Não é justo. Mais adequado é vê-lo como o arquétipo do político brasileiro. Senão vejamos. O país está economicamente arruinado, a presidente não consegue governar e a sociedade clama por mudanças cuja premissa é a saída do poder do partido hegemônico, o PT, que demonstrou não ter remédio contra a crise, posto que ele próprio é a crise, já que a produziu.
Depois de alguns meses de absoluta indiferença – período em que todos os índices econômicos pioraram, até o país perder o grau de investimento -, decide dar uma espiada de leve nos movimentos de rua e examinar a viabilidade do impeachment.
Eis então que Cunha promete se debruçar sobre cada pedido, mesmo sabendo que o de Bicudo e Reale fala por todos, e promete lá para o final de outubro uma avaliação.
Quem anteontem assistiu ao programa do PMDB na televisão supõe que o partido já rompeu com o governo. Falou-se o tempo todo em mudança, em novos tempos, com ênfase na conjuntura crítica, sobretudo na economia, que reclama projeto, que não há. E o partido repetiu isso várias vezes.
Não obstante, paralela e simultaneamente, seus caciques, que fazem parte do governo desde o início da Era PT, negociam com a presidente uma maior fatia no bolo ministerial. A crise não é um desafio, mas oportuna moeda de troca.
Lula esteve com Cunha e pediu-lhe que segurasse os pedidos de impeachment. Não se sabe a contrapartida que lhe ofereceu, mas não é difícil deduzir, tendo em vista o que disse a Dilma: “É melhor perder ministérios que a presidência da República”. Esse é o projeto contra a crise, que passa ao largo do clamor das ruas.
Enquanto isso, governadores oposicionistas reuniram-se em São Paulo e, em síntese, disseram que é preciso repensar o impeachment, que a impopularidade da presidente não o justifica. FHC chegou a dizer, à Folha de S. Paulo, que “ainda falta uma narrativa convincente para desencadear o impeachment”.
Ora, nada menos que cinco delatores da Lava Jato já disseram, com todas as letras, que Dilma Rousseff foi eleita com dinheiro roubado da Petrobras: Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco, Ricardo Pessoa, Fernando Baiano e Nestor Cerveró.
O ministro Gilmar Mendes, do STF, não hesita em afirmar que “nós estamos nesse caos por conta desse método de governança corrupta, um modelo cleptocrata”. Referia-se ao PT e ao governo Dilma, resumindo o que o juiz Sérgio Moro e o Ministério Público têm mostrado ao país, há meses.
Há ainda as pedaladas fiscais, que configuram crime contra a Lei de Responsabilidade Fiscal e respondem pela bagunça nas contas públicas, que findaram pelo envio ao Congresso de um orçamento deficitário, cujas consequências imediatas foram a perda do grau de investimento, a alta desenfreada do dólar e o aumento do desemprego, com todo o seu cortejo de danos sociais.
Mas FHC acha o enredo “insuficiente” para o impeachment e seus correligionários estão divididos. O PMDB, partido de profissionais, gente pragmática, opta pela ambiguidade, que, desde a redemocratização, tem sido sua característica.
O STF, por sua vez, decide enfraquecer as investigações, fatiando os processos da Lava Jato, que, mesmo conexos, serão agora examinados separadamente, para gáudio dos denunciados.
Macunaíma, aboletado nos três Poderes, não entende – e por isso teme e rejeita - gente como Sérgio Moro. Machado de Assis dizia haver dois brasis, sendo o real bom e promissor, e o oficial, burlesco, assemelhado a Lilipute, o país dos anões, das “Viagens de Gulliver”. É possível mudá-lo? “Ai, que preguiça!”, diria Macunaíma, num vasto bocejo.
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