De acordo com o promotor que analisa o caso, que foi gravado pelas câmeras de segurança do quiosque, “constata-se uma ação do mais alto grau de crueldade, perversidade, desprezo pela vida”. O jovem que trabalhava como garçom no quiosque é descrito pelos clientes como “alegre e educado”. Ele perdeu a vida apenas por ter pedido ao dono do bar da praia que lhe pagasse 200 reais (33 euros ou pouco menos de 38 dólares) que lhe devia.
O jovem que gritava para não ser morto foi linchado por cinco homens com chutes, socos e golpes de madeira. De acordo com exames médicos, Moise entrou em agonia 10 minutos antes de morrer e foi encontrado com as mãos e os pés amarrados, com os olhos ainda abertos.
Talvez a execução brutal realizada na areia da bela praia do Rio, a inveja do mundo, esteja causando dupla indignação na sociedade e tenha explodido nas redes sociais porque o país vive politicamente em um clima onde o governo do fascista Jair Bolsonaro tem como lema que o “melhor bandido é o bandido morto”. Se for executado, melhor ainda.
O presidente é defensor da tortura e da pena de morte. Sua política, seus gostos, seus esportes estão todos relacionados às armas, cujo mercado facilitou porque seu sonho é que todo o país esteja armado. Seu gesto favorito é simular com as mãos o ato de disparar um revólver. Durante a campanha eleitoral, uma cena em que o candidato a presidente do país pega uma menina de cinco anos nos braços e a ensina a imitar, rindo alegremente, o ato de disparar uma arma com a mão inocente, foi ultrajante.
Toda essa paixão pelas armas do chefe de Estado vem criando um clima no país em que a violência e as execuções sumárias se tornaram normal. Eu diria desportivo, se o adjetivo não me machucasse na boca.
Alguns teorizam que o Brasil sempre foi um país violento. É apenas parcialmente verdade. É que hoje essa violência é institucional, alimentada pelos instintos de morte de um presidente que zomba, por exemplo, daqueles que se protegem da pandemia, considerando-os “covardes”.
Estou neste país há 20 anos e sou testemunha de que a violência de hoje mudou de cara porque é alimentada por quem está no poder com o desprezo pela vida e a exaltação da ditadura militar. Hoje, talvez como reação a esse clima de morte que se instalou, cresce um movimento de solidariedade sem precedentes em todo o país, com o aumento de moradores de rua que vivem e morrem na rua.
Talvez o excesso de falta de humanidade do presidente esteja despertando na sociedade um movimento de defesa da vida, de acolher os deixados à própria sorte pela grave crise econômica. Aquele Brasil que reage à violência com sentimentos de compaixão e ajuda os que ficaram para trás na vida lembra-me a cena que presenciei quando cheguei aqui. Foi na praia de Copacabana, no Rio, quando uma idosa caiu inconsciente. Em poucos segundos, uma dezena de pessoas se reuniu com seus celulares na mão chamando uma ambulância. No Consulado me disseram então que os espanhóis que vieram para o Brasil queriam ficar. Eles comentaram que aqui “as pessoas são gentis, alegres e solidárias”.
Hoje, essa alegria e esse espírito acolhedor se perdem em meio à fumaça dos sentimentos de hostilidade, desconfiança e violência instigados por quem está no poder. Como disse o ex-presidente Lula da Silva, que aparece nas pesquisas como o candidato mais forte para derrotar Bolsonaro, “o Brasil precisa recuperar a alegria perdida”.
O grito do jovem trabalhador congolês de “Não me mate!” que continua ressoando na areia branca das praias do Rio onde foi executado vilmente e morreu de olhos abertos, talvez sirva, um triste paradoxo, para que quando chegar a hora de ir às urnas, os brasileiros decidam desta vez devolver ao país a felicidade perdida depois de ter se libertado do pesadelo do que já é considerado o pior e mais violento dos governos democráticos deste país.
Nenhum comentário:
Postar um comentário