Uma das razões por que por vezes os ricos se suicidam mais do que os pobres nos países desenvolvidos será precisamente por isto. Enquanto os pobres lutam todos os dias para sobreviver e estão ocupados em conseguir sustento para os filhos, os ricos não necessitam dessa força motriz e caem justamente pelo vazio existencial.
Não havendo um projeto de vida nem tendo de lutar pela sobrevivência, o que resta? Em entrevista recente ao Jornal de Negócios, dizia Rutger Bregman: “Então, para mim, há uma certa superficialidade e uma certa infantilidade nessas pessoas [ricas] que, continuamente, querem comprar coisas desnecessárias, para impressionar pessoas de quem não gostam. Essa é uma existência bastante triste.”
Há duas ou três coisas que podem dar sentido à vida de alguém.
Desde logo uma família. Ter o prazer de viver ao lado da pessoa amada, de acompanhar o crescimento dos filhos e o desenvolvimento dos netos é desiderato que preenche a necessidade de sentido de muitos homens e mulheres. As preocupações com a saúde dos nossos, as alegrias que nos proporcionam e o prazer da sua companhia são mais do que suficiente para muitas pessoas.
O problema é quando surge a síndroma do ninho vazio, quando os filhos saem de casa para constituir família e os netos passam a fase da adolescência e já não precisam do apoio dos avós. Ou quando vem um luto e a pessoa fica reduzida a si mesma, na solidão, entre quatro paredes.
Outros vivem intensamente a sua carreira profissional. A perspetiva da valorização, a atualização de competências, as promoções e os projetos e alvos de quem gosta do seu trabalho representam o suprimento de um sentido para a sua vida.
O problema é quando surge numa qualquer esquina da peregrinação um desemprego inesperado, ou quando vem a idade da reforma e, de repente, a pessoa se sente inútil se acaso não souber reagir a essa fase da vida e reformular-se.
Há outros ainda que se dedicam a uma ideologia política, religiosa ou social, ou então a uma causa humanitária.
Todas estas coisas que preenchem a necessidade humana de sentido podem funcionar durante muito tempo, mas de uma forma ou de outra há sempre um momento em que se esgotam. É por isso que não se deve jogar a vida toda num só tabuleiro. É bom que a família, a profissão ou o ativismo não esgotem totalmente as nossas energias. A verdade é que cada indivíduo, além de ser pai, mãe, avô, avó, profissional ou ativista, é uma pessoa, um ser humano.
Interessar-se pelas artes, por viajar, por adquirir novos conhecimentos e por ser útil ao próximo e à sociedade é uma necessidade para a vida toda, independentemente da família, da profissão ou de qualquer outro envolvimento, por mais gratificante ou altruísta que seja.
Em suma, ninguém deveria viver apenas para a família ou a profissão, se ao mesmo tempo não alimentar um projeto de vida pessoal, isto é, se ao mesmo tempo não for capaz de viver também para si. Quando se passa uma vida inteira com o foco exclusivamente nos outros, descurando-se a si mesmo e às suas necessidades pessoais, vai chegar o tempo em que se percebe que ficou por preencher um espaço vital. E das duas uma, ou o indivíduo encontra energia para se reconverter rapidamente ou então entra numa espiral de desânimo e degradação preocupante.
Vitor Frankel, o pai da Logoterapia, aprendeu às suas custas e de forma dolorosa, enquanto prisioneiro num campo de concentração nazi, que é urgente para cada indivíduo encontrar um sentido para a sua existência. Nem que seja nas condições mais desfavoráveis ou adversas e mergulhados em sofrimento duma forma que é difícil imaginar. Foi esse entendimento que o manteve vivo, essa capacidade de encontrar um sentido para a sua vida mesmo naquelas condições e sempre na iminência da morte.
Devíamos aprender com ele, não esquecendo que Cervantes pôs o Dom Quixote a dizer que “onde há vida, há esperança.”
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