terça-feira, 10 de janeiro de 2017

Efeito tequila à vista

Falências disparando, vendas caindo e empregos sumindo – mas não para todos. Três instituições prosperam e se multiplicam na crise: partidos políticos, igrejas e, agora, facções criminosas. Cada uma no seu nicho de mercado e com estratégias distintas, mas usufruindo do sucesso que escapa a governos e empresas. Em comum, mantêm uma relação especial com o estado. Embora mantenham contabilidade detalhada, nenhuma recolhe impostos.

Há 35 partidos registrados oficialmente, e outros 50 na fila para ganharem acesso a lugar na urna eletrônica, ao horário de propaganda no rádio e TV e, mais importante, ao Fundo Partidário. O Congresso está tentando diminuir a concorrência – afinal, há que repartir tempo e dinheiro com os novatos -, mas, como mostraram os repórteres Mariana Diegas e Valmar Hupsel Filho, isso não intimidou os candidatos a cacique partidário.


Todos disseram não estar nem aí para a cláusula de barreira que os grandes partidos lhes querem impor. Seguem tentando lograr seu registro e, assim, usufruir da isenção fiscal e – entre outros benefícios – acesso à listagem com nome e dados pessoais de todos os eleitores brasileiros. Sim, inclusive os seus.

Partidos vendem esperança de uma vida melhor – quando não para todos, ao menos para seus filiados. Se não der para transformar a sociedade, que transforme a vida dos caciques e viabilize algum benefício para os seus chegados – um cargo público, talvez. Acenar com a prosperidade e uma virada na vida também é o atrativo de outra instituição em alta, com ou sem crise.

Pesquisa recente do Datafolha reconfirmou que igrejas evangélicas pentecostais e neopentecostais são as mais bem sucedidas na conquista de novos fiéis. Em duas décadas, duplicaram sua participação no mercado religioso. De 10% dos brasileiros em 1994 arrebanharam 22% em 2014 – e mantêm essa fatia desde então. Assim como os partidos, uma característica fundamental das igrejas emergentes é a sua pulverização.

Embora as denominações mais populares reúnam milhões de fiéis, outras dezenas de milhões de pessoas se definem genericamente como “evangélicos” ou pertencentes a um de centenas de grupos neopentecostais que, isoladamente, são pequenos demais para aparecerem nas tabelas do IBGE – mas, em conjunto, estão cada vez mais presentes no dia-a-dia da população.

Seu crescimento denota a incapacidade do estado e do mercado de oferecerem a um segmento populacional tão expressivo oportunidades suficientes de ascensão social e econômica. O dízimo promete suprir aquilo que os impostos não cobrem.

Nos últimos anos, explorando o crescimento das franjas mais marginalizadas do sistema, o crime se organizou a partir dos presídios. Segundo o repórter Alexandre Hisayasu, são pelo menos 27 facções que orbitam e guerreiam em torno das duas principais: o PCC e o Comando Vermelho. Também cobram mensalidade dos associados (em troca de “proteção”), movimentam centenas de milhões de reais por ano e buscam monopólio, do narcotráfico.

A resposta dos governos estaduais e federal foi complacente. Crime organizado derruba taxas de homicídio – porque inibe disputas paroquiais entre bandidos -, até irromper em massacres, como os de policiais em 2006 e os de detentos em 2016. Nessas crises, a complacência vira incapacidade. Mesmo sabendo que matanças viriam, as autoridades não conseguiram evitá-las.

É esperado que, em suas trajetórias emergentes, as facções criminosas e a política partidária se cruzem – como já se cruzaram denominações religiosas e partidos. Para antever no que isso vai dar, basta olhar para outros países latino-americanos.

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