sexta-feira, 17 de junho de 2016

Apocalipse tropical

Quando era criança nos anos 50, aterrorizado pelos livros de ficção científica, pelas profecias de Nostradamus e pelas ameaças de dois apocalipses, um nuclear, da Guerra Fria, e outro da Bíblia e dos padres do colégio, eu morria de medo do “fim do mundo”. Mas meu pai ria e me dizia que, se todo mundo tem que morrer mesmo, era melhor que fosse todo mundo junto, testemunhando um fabuloso espetáculo de destruição e de fúria da natureza, de grandiosidade única: para ele, seria até um privilégio.

Falando assim, parecia mesmo mais interessante do que um tiro, uma cama de hospital ou uma doença dolorosa, embora na época eu acreditasse que nós dois viveríamos para sempre.

Ao longo de outras décadas, aflito e apavorado com o golpe militar, a crise do petróleo, a crise da dívida externa, a rebordosa do Plano Cruzado, a moratória de Sarney, o confisco do Plano Collor, meu pai me tranquilizava dizendo que o Brasil não ia acabar, e me mandava trabalhar.

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Agora que se anuncia um apocalipse político no Brasil, me lembro dele, que certamente adoraria assistir. São centenas de parlamentares, de todos os partidos, empresários, funcionários, roubando para fraudar eleições e para enriquecer. E ainda nem começou a devassa no Dnit, em Furnas, na Eletrobras, que, diz o delator Sérgio Machado, são muito mais corruptas e vulneráveis do que a Petrobras. E ainda não se sabe nada da delação de Marcelo Odebrecht e, quem sabe, de Eduardo Cunha.

No ponto em que estamos, nem novas eleições presidenciais são suficientes. Só eleições gerais, para a Câmara e o Senado, podem dar alguma esperança de saneamento e renovação, como uma Constituinte para as reformas políticas que precisamos. Mas não com esses que estão aí, que usam o mandato para atrapalhar a Lava-Jato e para manter os seus privilégios, delinquências e impunidades. Eles não vão se suicidar pelo Brasil.

Sim, a culpa é do sistema político perverso — e de todos que se aproveitaram dele — e, por isso mesmo, são incapazes de reformá-lo. Não é mais questão de esquerda ou direita, mas de certo ou errado. Talvez depois de um apocalipse possa nascer um novo mundo.

Nelson Motta

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