Não há ninguém nas ruas.
Há carros e, ocasionalmente, algumas bicicletas, mas viver a pé não é opção numa cidade onde cada empresa tem uma sede maior do que a outra no seu próprio campus. Ao mesmo tempo, nunca houve tanta gente na rua — em tendas, debaixo dos viadutos, em pequenas aglomerações precárias. Muitas dessas pessoas são dependentes químicas, mas outras tantas apenas não têm para onde ir.
A Califórnia vive uma crise de moradia sem precedentes, e San José não é exceção.
Para dar uma ideia: o aluguel de um conjugado não sai por menos de U$ 2 mil. Jovens desenvolvedores que precisam estar no coração do mundo da tecnologia pagam U$ 650 pelo aluguel mensal de cápsulas de dormir empilhadas, chamadas pods, que têm 1,20m de altura e onde cabe um colchão de solteiro (e acham bom negócio). Esses hostels supercompactos, onde é difícil conseguir vaga, têm áreas de convivência e banheiros compartilhados, exatamente como os hotéis cápsula de Tóquio ou os claustrofóbicos microapartamentos de Hong-Kong. Não cheguei a ver nenhum deles; descobri que existem ao pesquisar sobre a crise de moradia na cidade, que parece incongruente diante da vastidão dos espaços vazios.
O meu esquema de mala única falhou desta vez, e precisei comprar uma outra mala. O pessoal do hotel indicou um shopping a 15 minutos de Uber. Pois ele estava quase tão vazio quanto as ruas da cidade. Muitas lojas desoladas e caídas, quando não simplesmente fechadas.
Não achei nenhuma mala pequena e barata na gigantesca Macy’s, nem qualquer funcionário que pudesse me esclarecer os preços do que havia. Para não perder a viagem, resolvi comprar um jeans. São dezenas de marcas, centenas de modelos e tamanhos, milhares de unidades; quase todas já vêm rasgadas.
(Você sabe que está velha quando não consegue mais entender a moda.)
Um mar imenso e compacto de peças feias, cabide após cabide... para ninguém. Pensei em fugir correndo, mas encontrei três que poderiam servir; os provadores, porém, estavam fechados. Andei vários minutos com as peças na mão sem encontrar uma única pessoa.
Havia um provador aberto do outro lado da loja. Lá também não havia nenhuma funcionária, nem mesmo aquela clássica figura que costuma conferir, na entrada, quantas peças a gente está levando. As cabines pareciam todas ocupadas; na verdade estavam vazias, mas cheias de roupas que outras clientes haviam experimentado e deixado por lá mesmo.
Além da crise de moradia, a Califórnia vive também, desde a pandemia, uma tremenda crise de mão de obra.
Na Target havia um pouco mais de gente; em compensação, a seção de malas estava bastante desabastecida. Peguei a primeira que vi e pronto. O que havia em abundância eram produtos para o Halloween, um monte de bobagens que vão servir para um único dia e depois serão lixo até o fim dos tempos.
Ah, sim: havia uma funcionária na caixa. Ela não falava inglês.
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