Não sei, com certeza, o que esse gaúcho de Santa Maria obteve de positivo, até este instante, em seu duro trabalho. Sei que tem trabalhado muito. Para se ter uma ideia, de acordo com o último Censo, de 2010 (o Censo só se faz de dez em dez anos), são 1.393.314 pessoas, distribuídas em 763 favelas. Reside, nessas comunidades, 22% da população. Esse percentual, claro, cresceu de 2010 para cá.
Quando degustávamos o café da manhã, numa das conhecidas padarias do Leblon, por volta das 8h, minha mulher me chamou a atenção para a chegada ao local desse homem de bem. Como o tenho acompanhado pela imprensa escrita, falada e televisada, não resisti ao impulso, e fomos – os dois – a seu encontro. Ao nos aproximarmos de sua mesa (estava ao lado da mulher), vimos a expressão de alguém fatigado e abatido. O abatimento, especialmente naquele dia, se devia ao triste episódio ocorrido na véspera, no Hospital Souza Aguiar, quando o traficante Fat Family foi resgatado por 23 de seus muitos comparsas.
Feitas as respectivas apresentações, disse-lhe que eu e minha mulher estávamos ali porque o reconhecimento anônimo pelos serviços prestados é, sem dúvida, o melhor pagamento que deve esperar um servidor público que cumpre seu dever. E ele é um deles. Beltrame agradeceu os elogios, mas nos disse, em seguida, que se sente sozinho na tarefa hercúlea que assumiu. E, simultaneamente, sinalizando com uma das mãos, deu-nos a entender que estava prestes “a dar o fora”. A imprensa, depois, confirmou que ele ficará até o fim das Olimpíadas.
Beltrame me fez lembrar o alerta que contém a frase “o cansaço dos bons”, usada por muita gente importante. Uma delas: Martin Luther King, que dizia que o que mais o incomodava era o “silêncio dos bons”. Mais recentemente, o psiquiatra argentino Roberto Almada adotou-a como título de um de seus livros, que trata do desgaste profissional e emocional do ser humano. Segundo ele, para o bem da humanidade, o grande desafio é impedir que os bons se cansem.
Estamos outra vez, hoje, diante desse desafio, quando o noticiário sobre o envolvimento de agentes públicos e empresários na corrupção conseguiu superar aquele que trata da violência no trânsito ou no tráfico. Só no Rio, por exemplo, um motorista é roubado a cada três minutos. Sobre o que ocorre no tráfico, o jornalista inglês Misha Glenny, que residiu na favela da Rocinha por três meses, retirou de lá elementos para escrever o livro “O Dono do Morro”, sobre o traficante Nem. Misha afirma que viu o mesmo acontecer no Leste Europeu, quando da queda do comunismo: “Quando o Estado é fraco, o crime organizado avança”.
O prefeito Eduardo Paes, mais boquirroto que gestor, em sua diatribe contra o governo que ajudou a eleger, concordou com Misha Glenny quando este, em entrevista a Mário Sérgio Conti, disse que não teme atentados nas Olimpíadas. Os chefes do tráfico contarão com um bom mercado… O problema é o “após” (expressão do inglês Misha), quando a crise política e econômica mostrar, enfim, sua cara. Será terrível!
Nenhum comentário:
Postar um comentário