sábado, 1 de abril de 2023

O que fazer com Jair Bolsonaro?

Num mundo regido por uma ideia de Justiça platônica, Jair Bolsonaro teria sofrido impeachment pelos vários crimes de responsabilidade que cometeu e estaria na cadeia pelas múltiplas infrações penais comuns. Só que não vivemos neste mundo ideal; vivemos no Brasil mesmo. Nossa tarefa primordial agora é renormalizar a democracia. Demos o primeiro passo para isso ao negar, pelo voto, um segundo mandato a Bolsonaro, mas a tarefa está longe de concluída e ela é suficientemente complexa para gerar demandas contraditórias.

Para uma democracia funcionar, é preciso que o custo de deixar o poder não seja alto para os agentes políticos. Se o governante acha que ele será morto, preso ou comerá o pão que o diabo amassou depois de perder o cargo, fará tudo a seu alcance para que isso jamais aconteça. Na versão forte, isso significa dar golpes de Estado e recorrer a outras formas de violência; na light, violar as normas escritas e não escritas de condução de governo e de comportamento eleitoral para aferrar-se ao poder.


A contrapartida do baixo custo de o governante deixar o cargo é que, quando o ocupa, também tenha limitado seu poder de fazer o que bem entenda. A possibilidade de retorno, pelo voto, deve valer tanto para grupos como para programas políticos. O segredo sujo da democracia (leiam Adam Przeworski) é que, para ela dar certo, não pode promover mudanças muito radicais, daquelas que não tenham volta. É paradoxal, mas faz sentido.

Meter Bolsonaro no xadrez violaria o princípio do baixo custo, admito. Mas eu acredito que estejamos encalacrados numa fase anterior à da plena normalidade democrática. Precisamos deixar claro de uma vez por todas que assumir o poder não significa receber um cheque em branco. Se Bolsonaro não for punido pelos inúmeros abusos e delitos que cometeu, estaremos sinalizando para os políticos que, para ficar no poder, vale mais ou menos tudo.

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