No Flamengo vai ser inaugurada uma nova piscina. Os norte-americanos vão treinar aqui. A primeira consequência da medida é a retirada dos gatos. Eles sempre viveram nas proximidades da piscina. Houve um momento em que a arquibancada era frequentada por um gambá, que fotografei algumas vezes e era um belo animal. Não sei se os americanos não querem os gatos ou se a própria direção do Flamengo aproveitou o pretexto para expulsá-los. Mas não são os pequenos dissabores cotidianos que me preocupam como atleta amador. É todo o enfoque da política brasileira voltada para os grandes eventos e provas de alta performance.
No mês em que a Olimpíada começa foi fechada a Vila Olímpica do Complexo do Alemão, chamada Carlos Castilho em homenagem ao fantástico goleiro do FLU. Existe sempre uma tensão na política de esportes entre as tendências de fazer muitos espectadores ou muitos praticantes do esporte. Não são, necessariamente, contraditórias. Mas a ênfase no momento está no atletismo de grande performance, no espetáculo. Na Zona Norte do Rio quase não há piscinas em que a garotada possa aprender a nadar. Numa cidade como o Rio, os esportes aquáticos como natação, water polo, surfe têm um enorme potencial de crescimento.
A ênfase num espetáculo grandioso como a Olimpíada, num país de cobertor curto como o nosso, significa, de certa maneira, sacrificar o investimento no esporte amador, em sintonia com as escolas. A Olimpíada custa e, conforme se propaga, deixará legados. Mas o que significa um velódromo para os moradores da Zona Oeste que, diariamente, são obrigados a desbravar uma ciclovia cheia de buracos, postes e lixo? Os custos dos Jogos não se limitam aos investimentos feitos pelo governo. Eles se estendem também a uma extensa rede de isenções de impostos, a mesma tática que o governo PT-PMDB usou para a indústria automobilística. Recentemente, a cidade inaugurou um campo de golfe na Barra da Tijuca. Havia outros no Rio, mas não estavam dentro dos padrões do COI. O próprio Ministério Público já denunciou a obra como ambientalmente incorreta. Logo depois disso, vi uma entrevista de Eduardo Paes, lamentando que os grandes jogadores de golfe não queiram participar da Olimpíada do Rio. O campo foi construído para eles e terá um papel secundário nos jogos.
Nada contra o golfe. Na verdade, quem tem algo contra o golfe são os próprios políticos brasileiros que lutaram pela Olimpíada no Rio. Lembro-me do diálogo de um garoto que morava na comunidade Nelson Mandela com Lula e Cabral. Foi gravado e difundido na internet. Num momento do diálogo, o garoto fala em seu desejo de aprender tênis. Lula responde agressivamente: mas tênis é esporte burguês. Aproveitei a oportunidade, na época, para mostrar o campo de golfe de Japeri, na Baixada Fluminense. Ali há um programa de ensino para garotos da região. Um deles tornou-se campeão nacional. Isso não é o mais importante. O fato é que todos os outros podem treinar, diariamente, e travar contato com um esporte que desenvolve seu potencial humano como qualquer outra modalidade. Concordo com a colunista do “Post” quando afirma que o COI se move com a perspectiva do lucro. Mas e os políticos, se movem com que perspectiva?
Uma delas sem dúvida é a aspiração de glória e poder. Naquele rápido e espontâneo diálogo com o garoto da Mandela, Lula e Cabral revelaram não apenas preconceitos, mas também como são débeis seus vínculos com uma política de democratização da prática esportiva. Continuo desejando que a Olimpíada seja um êxito, embora a simples normalidade já baste. A esperança é de que os políticos que vão surgir, disputando a modalidade voto direto, reflitam melhor entre produzir espectadores ou produzir atores no cenário esportivo.
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