E isso para mim chegou no limite, tá ok? Não tem mais conversa. Acabou a paciência. Não negociamos com sequestradores da compaixão e da cordialidade brasileiras. Cale a boca, pelo amor de Deus, o senhor aí na rampa, tresloucado em mangas de camisa, porque eu não perguntei nada. Assim o senhor se dirigiu a jornalistas - mas no imperativo, várias vezes. Cala a boca! Cala a boca! De que adianta, depois, sob pressão, se desculpar por mais uma "grosseria" entre tantas? Patifaria! Canalhice!
As Forças Armadas estão mesmo do seu lado? Desconfie. Os militares apoiam que o senhor insufle seguidores a agredir jornalistas, profissionais da saúde e fiscais do Ibama? Os generais não são estúpidos assim. Eles lembram bem que o capitão foi expulso do Exército por indisciplina, anarquia e planos incendiários.
O respeito à hierarquia e ao chefe do Executivo vai até um limite: o da desonra à vida. A Constituição será cumprida, Bolsonaro, a qualquer preço, e esse preço será mais alto do que o pago ao Centrão em troca de apoio. Lei e ordem não estão sendo respeitadas no Brasil. A incitação à violência vem de cima. Pior ainda, essa sublevação ocorre num país que já perdeu, no momento em que escrevo, mais de 8 mil brasileiros para a “gripezinha”. E daí?
Nossa curva acentuada de óbitos parece um foguete desgovernado. E isso se deve ao desrespeito a todos os alertas de infectologistas e pneumologistas, ao menosprezo à ciência. E a um líder populista, caricato e vil. A cada domingo, a rampa do Planalto serve a mais uma performance de desobediência civil. Que no Dia das Mães as bolsonaristas pensem em primeiro lugar na vida de seus filhos. Não se inspirem no guru que leva a filha sem máscara para aglomerações.
O povo não está com Bolsonaro. Está amedrontado. Sem água ou casa digna. Em filas por R$ 600. O povo quer comida, leitos, remédios, médicos e respiradores para seus parentes. O povo é conduzido à morte pelo fanfarrão. Bolsonaro cria crises, ignora o vírus e coloca a economia contra a vida. Aposta na ignorância. Até quando essa insensatez não será punida como um crime contra a humanidade? Qual o número aceitável de mortos antes de outros poderes intervirem? A lealdade é ao chefe direto ou à nação?
O Brasil pode se tornar o recordista mundial de subnotificações, contágios e mortes. Não respeitou o isolamento horizontal como deveria – e sabemos o porquê. Mudar o comando da Saúde, por vaidade e disputa política, foi trágico. As previsões são apocalípticas. "Os mortos 'batem à nossa porta', enchem cemitérios, câmaras mortuárias e IMLs", disse ao GLOBO o infectologista Rafael Galliez. "Não há resposta de Estado que priorize a vida". Após tanto tempo perdido, até o novo ministro da Saúde, Nelson Teich, aquele que só se expressa no futuro, já recomendou lockdown, o bloqueio total, em estados mais atingidos. Não diz claramente onde e quando. Papelão.
Diante da morte de artistas que ajudaram a construir nosso patrimônio cultural, não ouvimos nenhuma palavra federal, nem mesmo de Regina Duarte. Vergonha. O ator Lima Duarte falou pelo Brasil, em vídeo para Flávio Migliaccio, que se despediu desiludido da vida. Aos 90 anos, com a lucidez e emoção que faltam ao governo, referiu-se à fala de seu personagem em peça de Bertolt Brecht no Teatro de Arena: “Os que lavam as mãos, o fazem numa bacia de sangue”. É o silêncio dos culpados. Não podemos nos calar.
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