Bolsonaro fez parte dela, por alguns anos. Naquele momento, ainda não era um líder popular nacional. Tornou-se presidente, e discutir com líderes populares é mais áspero: os seguidores são hipersensíveis à imparcialidade ou ao preconceito.
Mas fatos são fatos. A política externa conduzida por Bolsonaro precisa ser criticada, pois pode nos levar a um isolamento perigoso no momento de uma crise mundial.
Bolsonaro aproximou-se dos Estados Unidos. Nada a reparar. A aproximação com os Estados Unidos estava no seu programa e, creio, é apoiada pela maioria dos eleitores brasileiros.
Bolsonaro aproximou-se dos Estados Unidos e está se afastando de outras partes do mundo. Isto não estava no programa. Muito menos reduzir o movimento a uma proximidade com a família Trump, como se política externa fosse tocada por amizades familiares, e não interesses nacionais.
Bolsonaro aproximou-se de Israel. Nada a reparar. Mas se afastou do mundo árabe ao anunciar que levaria a Embaixada do Brasil para Jerusalém. Não completou o plano, mas o desgaste ficou no ar.
Bolsonaro assinou um acordo comercial com a Europa, condicionado ao respeito ao meio ambiente. Nos últimos tempos, tem se dedicado a criticar a Europa, afirmando, injustamente, que a Alemanha quer comprar a Amazônia a prestação.
O acordo com a Europa ficou mais difícil, pois Alberto Fernández, vitorioso nas prévias argentinas, não o quer agora. Acha, como o ex-chanceler Celso Amorim, que o momento não é adequado para o Mercosul. Isso não impediria o Brasil de ir adiante. O próprio acordo prevê que os países entrem de acordo com seu ritmo. Quem aprovar a entrada não precisa esperar o outro.
Com as declarações de Bolsonaro, dificilmente avançaremos. Ele cancelou uma reunião com o chanceler francês para cortar o cabelo. Os franceses não entenderam essa emergência capilar.
Bolsonaro já abriu uma guerra contra os peronistas que devem voltar ao poder. Teme que os argentinos invadam o Sul, fora do verão, como os venezuelanos em Roraima.
A Argentina estava aí antes de Bolsonaro e continuará depois dele. São relações de Estado que precisam ser desenvolvidas, e não uma troca de insultos ideológicos.
Para completar as trapalhadas no Sul, o governo Bolsonaro quase derruba seu aliado paraguaio, com o acordo sobre Itaipu. Além dos problemas criados e do ressentimento nacionalista que reavivou, apareceu na negociação uma empresa brasileira ligada a um suplente do senador Major Olimpio.
Gostar de grana é realmente suprapartidário, mas torna-se algo muito sério quando envolve uma negociação delicada como a de Itaipu.
O novo embaixador do Brasil nos Estados Unidos pode ser um filho de Bolsonaro. Ele já fez referência à necessidade de bomba atômica e afirma que diplomacia sem armas é ineficaz.
Já tínhamos resolvido essa questão com os argentinos, não há mais duvida quanto à nossa política nuclear. Se somarmos a reação agressiva à eleição do que chama de bandidos de esquerda na Argentina, Bolsonaro, através do filho, pode nos afastar ainda mais de uma vizinhança tranquila, apesar das diferenças.
Quando deputado, Bolsonaro às vezes ficava bravo, mas discutia. Como presidente, sente-se um herói poderoso: ganhei as eleições.
Se Bolsonaro se fixasse numa relação apenas com os Estados Unidos, já seria extremamente perigoso. Mas o embaixador que pretender enviar aos EUA andava com um boné de propaganda da reeleição de Trump. A verdade é que Trump nos aproximou da OCDE. Mas o próprio Bolsonaro boicota essa aproximação ao apoiar a medida de Tofolli que neutraliza investigações da Receita.
O Brasil corre o risco de ficar apenas com Trump. Em termos pessoais, nada a declarar, pois a química humana é de fato surpreendente. Em termos nacionais, é um grande equivoco.
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