Fora do Uruguai, o latino-americano gosta de emoção na política, de tensões elevadas, da vitória sofrida no último minuto, com a ajudinha de um golpe de sorte e a sensação de que venceu um grande inimigo.
A estabilidade produz impaciência. O Brasil não foge à regra. Lula está solto e rodando o país para galvanizar a oposição ao governo, esperando que um pouco dos ventos de esquerda que sopram no Chile e na Argentina venham para cá —isso se os ventos da direita da Bolívia não chegarem antes.
Neste momento, nem Lula nem Bolsonaro sequer tentam falar aos eleitores do campo contrário. É inútil. O grande objetivo —para ambos— é garantir que não exista nada fora desses dois campos.
Não é preciso afirmar uma equivalência de ambos para observar que se utilizam da mesma dinâmica social destrutiva para se alavancar. Ambos, quando puderam, atentaram contra a democracia brasileira.
Bolsonaro testa diariamente os limites com seus ataques e promoção do ódio às instituições entre sua horda de militantes desejosos de violência. Lula tentou cooptar nossa democracia pelo uso ilegal do dinheiro, bem documentado no Mensalão, Petrolão e propinas de empreiteiras.
O número dos que consideram o atual governo ótimo ou bom parece ter se estabilizado em torno de 30%.
Haddad, no primeiro turno das eleições de 2018, conseguiu quase 30% dos votos válidos, ou seja, cerca de 21% dos votos totais. Com a memória dos anos Dilma se esvaecendo e Lula candidato ou no mínimo solto e ajudando na campanha, o apoio à sigla deve partir no mínimo desse valor. Sobra pouco espaço para que alguém de fora da dobradinha Bolsonaro-PT chegue ao segundo turno em 2022.
Cabe lembrar que, a se consolidarem as tendências atuais, Bolsonaro tem a vantagem. A população que não está em nenhum dos extremos pende mais para o antipetismo e não gosta daquilo que associa à velha política. Ao mesmo tempo, a economia dá sinais de recuperação e a violência cai. Sendo ou não mérito do governo Bolsonaro, se a melhora durar até 2022, o apoio popular deve aumentar.
Será uma pena se, mais uma vez, o país se render à polarização, pela incapacidade de qualquer liderança em unir todos aqueles que não querem mais fake news, teorias da conspiração e demonização de metade do eleitorado.
O problema é que moderação e respeito ao jogo democrático (inclusive às suas regras não escritas) jamais serão valores capazes de animar a população.
Trabalhar em cima desses números buscando um eleitor não alinhado com os extremos parece, assim, fadado ao fracasso. A chance está em alguém que seja capaz de virar essa mesa e colocar a escolha popular em outros termos. Mudar o jogo em vez de apenas tentar vencê-lo.
A política atual oscila entre o medo e o ódio. Ódio ao inimigo e medo do que ele fará se, ou enquanto, tiver o poder. Está faltando um valor positivo, que toque outra paixão poderosa e capaz de unir a sociedade: a esperança de grandes feitos, o orgulho de se viver num país que possa inspirar o mundo com seu exemplo.
Um líder que encarne uma visão inspiradora do que o Brasil pode ser é a única esperança de sairmos do cabo-de-guerra destrutivo em que nos metemos. Existirá alguém à altura?
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