A família Bolsonaro, nova oligarquia na política brasileira, como era previsível, começou a se desintegrar muito cedo. Carlos Bolsonaro desentendeu-se com Gustavo Bebianno e foi embora da transição, depois de ter pilotado as redes sociais durante a campanha, com sucesso. Tem mandato de vereador e o prestígio intransferível de ser filho do presidente. É claro que mesmo longe terá influência inaudita.
Eduardo Bolsonaro, que barbarizou na campanha e sofreu desmentidos em série, continua assombrando na transição ao começar uma rodada internacional de conversas, até fazendo alianças para punir Venezuela e Cuba, não se sabe com que mandato. O chanceler nem tomou posse. Se fosse na área militar, estaria preso.
Embora a lenda diga que Flávio é o mais estourado, não apareceu esse traço até agora. Mas é inegável a preponderância dessa influência familiar, afinal todos estarão na mesma ceia de Natal.
E eles não se contêm, parecem muito entrelaçados com o pai. Como não têm intimidade com a política, nem em sua história, nem adquirida, a possibilidade de errar é grande. Uma vantagem: todos tinham mandato antes de o pai chegar à Presidência, portanto têm legitimidade inquestionável, mas uma performance tosca.
A política brasileira sempre foi enredada por oligarquias. Todo presidente tem sua família, claro, não pode abandoná-la só porque chegou ao poder máximo, mas nem toda família tem condições de fazer parceria com o presidente. O chefe tem que domá-la.
E não há necessidade de ter cargos formais para os próximos. Getúlio Vargas trabalhou com a filha Alzira todo o tempo, e ela era uma assessora informal. Já Roseana Sarney teve cargo no Palácio. Os exemplos aparecem nas conversas entre os que estão perplexos com as intromissões dos filhos. Por exemplo, os irmãos Goes Monteiro, que exerceram funções diversas, de interventor a governador, de senador a chefe militar, todos tiveram os instrumentos necessários para manejar a política.
Pelo núcleo político mais próximo também não é possível perceber para onde estão indo. Bolsonaro cercou-se de pessoas que não eram líderes em seus partidos, quase tratadas com desprezo no Congresso e não têm o condão para mover opiniões, alianças e votações. Talvez o governo lhes dê força.
Onyx Lorenzoni e Gustavo Bebianno são incógnitas indecifráveis no momento. A relação do governo com o Congresso é crucial, e não se tem ideia de como ela vai acontecer sob o comando desses políticos já indicados. Cargos fundamentais para essas relações são os de líder do governo no Senado e na Câmara, que ainda não foram mencionados.
Ou a relação com o congresso está sendo articulada secretamente, ou não se sabe ainda o que fazer sem o presidencialismo de coalizão.
A Casa Civil tem que ser forte em um governo como esse. Não se tem ideia de como formar consensos. Por exemplo: os políticos de quem Bolsonaro se cercou até agora são todos contra a reforma da Previdência, ponto crucial de um programa de governo, hoje: Onyx, major Olímpio, coronéis, generais, sargentos, nunca quiseram a reforma. Só se vai ver com mais nitidez esse quadro quando começarem a operar de fato.
O grupo da Economia, sob o comando de Paulo Guedes, é homogêneo. Mas por ele também não dá para adivinhar o rumo do governo. Guedes vem de formação em Chicago, junto com a maioria de sua equipe. Sergio Moro, o poderoso ministro da Justiça e grande conquista do presidente eleito, vem de Harvard. A universidade que fez a formação de Moro é um centro de inteligência aberto, múltiplo, a mais glamourosa instituição dos Estados Unidos. Chicago cristalizou na universidade os princípios da economia conservadora. Quem vai inspirar o presidente?
O Itamaraty e o Ministério da Educação fazem parte daquele nicho, que também sempre existe, de amigos dos amigos, no caso dos amigos do guru presidencial Olavo de Carvalho. Uma dupla de direita, rígida, que também só com esse traço não aponta o que vai ser a nova gestão. Do filósofo Olavo Carvalho, que os apadrinhou, não se pode esperar muito porque ele não fornece ao espectador uma unidade de pensamento.
Percebe-se no novo governo uma República de Juiz de Fora, cidade que forneceu boa parte da equipe dos assessores e ministros militares. Curioso como Juiz de Fora virou marca indelével na vida política do presidente eleito. Porém isso, por si, não quer dizer muito.
Os numerosos militares de alta patente que assumirão cargos de relevância têm traços em comum. Alguns foram assessores militares no Congresso, onde se aproximaram de Bolsonaro como de muitos outros políticos. Os militares sempre fizeram sólida ponte com o Congresso, são aplicados, seguem a tramitação de projetos de seu interesse com grande disciplina. Parlamentares lhes têm estima. São organizados e cumprem rigorosamente a missão que lhes foi dada. São os melhores assessores parlamentares do governo que circulam pelos salões verde e azul.
Quem não teve essa escola, entre os militares do governo Bolsonaro, também tem comportamento ameno e senso de dever e submissão ao chefe presidente. Esse temperamento em comum lhes dá unidade. A ver como funciona quando começarem a operar. Até agora foi o grupo mais bem arranjado do novo governo, desmentindo os abalos esperados.
E a indefinição na comunicação é séria. Não dá para governar por desmentidos no Twitter, nem por anúncios de planos e nomeações pela rede. Aconselharam o presidente sobre a desnecessidade de ter uma comunicação profissional com os que fazem comunicação. Bolsonaro tem falado mais além do Twitter, mas não basta, é preciso ter no governo quem cuide disso. Para a mídia não tem problema, é fácil acompanhar o patriarca pelos seus manifestos, estejam onde estiverem. Para a sociedade é desinformação e risco de perda precoce de popularidade do eleito.
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