Na educação já se pode falar na ditadura que há, mas a aposta continua sendo de que tudo se resolva com a adoção de mais uma “política pública” elaborada por um par de “especialistas” que valerá para todo este quase continente... exatamente a distorção que criou a condição para a instalação da ditadura que se quer combater. A centralização é sempre o prelúdio do aparelhamento gramsciano. Os saxônicos vão, como sempre, de descentralização e democracia, com cada bairro elegendo entre pais de alunos o board da sua respectiva escola pública encarregado de contratar e cobrar resultado dos professores que melhor se adequarem às necessidades de seus filhos de modo a fazer, em cada cantinho do país e todos os dias um pouquinho, “a verdadeira revolução que abrange e chacoalha de alto abaixo o sistema em seus aspectos organizacionais e pedagógicos” com que sonham confusamente que lhes caia do céu os latinos.
A própria ideia de “debate” entre os latinos pressupõe uma disputa em que um lado ganha e o outro perde. Nada que ver com a ideia de convivência entre contrários que tem como corolário a de tolerância eventualmente elevada a valor inegociável, fazendo tudo desaguar na democracia vista como manual de navegação, e não como local precisamente identificado de destino.
Ainda havemos de chegar lá...
E na seara de Sergio Moro, teremos um Ministério da Segurança Pública ou um Ministério da Justiça? O plano do ex-juiz é inequívoco. Incrementar a integração da Polícia Federal, com o Ministério Público Federal e unidades de inteligência financeira, em especial o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), para verificar o uso dos valores por organizações criminosas. Funciona, não há dúvida nenhuma. E como é de salvar vidas que estamos falando, não há como não comemorar.
Mas ainda é das pessoas e não do “sistema” que se trata. Este está mais amarrado ao conceito de justiça. Mas o que são os órgãos do Poder Judiciário hoje? Esse STF que cuida de trocar aumentos de salário por penduricalhos? São quase sindicatos; instrumentos de criação e “petrificação” de privilégios corporativos. Quem ou o que há por cima deles disposto a discipliná-los?
Jair Bolsonaro é que não é. Agora já são seis os militares no Ministério. Uma parte disso nos fala, digamos, da falta de diversidade da rede de relacionamentos do presidente eleito. E desde a nomeação de Carlos Alberto dos Santos Cruz, o general que a ONU encarregou de acabar com as guerrilhas do Congo, para a Secretaria de Governo, a outra instância da coordenação política com partidos e “bancadas”, uma dúvida, ao menos, se desfez. O presidente parece ter sentido a necessidade de instalar ouvidos menos sedados nesse departamento. Agora quem quiser que faça àquele arquétipo do “homem cordial” brasileiro as suas propostas indecentes.
Bom sinal. Mas sem grandes ilusões. O presidente eleito queimou seus navios ao pôr Sergio Moro onde está e agora está queimando pontes à medida que avança. É uma faca de dois gumes. Os militares não são a “reserva moral da Nação” porque sejam feitos de material diferente de nós, mas porque se têm mantido há 33 anos à distância dos focos mais notórios de contaminação. Aqueles entre eles que os tocaram não saíram incólumes, como é o caso seja dos que cederam à tentação na curta temporada da missão de combate direto ao crime organizado, seja dos que se mantiveram em funções por onde transitava muito dinheiro, como é o caso dos mais graduados até entre os feitos ministros que chegaram a ganhar menções em ações da Lava Jato. Alto lá, portanto, com esse negócio de querê-los “governando por 20 anos”.
Mas esses são só os casos extremos. Os militares mantiveram-se longe do poder, mas não tão longe quanto o resto do povo brasileiro. Menos que o Judiciário e que os políticos, mas mais que o que seria saudável. Como vamos confirmando pela persistência desse silêncio, as corporações militares também aprenderam a gostar dos direitos que “adquiriram”. Mas nem a obscenidade dos exageros da ponta de cima, que eles reconhecem e, menos vocalmente do que o caso pede, repudiam, suplanta a consciência de que o barco em que vão eles todos é o mesmo.
Estão certíssimos. Esse é mais um departamento onde não existe meia gravidez. Ou há igualdade perante a lei ou há privilégio. Como, portanto, não há solução fora da fórmula de Temer, que, na velocidade que for, e com as ressalvas que a razão admite, termina na igualdade entre nobres e plebeus, esse silêncio quanto a qual é a reforma da Previdência de Jair Bolsonaro se torna mais atroador a cada minuto que passa. Tão atroador quanto o dos jornalistas com raízes fincadas no mesmo maná “através de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive”, conforme reza a lei, que nos querem fazer crer que só o que falta ao Brasil é coibir a apropriação do “troco” que representa o que a “privilegiatura” nos toma por fora da lei que a estabeleceu como casta merecedora de mais, muito mais do que nós mortais merecemos.
O silêncio de Paulo Guedes e equipe a esse respeito é imposto, mas não pode mais ser admitido. Ele manteve da equipe de Temer os mais vocais entre os arautos da dimensão telúrica da explosão que vem vindo não por acaso. Mas todos estão, agora, igualmente reduzidos ao silêncio. A realidade obrigará Jair Bolsonaro a rompê-lo, mas a um custo impensável se ele o arrastar até depois do terremoto. A fábrica de misérias do Brasil continua aberta, e mais um pouco que demore o anúncio da data do cumprimento da sua sentença de morte e o mercado começa a trazer a valor presente o desastre que estão tentando tapar com uma peneira.
É hora de pôr as cartas na mesa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário