Tenho, porém, dificuldade em acreditar que o presidente apoie - para valer - a iniciativa. É inconsistente com a mentalidade bolsonarista e com o histórico partidário de Jair Bolsonaro; daí por que seja bem mais provável, segundo avalio, que ele autorize a ventilação da hipótese como ameaça e, óbvio, como parte fundamental da estratégia de desqualificação da ideia de partido.
A lógica do bolsonarismo, força autocrática e personalista, é a de depreciar e esvaziar o valor de toda e qualquer forma de mediação, de representação. Partido é a máxima expressão da atividade política, da impessoalidade e da concertação entre agentes, que se manifesta - por excelência - no exercício parlamentar. Não e à toa, diga-se, que o bolsonarismo ataca o Congresso. A impessoalidade e a desconcetração decisória são riscos ao propósito populista.
De resto, objetivamente, organizar um partido novo, agora, seria complicar, arriscar mesmo, o projeto de poder bolsonarista - que precisa (incontornavelmente) eleger braços municipais fortes - para as eleições de 2020; que pode se servir bem daquilo já montado, inclusive em termos financeiros, no PSL.
Mais provável é, pois, que Bolsonaro e corte fiquem; ao menos até o fim do ano que vem. Não há dúvida de que examina alternativas. O presidente, contudo, já conseguiu o que pretendia: rebaixou o próprio partido; que é, também, investimento no rebaixamento da democracia representativa. E colocou sua insatisfação na mesma sintonia de sempre, uma das frequência de sua eleição: o da - falsa - indignação com desvios e falta de clareza na gestão dos fundos partidários pela direção do PSL; isto sem falar na podridão que ainda se pode cheirar desde o laranjal de Marcelo Alvaro Antonio. Tem método. Bolsonaro faz isso. Está sempre se limpando. Sempre criando condições para se cercar de descartáveis.
Por essa exata razão é que não se pode desconsiderar a chance de uma eventual mudança de partido; mas para outro entre esses de aluguel.
Cabe registrar, adicionalmente, que parte influente do bolsonarismo prega por uma reforma eleitoral que admita candidaturas avulsas - conforme há em algumas democracias do mundo. Gente muito boa, fora do bolsonarismo, também defende essa tese. Sou contra. No Brasil, radicalmente contra. Candidatura avulsa, neste país, com o histórico de líderes carismáticos que temos, seria erro grave: o estabelecimento mesmo do chão para o reino do populismo, do personalismo, do messianismo, em detrimento do equilíbrio próprio à cultura da representação e da mediação política. Cuidado.
Finalmente, a partir de um exemplo típico da gramática bolsonarista, proponho aqui uma breve reflexão sobre a linguagem influente do bolsonarismo. Ontem, em entrevista - sobre esse imbróglio partidário - ao site O Antagonista, o presidente afirmou que não sairia do PSL por "livre e espontânea vontade" e que não queria "entrar nessa briga".
Note, leitor, o grau de manipulação discursiva para o objetivo de inverter a ordem dos fatos e se vitimizar. O presidente faz isso diariamente. Age como se não fosse ele, Jair Bolsonaro, o gerador - a própria origem - da crise; como se não tivesse sido ele a pedir que se esquecesse o PSL e a se referir ao dono do partido como "queimado".
>Isto é o bolsonarismo: uma fábrica de conflitos artificiais. No caso, com efeito, para diminuir o PSL, situar - reforçar a ideia de - o partido como mais um no meio de um sistema corrupto, e se destacar novamente como aquele de fora, puro, que nada tem a ver com isso e aponta os erros. Ele fica; o partido mingua mais um pouco; e ainda joga fumaça sobre as denúncias contra o ministro do Turismo do qual - dono do PSL em Minas - não abre mão.
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