do salário mensal, impedindo sua cobrança de toda a categoria profissional e limitando-a ao quadro de associados. O projeto estende a cobrança para toda a categoria, permitindo a recusa do pagamento apenas a trabalhador que tenha participado da assembleia que criou o novo imposto ou a ele se oponha no prazo de dez dias.
Não parece difícil que a comissão aprove o projeto, pois seu presidente é o deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), o Paulinho da Força, assim conhecido por ser o presidente da Força Sindical. O parlamentar tem acesso fácil ao Palácio do Planalto.
Do lado patronal, dirigentes de entidades como a Confederação Nacional do Comércio – a maioria dos quais está no cargo há décadas – consideram defasada a alíquota que incide sobre o capital das empresas e pedem a atualização da base de cálculo da contribuição dos empregadores.
Patronais ou profissionais, as entidades sindicais utilizam o dinheiro para sustentar viagens, salários e outras vantagens de seus dirigentes e, quando há sobra, aplicam na expansão de seu patrimônio imobiliário ou na construção de sedes suntuosas. Algumas utilizam seus recursos – que têm outras fontes, como rendas ditas sociais e extraordinárias, como informou uma delas – para confeccionar patos amarelos utilizados numa campanha contra a alta carga tributária com o título “Não vou pagar o pato”. E quem paga o pato da campanha e outros gastos de entidades como essa?
Realidades virtuais
A realidade diária anda dura e dolorosa demais no mundo inteiro. Menos nos países com maior Índice de Progresso Social (IPS), que mede não só o PIB e dados econômicos, mas também outros 47 indicadores de bem-estar social, qualidade de vida e oportunidades. Finlândia, Dinamarca, Noruega, Suécia, os suspeitos de sempre, lideram as tais “sociedades mais justas e solidárias” de que os políticos tanto falam.
Mas, pelo que se sabe e se vê, a realidade nesses paraísos sociais contemporâneos é virtualmente um império do tédio e da rotina, vivendo sete meses por ano sob um inverno infernal, com o sol se pondo às 2 da tarde. Quem sabe agora tentem medir o IFH, o Índice de Felicidade Humana, que é o que mais importa.
Entre 133 países, o Brasil está em 42º lugar, mas é o melhor colocado do Brics. Na América Latina, ficamos atrás de Uruguai, Chile e Argentina. Países desenvolvidos como Estados Unidos, Itália, Espanha, mas com grandes desigualdades, estão por volta do G20.
Estava pensando sobre essas coisas quando um amigo me trouxe uns óculos-fones de “realidade virtual” e logo me vi no meio do espaço sideral, como se estivesse dentro de um pequeno asteroide, vendo a Terra de longe, sentindo vertigens de olhar para baixo, ou para os lados, ou para cima, na imensidão do espaço, com cometas e asteroides passando.
Ao contrário do 3D, em que a cena sai para cima do espectador, na RV é você que se coloca no centro da ação, com visão de 360 graus, a meio metro do piano de Paul McCartney, no centro do palco, no meio da música, vendo os músicos, a plateia e o backstage à sua volta. Ou assistindo a um jogo de futebol do mesmo ponto de vista dos jogadores, como se estivesse entre eles, na beira do gramado, atrás do gol ou na melhor cadeira.
Bilhões de dólares estão sendo investidos no desenvolvimento dessa tecnologia, um caminho sem volta que já está gerando farta produção de games, comédias, dramas, terror, esportes, natureza, cirurgias, publicidade, clips musicais e, naturalmente, pornô.
Nada melhor para escapar, pelo menos por um tempo, da realidade inescapável de nosso tempo, sem sair de casa.
Nelson Motta
Mas, pelo que se sabe e se vê, a realidade nesses paraísos sociais contemporâneos é virtualmente um império do tédio e da rotina, vivendo sete meses por ano sob um inverno infernal, com o sol se pondo às 2 da tarde. Quem sabe agora tentem medir o IFH, o Índice de Felicidade Humana, que é o que mais importa.
Entre 133 países, o Brasil está em 42º lugar, mas é o melhor colocado do Brics. Na América Latina, ficamos atrás de Uruguai, Chile e Argentina. Países desenvolvidos como Estados Unidos, Itália, Espanha, mas com grandes desigualdades, estão por volta do G20.
Estava pensando sobre essas coisas quando um amigo me trouxe uns óculos-fones de “realidade virtual” e logo me vi no meio do espaço sideral, como se estivesse dentro de um pequeno asteroide, vendo a Terra de longe, sentindo vertigens de olhar para baixo, ou para os lados, ou para cima, na imensidão do espaço, com cometas e asteroides passando.
Ao contrário do 3D, em que a cena sai para cima do espectador, na RV é você que se coloca no centro da ação, com visão de 360 graus, a meio metro do piano de Paul McCartney, no centro do palco, no meio da música, vendo os músicos, a plateia e o backstage à sua volta. Ou assistindo a um jogo de futebol do mesmo ponto de vista dos jogadores, como se estivesse entre eles, na beira do gramado, atrás do gol ou na melhor cadeira.
Bilhões de dólares estão sendo investidos no desenvolvimento dessa tecnologia, um caminho sem volta que já está gerando farta produção de games, comédias, dramas, terror, esportes, natureza, cirurgias, publicidade, clips musicais e, naturalmente, pornô.
Nada melhor para escapar, pelo menos por um tempo, da realidade inescapável de nosso tempo, sem sair de casa.
Nelson Motta
Por que Lula foi à ONU contra a Justiça brasileira
Ou Lula acha que vive numa republiqueta de banana onde a Justiça não passa de uma farsa, ou então seu medo de ser preso e condenado é tão grande, sua situação é tão desesperadora que ele perdeu a completa noção do ridículo, se é que a teve algum dia.
Há uma terceira alternativa e uma quarta que podem explicar o gesto de Lula de pedir socorro ao Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). A terceira: ele quer constranger a Justiça brasileira. A quarta: ele prepara sua fuga.
Lula sabe que não vive numa republiqueta de banana. Presidiu-a por oito anos, fez sua sucessora e a reelegeu. As leis de que se valeu para isso continuam em vigor. Por desrespeitar algumas, ele pode acabar preso. Por desrespeitar outras, Dilma foi afastada.
O Natal não mudou. Lula foi que mudou. Elegeu-se pela primeira vez depois de denunciar a existência de 300 picaretas no Congresso. Governou com eles. Estimulou o seu apetite. No mínimo, fez vistas grossas à corrupção. Deu no que deu.
Imaginou voltar à presidência da República depois de um intervalo de quatro anos. Ao ver-se acuado pela Lava-Jato, empenhou-se em obstruir a Justiça. Disso são provas cabais várias de suas conversas grampeadas. Não deu certo.
É remota a possibilidade de que a Justiça, agora, se atemorize com as suas manobras. Como é remota a possibilidade de a ONU, por falta de cabimento, socorrê-lo metendo-se em assuntos internos de um país soberano e democrata.
Lula tenta preparar o caminho de sua fuga. Se preso e condenado, quer passar de um reles criminoso a perseguido político. Caso não suporte viver anos atrás das grades, poderá pedir asilo a algum país. Sempre haverá um disposto a acolhê-lo.
Há uma terceira alternativa e uma quarta que podem explicar o gesto de Lula de pedir socorro ao Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). A terceira: ele quer constranger a Justiça brasileira. A quarta: ele prepara sua fuga.
Lula sabe que não vive numa republiqueta de banana. Presidiu-a por oito anos, fez sua sucessora e a reelegeu. As leis de que se valeu para isso continuam em vigor. Por desrespeitar algumas, ele pode acabar preso. Por desrespeitar outras, Dilma foi afastada.
Imaginou voltar à presidência da República depois de um intervalo de quatro anos. Ao ver-se acuado pela Lava-Jato, empenhou-se em obstruir a Justiça. Disso são provas cabais várias de suas conversas grampeadas. Não deu certo.
É remota a possibilidade de que a Justiça, agora, se atemorize com as suas manobras. Como é remota a possibilidade de a ONU, por falta de cabimento, socorrê-lo metendo-se em assuntos internos de um país soberano e democrata.
Lula tenta preparar o caminho de sua fuga. Se preso e condenado, quer passar de um reles criminoso a perseguido político. Caso não suporte viver anos atrás das grades, poderá pedir asilo a algum país. Sempre haverá um disposto a acolhê-lo.
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