O foro especial não é uma invenção tupiniquim. Existe em vários lugares do mundo. Mas quase sempre limitado a um tipo de processo – normalmente correlato à função exercida pelo beneficiado, portanto administrativo. “O Brasil é um dos países que mais tem pessoas com prerrogativa de foro, só se compara à Venezuela e à Espanha, mas lá o foro é apenas para os crimes funcionais”, assegura o procurador da Lava-Jato Diogo Castor de Mattos.
Sendo assim, ainda que o Supremo Tribunal Federal tivesse disposição e dias de 80 horas, seria preciso muito fôlego dos 11 ministros para dar conta de um contingente desse tamanho. Só pela agenda sufocada dos ministros, o réu ou investigado ganha tempo – muito tempo - quando o processo fica no âmbito do STF, desejo máximo da unanimidade dos advogados de defesa.
No caso da Lava-Jato, a quantidade de procedimentos do Supremo impressiona. De acordo com o hotsite criado pelo Ministério Público Federal para informar sobre a operação, em pouco mais de dois anos o STF já autorizou 139 investigações, instaurou 59 inquéritos, com 38 investigados.
Mas o fato é que, à exceção do ex-senador Delcídio do Amaral – preso em flagrante não por roubar, mas por interferir nas investigações –, nem julgamento nem punição chegaram aos políticos que detêm mandato.
Em 2007, ano em que o STF acatou a denúncia dos 40 envolvidos no Mensalão, o ministro Celso de Mello fez defesa contundente do fim do foro de elite. “Minha proposta é um pouco radical: a supressão pura e simples de todas as hipóteses constitucionais de prerrogativa de foro em matéria criminal”, disse ao jornal Folha de S. Paulo. Como a suspensão do privilégio depende de aprovação congressual, sugeriu que a Corte avançasse, pelo menos, em limitar a abrangência dos crimes.
Nada aconteceu. Nem no STF, nem no Congresso, onde dezenas de propostas sobre o tema tramitam, algumas delas há mais de uma década. Duas semanas atrás, no bojo da cobrança do MPF em torno da emenda popular sobre as 10 medidas contra a corrupção, uma delas, a PEC 470, de 2005, ameaçou sair da gaveta. Ficou só na ameaça.
Disse a ministra Cármen Lúcia: “No Brasil, a gente engole o elefante, mas engasga com a formiga, consegue fazer o impeachment (da presidente da República), mas não consegue tirar o vereador da cidade pequena que todo mundo sabe que roubou ou fez coisa errada”.
Isso é gravíssimo. Mas o problema é maior e ainda pior do que o expresso pela figura de linguagem da magistrada que assume a presidência do STF em setembro.
O Brasil não consegue desratizar nem dedetizar. Ao contrário, mantem privilégios que perpetuam a multiplicação de roedores e insetos, predadores que não só o engasgam, mas o intoxicam. Perto disso, engolir elefantes é fácil.
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