Defender a Petrobras é querer restaurar sua credibilidade e reerguê-la o mais rápido possível, não é negar a corrupção
No entanto, o que se vê, em grande parte, é o embaralhamento de afirmações rasteiras ou falsas, slogans, superficialismo, xingamentos, distorções de fatos, visando a apresentar mentiras como se fossem verdades e a evitar a discussão franca dos reais problemas.
Não faz qualquer sentido, por exemplo, pedir o impeachment de uma presidente legitimamente eleita, sem que ela seja alvo de qualquer investigação policial ou indiciamento. Nem atacar o ex-ministro da Economia por levar a esposa para tratamento médico num hospital particular, em vez de procurar o SUS. Nem criticar a presidente por ter escolhido um ministro que se compromete a fazer um ajuste fiscal (e se ela mentiu na campanha a esse respeito, que se critique a mentira, não o ajuste). Nem achar que dá para fazer ajuste sem cortes. Nem afirmar que o rebaixamento do grau de investimento da Petrobras, pela Moody’s, se deve a um desconhecimento da situação por parte da agência, e não à falta de um balanço auditado e às sucessivas descobertas de um esquema de corrupção sistêmica — fatos inegáveis, que precisam ser admitidos e não dependem de que se atribua sua causa a aparelhamento, projeto partidário de poder e intromissão política em decisões que deviam ser técnicas ou que, por outro lado, se acredite realmente que só ocorreram por artes do capeta ou de FH.
´É ainda puro embaralhamento comparar delação premiada a extorsão ou tortura. Ou confundir o sigilo exigido por esse instrumento legal e a divulgação de depoimentos dados à polícia, chamando estes de vazamento seletivo.
Também não faz qualquer sentido achar que quem quer ver punida a corrupção na Petrobras está atacando a pobre estatal que precisa ser defendida contra o imperialismo ianque. Defender a Petrobras é querer restaurar sua credibilidade e reerguê-la o mais rapidamente possível, não é negar a corrupção que vinha ocorrendo nela e botar a culpa nos outros, insultando a inteligência alheia. Não dá para imaginar que a oposição conseguiu, em 12 anos de governo petista, infiltrar gente nos quadros da empresa especialmente para criar o crime perfeito: fazer contratos superfaturados com empreiteiras e acertar que o dinheiro a mais, além de calar a boca de uns e outros, seria depois lavado para ser doado legalmente a partidos políticos, sobretudo da base aliada. Tudo “de acordo com a lei".
Também é absurdo querer impingir que a solução para evitar que isso se repita não deve passar pela Justiça e pelas punições previstas em lei, mas virá por um novo sistema de votação em lista partidária, em que o eleitor só escolhe o partido, mas elege quem os dirigentes escolheram. Mais uma manobra diversionista para embaralhar o debate. Aproveita-se que a opinião pública quer ver o fim desse descalabro de campanhas milionárias bancadas pelo poder econômico (até a CNBB já se manifestou nesse sentido). Então, em vez de discutir regras que limitem as doações das empresas, ou até as proíbam se for o caso, tira-se novamente do bolsinho da calça a ideia de financiamento público e voto em lista fechada. O que tem isso a ver com as calças? É mais uma manobra para confundir. A discussão deveria ser em torno do barateamento das campanhas, mais curtas, em programas de TV menores e mais enxutos, sem atores fingindo de eleitores, sem filmetes milionários, sem marqueteiros inflacionados — apenas algo como o candidato diante da câmara se apresentando, ou entrevistado por um jornalista, ou debatendo com adversários.
Embaralhar o debate só serve para criar confusão, acirrar um clima emocional já acentuado, desviar a atenção. Não faz bem à democracia. Acaba em apelos para se partir para cima ou ameaça de chamar exércitos. O mínimo que o cidadão bem intencionado pode fazer é voltar ao assunto sem morder a isca. Mas que cansa, cansa.
Ana Maria Machado
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