quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

Aposentadorias de militares no Brasil são mais generosas que as de outros países?

Assim como em diversos países, quem segue carreira militar no Brasil tem um sistema de aposentadoria especial, com regras mais brandas e mais benefícios que as de outros funcionários públicos e de trabalhadores da iniciativa privada.

Por exemplo, na Previdência Social, para trabalhadores do setor privado, o teto atual da aposentadoria é de R$ 5.645. Já um militar que vai para a reserva não possui um limite máximo para os valores recebidos. Em tese ele está sujeito ao teto constitucional, equivalente ao salário de ministros do STF: R$ 33,8 mil hoje (R$ 39,3 mil a partir do ano que vem).

A lógica por trás da discrepância é que a carreira militar requer condições especiais, já que, entre outras peculiaridades, a categoria tem algumas restrições: não têm direito a greve nem a horas extras e não recolhem FGTS (fundo de garantia), além de não terem direito a adicionais noturnos e de periculosidade.


"Obviamente há diferenças. É uma carreira com muitas especificidades, com mais riscos, em que, se a pessoa sair, as condições são diferentes", explica o professor Luís Eduardo Afonso, especialista em previdência da USP (Universidade de São Paulo).

No entanto, os benefícios para os militares aposentados no Brasil acabam ultrapassando os concedidos em outros países, como o Reino Unido e os Estados Unidos, segundo Afonso e outros especialistas em previdência.

"A diferença entre a previdência dos militares e o setor privado [qualquer pessoa que aposente pela Previdêncial Social] no Brasil é muito grande e muito diferente de outros países", afirma o professor de direito Jorge Cavalcanti Boucinhas, da Escola de Administração de Empresas da FGV, que cita países como Estados Unidos, Reino Unido, Espanha e América Latina.

Aqui no Brasil os oficiais podem deixar a carreira mais cedo com salário integral em comparação com os EUA e o Reino Unido, por exemplo. A legislação atual permite que os militares brasileiros se aposentem com salário integral após 30 anos de serviço. No Reino Unido e nos EUA, por exemplo: a aposentadoria é sempre proporcional ao tempo de serviço.

No Brasil, a remuneração dos militares na reserva e as pensões de militares são regidas por uma série de legislações que vem desde os anos 1960 – a última alteração foi por meio de uma medida provisória em 2001.

Nos Estados Unidos, no novo sistema de aposentadoria de militares, cada ano de serviços prestados corresponde a 2% do salário para aposentadoria, segundo o Departamento de Defesa americano. Portanto com 30 anos prestados a aposentadoria representa 60% do salário.

Pelo sistema antigo, ligeiramente diferente (e que ainda é possível aderir), o tempo de trabalho mínimo para se aposentar é 20 anos, com 50% do salário, e mais 2.5% a cada ano de serviço a mais. Militares inativos também tem alguns outros benefícios, como seguro saúde e dental, empréstimos imobiliários simplificados e subsídios para pagar por educação.

O modelo americano é parecido com o do Reino Unido, onde a aposentadoria também é proporcional, calculada a partir do salário final, o número de anos de serviço e um coeficiente específico para o serviço militar. Após 30 anos de serviço, por exemplo, é possível se aposentar com cerca de 43% do salário, de acordo com o Departamento de Defesa e Forças Armadas do país.

Em ambos os países, a aposentadoria de militares só é integral em caso de morte em serviço ou aposentadoria por invalidez.

Ou seja, os benefícios previdenciários para militares brasileiros acabam sendo mais generosos apesar de militares de países como EUA e Reino Unido estarem mais expostos a riscos, já que são nações que se envolvem em conflitos armados com mais frequência."Temos um sistema mais generoso (que o deles), principalmente nas questões das pensões e contribuições, mesmo com maior envolvimento (desses países em conflitos", afirma Boucinhas.

Nos últimos anos, as Forças Armadas brasileiras só se envolveram em conflitos durante missões de paz da ONU (Organização das Nações Unidas), como a missão no Haiti e a no Líbano.

"A necessidade de levar em consideração as especificidades do serviço militar não pode ser usado para justificar privilégios", diz.

"É questão conceitual: todos os países estão envelhecendo e isso nos obriga a uma preparação e exige um esforço maior de custeio de toda sociedade – incluindo os militares", afirma Afonso. "E isso não significa deixar de levar em consideração as peculiaridades da carreira."

O Ministério da Defesa diz que não é adequado realizar comparações com esses países, porque eles têm uma "série de benefícios indiretos para os militares, como, por exemplo, a isenção de determinados impostos". Além disso, diz o ministério, o poder de compra dos salários dos americanos é maior e eles têm uma "acumulação de patrimônio ao longo do serviço" superior a dos brasileiros.

Enquanto o sistema previdenciário brasileiro de funcionários públicos e trabalhadores da iniciativa privada está sendo rediscutido na reforma da Previdência - atualmente parada no Congresso -, mudanças na aposentadoria dos militares nem estão em discussão, já que o presidente Michel Temer excluiu os militares de sua proposta de reforma.

Em 2017, o déficit dos gastos com militares inativos e pensões do Exército, da Marinha e da Aeronáutica foi de R$ 37,7 bilhões. O déficit para 2019 está projetado para R$ 43,3 bilhões, de acordo com dados da proposta orçamentária do ano que vem. Esse valor é 47,7% dos R$ 90 bilhões de déficit previdenciário do setor público.

O Ministério da Defesa afirma que os valores referentes aos militares inativos (R$ 24,5 bilhões), não se tratam de "despesa previdenciária" portanto o gasto projetado de R$ 43,3 bilhões não pode ser entendido como "déficit previdenciário". A pasta afirma ainda que os gastos com pensões e com militares inativos devem ser "analisados separadamente".

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