sexta-feira, 16 de setembro de 2022

Tarefa hercúlea

Diferente do novo rei da Inglaterra, Charles III, que iniciou no corre só agora aos 73 anos, Hércules, herói mitológico, filho de Zeus e Alcmena, teve doze trabalhos. Tá, foi mais punição do que propriamente trabalho, mas vá lá, até que trabalhou duro e com afinco para um semideus. E assim, sem férias remuneradas, décimo, vale alimentação, direito ao aviso prévio, seguro desemprego, nada. Era tipo um MEI.

O quinto trabalho de Hércules é um dos menos conhecidos e mais enigmáticos: limpar as estrebarias de Aúgias, que era filho de Poseidon, rei de Elis e um dos argonautas, e que, dizem os faladores da época (sempre existiram) tinha vínculos diretos com o centrão. Seu rebanho de gado (sempre existiram) era o maior de toda a Grécia. Porém, seus estábulos não eram limpos há trinta anos. Peço que não façam ainda comparações com a nossa política. Agradeço.

Essa tarefa difere das outras porque dessa vez não lhe é exigido força nem astúcia, e sim humanidade. Afinal, como poderia realizar um serviço tão mundano sem se contaminar com a sujeira acumulada? Aúgias redobra a dificuldade do trabalho, prometendo a Hércules que se fizesse a tarefa em apenas um dia seria recompensado com um décimo de seu rebanho, mas, se fracassasse, sua vida e seus bens seriam dele. Como um bom patrão.

Hércules vagou pelo reino observando carroças que passavam com cadáveres vítimas da pestilência do local. Notou também que dois rios, o Alfeu e o Peneu, corriam mansamente pela região. Então, reuniu os dois rios alterando-lhes o curso de tal maneira que eles passaram a correr por entre as estrebarias, limpando assim seus detritos em apenas um dia, sem que ele tivesse que sujar as mãos. Como um bom estagiário.

Quando Hércules obteve êxito improvável em seu quinto trabalho, escuta a seguinte resposta de Aúgias: “Os rios fizeram o trabalho, e não tu. Foi uma manobra para tirar meu gado, uma conspiração contra meu trono. Não terás recompensa. Vais daqui ou te mandarei decapitar”. Resumindo, foi golpe, siiim! Ou seja, o apego ao gado e ao trono vem lá da Grécia antiga. Não é, definitivamente, uma invenção nossa.

Agora, no próximo dia dois de outubro, uma tarefa hercúlea (sempre quis usar o termo, agradeço a oportunidade) se apresenta. Se não tivermos força e astúcia suficientes, que tenhamos a humanidade necessária para imaginarmos, como o também semideus Eduardo Galeano, “outra possibilidade de mundo, um que seja feito de alegrias miúdas e não de migalhas miseráveis”.

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