Como o tempo do sistema de justiça raramente coincide com o calendário da política, mais provável é que o desfecho das ações em planejamento em Brasília e Curitiba ocorra no fim de maio, depois da decisão do Senado sobre o destino de Dilma Rousseff.
Sobram motivos para alguns aliados do atual e do eventual futuro governo adormecerem preocupados com quem vai bater à porta na manhã seguinte. Em dúvida, consulte-se Rodrigo Janot, procurador-geral da República. Sexta-feira passada, em Boston, ele disse a pesquisadores das universidades de Harvard e MIT: “O mensalão foi brincadeira comparado à Lava-Jato. O olhar retroativo sobre os fatos de 2010 a 2012 revela essa origem criminosa. Estou convencido, com os fatos de hoje, de que é uma operação conjugada. O mensalão é parte do iceberg que depois veio a ser descoberto. Nem todo. Acho que esse iceberg ainda tem partes a serem descobertas. Hoje, temos certeza.”
A procuradoria deve encerrar abril conduzindo 49 inquéritos contra políticos no Supremo Tribunal Federal, onde não cabem recursos. O deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é o campeão em suspeitas de formação de quadrilha, corrupção e lavagem de dinheiro, entre outros crimes. Já foi denunciado duas vezes. O Supremo decidiu processá-lo num caso e, agora, vai resolver sobre o seu afasta- mento da presidência da Câmara.
Será personagem em mais duas denúncias previstas para os próximos dias. O ambiente vai piorar, e muito, antes de começar a melhorar. Uma boa definição para esse desastre político foi dada pelo poeta sergipano Carlos Ayres Britto, ex-presidente do Supremo. Ele recorreu à expressão típica do sertão para freadas bruscas como forma de organizar a carga nos paus de arara: “O momento é de freio de arrumação nas ideias, nos valores e nos métodos da sociedade brasileira. E quando esse freio de arrumação é dado, historicamente, quem não estiver com o cinto de segurança da decência, da transparência pública, do dever cumprido, vai se machucar seriamente.”
São eloquentes as 93 sentenças do juiz Sérgio Moro, de Curitiba. As condenações já somam 999 anos. Dos réus, 65 fizeram acordos. Desses, 51 (78% do total) estavam em liberdade. Outros 14 preferiram delatar e voltar para casa usando tornozeleira eletrônica. É o caso de Fernando “Baiano” Soares, coletor de propinas do PMDB de Eduardo Cunha, que deve depor hoje na Comissão de Ética da Câmara.
O respaldo dos tribunais superiores a 96% dos procedimentos processuais tem ajudado o bom humor dos procuradores. Depois das inúmeras menções a Deus na votação do impeachment na Câmara, alguém teria procurado o chefe da procuradoria: — O senhor vai ter de investigar Deus. É impossível que uma pessoa mencionada tantas vezes não mereça ser investigada. — Eu respondi — conta Janot. — Olha, não provoque. Vai que Ele resolva fazer uma colaboração premiada. Esse Cara sabe tudo...
José Casado
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