No texto bíblico está dito: “Depois da tempestade vem a bonança”. Mas não é sequência automática. Depende de como cada um vivencia os momentos de sofrimento, do aprendizado que cada um faz e da mudança de atitude posterior aos tempos de angústia.
O mundo inteiro está mergulhado em um momento desafiador. A presente crise promove a combinação perversa entre a violenta pandemia e o fantasma de uma crise econômica inédita e devastadora.
O vírus, além de seu efeito voraz sobre vidas humanas, produz uma lição de humildade aos governantes. O quão ilusório é o poder? Seu alcance pretensamente ilimitado esbarra, às vezes, quase na impotência. Até os mais autoritários líderes mundiais dobraram o joelho. Recomendo o filme “Flu”, na Netflix: uma reflexão, no ambiente de uma epidemia, sobre como, em situações limites e radicais, decisões políticas dramáticas podem salvar ou sacrificar vidas.
Quem sabe as crises, e não a violência, sejam as parteiras da história? Em linguagem corrente: “como fazer do limão a limonada?”. A meu juízo, tudo vai depender do aprendizado pessoal, familiar e social que construirmos.
Será que perceberemos que, mais do que nunca, estamos integrados em uma “aldeia global”? Que as fronteiras são realidades históricas, políticas, institucionais, mas que não resistem a um vírus agressivo e indisciplinado que nasce na China, invade a Europa, assusta os EUA e se dissemina pelo Hemisfério Sul? Será idealismo ou aprendizado necessário reencontrar com a nossa natureza universal de seres humanos e imaginar um mundo mais fraterno e pacífico?
Será que perceberemos que, diante de uma pandemia quase indomável, as barreiras entre ricos e pobres desmoronam? É evidente que os pobres têm uma situação muito mais vulnerável. Mas o vírus não seleciona por faixa de renda ou patrimônio. Afinal, o epicentro da epidemia na Itália não foi a Lombardia, sua região mais rica? Quem sabe fica o aprendizado e o compromisso coletivo com o combate aos privilégios e às desigualdades?
Será que a crise da Covid-19 deixará um legado de humildade, diálogo, entendimento e convivência respeitosa entre as lideranças políticas brasileiras? Será que descobriremos a quase inutilidade dessa guerra ideológica polarizada e de má qualidade, quando a política na democracia é exatamente a construção de consensos progressivos em ambiente plural de divergências, tendo o diálogo, aberto e franco, como ferramenta? Até aqueles que, se achando plenipotenciários, enfrentaram as evidências e a ciência, se dobraram à realidade. Será que aprenderemos que ninguém é dono da verdade? Até agora, ninguém têm a verdade absoluta sobre o vírus, apesar de todo o empenho da comunidade científica. Não temos vacina, remédios com eficácia comprovada, explicações exatas sobre a dinâmica da propagação.
Será que depois da crise valorizaremos e daremos mais atenção ao sistema de saúde e aos seus profissionais, sobretudo ao SUS? Cansei de enfrentar situações no Congresso onde a repercussão da voz da bancada da saúde era diminuta, sempre abafada por outras bancadas temáticas ou setoriais. Será que enfrentaremos de vez o crônico subfinanciamento do SUS e seus gargalos?
Transformar a tempestade em bonança depende de nós, essencialmente do nosso aprendizado.
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