Na prática, a existência do chamado "foro privilegiado" para os políticos com mandato adia o risco de punições. E, em muitos casos, evitará que investigados na Lava Jato sejam enquadrados pela Lei de Ficha Limpa, o que poderia excluí-los das eleições deste ano - a norma impede que condenados na segunda instância por certos crimes sejam candidatos.
Outro exemplo é Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ex-presidente da Câmara, hoje preso em Curitiba. Sem mandato, ele já foi condenado em segunda instância e, na teoria, teria pretensões de disputar as eleições frustradas, caso a tivesse.
Já no STF, a maior parte dos processos da Lava Jato ainda está no começo, e provavelmente não será concluída em 2018. É o caso das denúncias contra políticos da cúpula do PT, do PP e do PMDB, consideradas algumas das mais importantes da operação: as denúncias só foram apresentadas pelo então procurador-geral, Rodrigo Janot, em setembro passado.
O mesmo se dá com os 74 inquéritos que foram abertos em abril passado, decorrentes da delação da Odebrecht. Janot não teve tempo de apresentar nenhuma denúncia nesses casos antes de deixar o cargo. A sucessora dele, Raquel Dodge, tampouco apresentou alguma até agora.
Do acervo de mais de uma centena de inquéritos relacionados à Lava Jato no STF, só 35 tiveram denúncias apresentadas até o momento. E, destas, apenas nove foram aceitas e se tornaram ações penais, o que significa que os políticos acusados são, formalmente, réus. As informações são da Procuradoria-Geral da República, e foram confirmadas pela reportagem da BBC Brasil em um levantamento no sistema eletrônico do STF.
O destino das investigações da Lava Jato no Supremo não é, por enquanto, muito diferente da maioria dos processos criminais de políticos com foro privilegiado naquele tribunal.
O que explica nosso fascínio com Frankenstein, 200 anos após sua criação?
Em meados do ano passado, uma equipe de pesquisadores da FGV Direito Rio publicou um estudo (leia aqui) mostrando que só 0,6% dos crimes de políticos apurados no STF resultaram em condenação. E, em cerca de dois terços dos casos (65%), os processos nem sequer chegaram a ser julgados: os supostos crimes prescreveram antes, ou (o que é mais comum) a questão deixou de ser da alçada do Supremo quando os políticos envolvidos deixaram os cargos.
Um dos autores do estudo, o professor da FGV Direito Rio Ivar Hartmann, disse à BBC Brasil que é "provável" que a corte não conclua os principais casos da Lava Jato em 2018. "Esta previsão é amparada no tempo médio da tramitação dos casos penais no STF", diz ele. Os processos julgados em 2016, por exemplo, estavam "na fila" durante uma média de 1.377 dias (ou 3,7 anos), segundo a pesquisa da FGV.
A possibilidade de prescrição dos crimes também pode favorecer os investigados. No caixa dois, por exemplo, esse prazo é de 12 anos. Nos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, 16 anos. Se o acusado tiver mais de 70 anos, o tempo cai pela metade.
Embora o prazo seja relativamente longo, muitas vezes as apurações só começam décadas depois: é o que aconteceu na delação do empresário Emílio Odebrecht, da empreiteira de mesmo nome. Ele narrou pagamentos a políticos ainda na década de 1990, mas os casos dificilmente resultarão em punições.
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