O projeto, chamado de Lei Geral das Agências Reguladoras, não tira do presidente da República, em nenhum momento, a prerrogativa de escolher os dirigentes desses órgãos. Apenas altera o modo como as indicações são feitas. Não serão mais aceitos candidatos que sejam políticos, parentes de políticos ou ligados de alguma forma a empresas do setor, e o texto exige comprovação de experiência para o exercício do cargo. Os candidatos serão então submetidos a uma comissão de seleção – cuja composição tem de ser avalizada pelo presidente da República. Em seguida, a comissão escolhe os nomes dos finalistas, na forma de lista tríplice, que igualmente é submetida ao presidente. O nome escolhido pelo presidente é submetido então ao Senado, que pode rejeitá-lo – nesse caso, o presidente pode indicar outro nome, “independentemente da formulação da lista tríplice”, conforme se lê no parágrafo 6.º do artigo 5.º da lei aprovada.
Ou seja, a palavra do presidente da República é decisiva em todas as etapas do processo de preenchimento de vagas de direção nas agências reguladoras. Não há nada parecido com usurpação de prerrogativas, como Bolsonaro dá a entender – o presidente chegou a dizer que o Congresso quer transformá-lo em uma “rainha da Inglaterra”, isto é, num chefe de Estado sem poder para governar. Mesmo depois de o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, ter esclarecido que “o presidente não perde prerrogativa alguma” – algo que poderia ter sido verificado por meio de uma simples leitura do projeto aprovado –, o Palácio do Planalto manteve a interpretação de que o presidente Bolsonaro estava sendo preterido.
Mais grave do que isso, porém, é a visão que o presidente Bolsonaro tem das agências reguladoras. Esses órgãos, criados nos anos 90 para dar ao Estado capacidade regulatória para proteger o interesse público em meio às privatizações, devem ser autônomos, isto é, livres de qualquer influência política que possa distorcer sua função de promover a qualidade e a continuidade da prestação dos serviços públicos por empresas privadas. Bolsonaro, no entanto, acredita que deve ter influência nas agências. “As agências têm um poder muito grande e essa prerrogativa de o presidente (da República) indicar o presidente (da agência) é importante porque nós teremos algum poder de influência nessas agências”, declarou. O porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, informou que, na opinião de Bolsonaro, o presidente deve “manter o poder discricionário” na escolha dos diretores das agências porque é necessário que esses órgãos tenham “um alinhamento com as propostas das políticas públicas do governo”.
Ora, a função das agências reguladoras, como órgãos de Estado, não é alinhar-se ao governo – o projeto aprovado prevê, justamente por isso, que os mandatos dos dirigentes não sejam coincidentes com o do presidente da República. Mas o atual presidente não concorda com isso. Nesse ponto, parece disposto a agir como o ex-presidente e hoje presidiário Lula da Silva, que, quando esteve no poder, tudo fez para minar a independência das agências reguladoras.
Durante a era lulopetista, as agências sofreram forte processo de desmoralização, exatamente sob o argumento, hoje usado por Bolsonaro, de que esses órgãos representavam uma usurpação de poderes do Executivo. Foi assim, sempre em nome do “interesse público” – expressão usada agora pelo porta-voz do presidente para justificar a atitude de Bolsonaro –, que algumas das agências deixaram de cumprir sua importante função, transformando-se em meros cabides de emprego.
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