domingo, 10 de abril de 2022

Os falsos adversários de Bolsonaro

Difícil, mas possível, explicar porque o eleitor poderá reeleger um presidente responsável por parte dos 660.000 mortos pelo covid, que ameaça dar golpe militar, elogia tortura, tem um governo com corrupção nos Ministérios da Saúde e da Educação, promove a destruição de nossas florestas, envergonha o Brasil no exterior, não controla a inflação, tem sido rodeado de milicianos… É possível, e a culpa não está no eleitor, ele apenas tem de escolher em qual votar no segundo turno, ou não votar em qualquer dos dois.

Apesar do lamentável balanço de seu desempenho, Bolsonaro tem dois aliados: o PT ainda hesita em falar para fora dos seus apoiadores tradicionais e os “nem-nem” cujas acusações depredam a imagem do Lula e do PT.


Sem Lula, Bolsonaro não será derrotado, mas sozinho ele não vence a eleição, precisa que os democratas não-petistas subam no seu palanque, para uma vitória no primeiro turno ou para apoiá-lo no segundo. Mas os discursos antipetistas e antilula há meses e os que serão feitos ao longo do primeiro turno tendem a inviabilizar apoio ao Lula. Os discursos “nem-nem” se transformarão em votos nulos, elegendo Bolsonaro.

Para dificultar a situação, os “nem-nens” são empurrados para longe do Lula e do PT, não apenas por preconceitos (ou conceitos) vindos do passado, mas também por falas do ex-presidente que às vezes esquece que é candidato em uma eleição difícil. O Lula assusta eleitores não petistas quando fala em revogar reformas, no lugar de dizer como pode aperfeiçoar a reforma trabalhista, a reforma do ensino médio e a PEC do Teto de Gastos. No lugar do horror a privatização, precisa dizer como fará o Estado servir ao Povo. Assusta também e serve à propaganda de Bolsonaro, quando se assume porta-voz de bandeiras específicas de grupos sindicais, feministas, no lugar de ser porta-voz dos direitos gerais, sem se assumir de um grupo em choque com outros.

Há momentos que o PT e o candidato Lula parecem falar para espelhos dentro de bolhas isoladas, sem levar em conta as mudanças nas últimas décadas: na geopolítica, nas tecnologias, nas percepções dos limites ecológicos ao crescimento, na mudança da pirâmide demográfica, no esgotamento do Estado, na irreversível abertura da economia e da sociedade ao mundo global. E também na importância da educação de base como o vetor do progresso. O PT e Lula precisam entender que o mundo mudou desde meados dos anos 80, quando o PT foi fundado, com o Muro de Berlim em pé, antes da inteligência artificial, da microinformática e da internet. Precisam perceber também que, na política, não há mais bolhas isoladas: a fala de agrado a um grupo, entre paredes fechadas, se espalha para todas as demais bolhas, gerando sorrisos de alegria entre os que estão em frente e ranger de dentes nos que estão ao lado. Diferente de 2002 e 2006, o discurso do Lula em cada grupo não espera para ser divulgado, intermediado por jornalistas: agora ele aparece, simultânea e universalmente.

Se compararmos os dois governos e respectivas personalidades, parece ilógico e impossível Bolsonaro ter mais votos do que Lula. Mas a impossibilidade fica lógica se somarmos os votos do atual presidente aos votos nulos induzidos pelo antipetismo dos “nem-nem” e pelas falas de Lula e PT para dentro de suas bolhas setoriais, corporativas, identitárias, ideológicas.

Não adianta colocar Alckmin na frente do espelho, é preciso romper a bolha e falar para o Brasil e para o futuro, sem nostalgias nem sectarismos. O PT e Lula precisam ler o alerta do Senador Randolfe, neste mesmo jornal Metrópoles, ao dizer que Lula precisa ser plural, como aliás ele tende a ser pessoalmente. E deu provas durante seus dois governos. Caso contrário, pode perder a eleição, inexplicavelmente, para Bolsonaro. Precisam entender que esta derrota será do Braisl, não apenas do Lula e do PT, portanto, a vitória deve ser de todo o Brasil e não apenas dele e do PT. Até porque dificilmente vencerão e certamente não governarão dentro da bolha e falando para o espelho.

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