sexta-feira, 6 de março de 2015

Fidel


Fidel morreu (um início óbvio para um texto, naturalmente). Chegou ao inferno (outra obviedade, mas não tem jeito, é inerente à narrativa vindoura).

Aí, o Diabo ficou de frente para El Comandante e mando

u essa diabólica frase: “Como tu és o bacana lá de Havana, vou te dar uma possibilidade a mais aqui”.

El Comandante fez aquela cara de revolucionário macho-alfa de la Sierra Maestra que só ele sabia fazer (e o Korda sabia fotografar).

Entretanto, apesar de curtir um discursozinho de 17 horas de duração, Fidel ficou estranhamente na dele, dentro de seu uniforme Adidas vintage.

O Diabo prosseguiu: “É o seguinte. Apesar de nunca ter aberto isso para ninguém – nem para a princesa Diana –, vou te fazer uma concessão. Tu mereces: décadas e décadas em cima da rapadura… Merece demais!”.

O comunista-mór deu um risinho.

“Vais poder escolher se quer ficar aqui comigo ou lá no céu com aqueles querubins consumistas. É pegar ou largar!”, bradou Satã.

Fidel falou pela primeira vez, num quase sussurro: “Conte-me um pouco sobre cada opção”.

“O céu”, disse o Diabo, aboletando-se numa mesa em chamas, “além de ar condicionado, tem moeda sólida, cartão de crédito, Disney World e cada mulher que até você, octogenário e alquebrado desse jeito, ia querer entrar no Viagra para desfrutar”.

“E o inferno?”, perguntou um Fidel já mais desenvolto.

O Demônio soltou uma gargalhada tão roufenha que o bafo de enxofre fez o ditador latino-americano engulhar: “O inferno você já conhece!”.

“Como assim, já conheço?”, interpelou o Torquemada latino ligeiramente confuso.

“É que nem Cuba: todo mundo é igual, tem direito à mesma ração, aos mesmos hospitais, às mesmas escolas. As mulheres também são lindas, só que quem mora no inferno não pode ter relações sexuais com elas. Só os visitantes…”

A sorte estava lançada. Satanás lançou um olhar mefistofélico na direção do dirigente cubano. Este analisava seu destino com a frieza e o materialismo típico de um Netchaiev dostoievskiano.

“O tempo acabou”, vociferou o Cramulhão. “Céu ou inferno?” Sem titubear, Fidel respondeu: “céu”.

O Diabo não acreditou no que ouvia: “Mas e a Revolução?”.

Fidel concluiu, antes de subir para o firmamento: “Hay que endurecerse, mas com financiamento em 120 meses e juros de 0,5% é mais fácil…”

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