Depois de três anos sob a presidência de Jair Bolsonaro, há apenas uma certeza: tudo sempre pode piorar. Agora, não apenas ele, que abriu a campanha pela reeleição no dia da posse, mas também seus auxiliares aumentam o tom das imbecilidades. Buscam consolidar candidaturas regionais patrocinando um campeonato de sandices que seria até risível, não fosse nefasto, abominável, acintoso.
Embora não sejam as únicas, as principais estrelas desse show de horrores têm sido os ministros da Saúde, Marcelo Queiroga, que deseja ser candidato na Paraíba, seu estado natal, Ciro Nogueira, o novo dono do cofre, Damares Alves, candidata ao Senado, e o até então bem comportado João Roma, pretendente ao governo da Bahia.
Quase imbatível no capachismo ao chefe e atrás de votos da base radical do presidente, o médico Queiroga há muito rasgou o juramento que fez, tornando-se protagonista de disparates em série.
Da consulta pública sobre vacinação infantil – como se o uso de um imunizante fosse papo de botequim e pudesse ser decidido por leigos -, ao aval à inominável nota técnica pró-hidroxicloroquina e anti-vacina editada por seu Ministério, Queiroga passou a ser comemorado pela turma bolsonarista. É patético vê-lo defender a vacinação e a testagem em massa em entrevistas e, ao mesmo tempo, boicotar ambos.
Parceiro da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos na funesta visita a um hospital de Botucatu, Queiroga também pareceu torcer para que a parada cardíaca de uma menina de 10 anos fosse reação à vacina. Especialmente no estado de São Paulo, terra de João Doria, que tinha recém aprovado o uso emergencial da CoronaVac para o público entre 5 e 11 anos.
O mal não foi causado pela vacina. Mas nem Queiroga nem Damares, que usou o Twitter para alertar sobre os “perigos do imunizante infantil”, se desculparam ao saber que a criança sofria de uma síndrome rara. Muito menos Bolsonaro, que chegou a telefonar para os pais da menina. Uma tremenda mobilização para um governo que se notabilizou pelo desdém diante das centenas de milhares de famílias atingidas pela pandemia.
Ao contrário. Damares, que Bolsonaro gostaria de ver candidata ao Senado por São Paulo, mas que provavelmente vai tentar uma vaga de menor risco no Amapá, intensificou sua cruzada antivax.
Na semana passada, publicou uma portaria em que “instrui” os pais e responsáveis de que a vacina infantil contra a Covid seria facultativa, não inclusa entre os imunizantes obrigatórios para as crianças. A partir desse entendimento, considerou ser uma afronta aos direitos de ir e vir a exigência de comprovante de vacinação. E abriu o canal Disque 100, dedicado às denúncias contra direitos humanos, para os não vacinados que se considerem discriminados.
Isso no momento de explosão da variante Ômicron, no qual os não vacinados respondem por mais de 80% das internações – em alguns casos, 90%, como no Distrito Federal – em um sistema de saúde esgotado, engordando as estatísticas de mortalidade. Pior: deliberadamente atrasando o fim da pandemia que já matou mais de 625 mil brasileiros.
As ofensivas de Ciro e de Roma são mais elaboradas. O ministro-chefe da Casa Civil, que já foi Lula de carteirinha e agora é bolsonarista desde criancinha, tem mandato de senador até 2027. Não é candidato, mas tem deixado claro que é o manda-chuva do governo. Não por outro motivo, se diz para-raio do fragilizado Paulo Guedes, ex-super ministro da Economia. Divide e reparte o bolo e, como diz o ditado, deve ficar com a maior parte. Todos os candidatos governistas estão nas mãos dele.
Roma tem posto as manguinhas de fora com vagar. Sua pasta, a Cidadania, arrebanhou um orçamento invejável e é a responsável pelos programas sociais do governo. Nada mal para quem pretende disputar o cobiçado governo da Bahia.
Discreto e com cara de bom moço, aprendeu os modos com ACM Neto, de quem foi chefe de gabinete na Prefeitura de Salvador. Na sexta-feira, estreou em rede de rádio e TV como bom bolsonarista, mentindo já no primeiro parágrafo de seus quase 6 minutos de fala. Disse que o Auxílio Brasil é o “maior programa permanente de transferência de renda do país”, quando se sabe que o pagamento de R$ 400 ao mês para os elegíveis do Bolsa Família só vale para este ano. Deu-se a partir da PEC do calote nos precatórios, e não tem receita para ser “permanente”. No mínimo, Roma incorreu em propaganda enganosa, com o triplo agravante de ser publicidade eleitoral custeada pelo pagador de impostos, antecipada e falsa.
Neste ano de eleições, tudo tende a piorar. Bolsonaro e os seus vão continuar demolindo o que existe, desafiando as instituições e testando todos os limites para destruir um pouco mais. Trata-se de um método. Só a resistência nos meses que faltam e as urnas podem clarear tempos tão sombrios.
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