sábado, 28 de julho de 2018

As regras do jogo

Os partidos mais mportantes — e, hoje, há muitos, da esquerda à direita do espectro político, que podem ser classificados como tal — contam com bem mais do que boa estrutura e capilaridade. Beneficiam-se de regras concebidas para lhes garantir dotações privilegiadas dos dois principais recursos escassos que costumam determinar o desfecho das eleições: fundos para financiamento de campanha eleitoral e acesso a tempo de propaganda no rádio e na televisão. Tanto num caso como noutro, a legislação vigente determina que a distribuição de tais recursos aos partidos seja feita por critérios que dão peso preponderante ao tamanho da bancada de cada legenda na Câmara de Deputados.

A formatação dada ao financiamento público de campanha, no ano passado, representou reforço substancial das barreiras que tais regras impõem à concorrência política, ao dificultar ainda mais a contestabilidade dos que ocupam cargos eletivos, especialmente na esfera federal. O que agora se prevê é que, com tal reforço das barreiras à entrada, a taxa de renovação do Congresso será bem menor do que a que vinha sendo observada em eleições anteriores. Sobretudo na Câmara.


Não há como alimentar ilusões. A composição da próxima legislatura será muito parecida com a atual. E esse é um dado de realidade que tanto os candidatos a presidente como seus eleitores terão de ter em mente. O partido com maior bancada da Câmara tem hoje menos de 12% das cadeiras. Seis outros partidos, supostamente importantes, entre 8% e 10%. É com uma legislatura tão fragmentada como essa que o próximo presidente terá de dar governabilidade ao país.

Os partidos que integram o que agora passou a ser chamado de blocão — PP, DEM, PR, PRB e Solidariedade — detêm atualmente, em conjunto, cerca de um terço da Câmara e mais de um quinto do Senado. De uma forma ou de outra, estão fadados a desempenhar papel crucial no próximo mandato presidencial.

Na verdade, a importância que deverão ter já ficou mais do que clara nas últimas semanas, quando, premidos pelos prazos do calendário eleitoral, vários candidatos a presidente disputaram seu apoio, deixando de lado apreensões com desgastes de imagem que poderiam advir de uma coligação explícita com o mal-afamado centrão.

A preocupação imediata não era tanto com a governabilidade, mas com a conquista dos valiosos direitos a tempo de propaganda em rádio e TV detidos pelos partidos que compõem o blocão. Ao final da disputa, da qual participaram abertamente Geraldo Alckmin, Jair Bolsonaro, Ciro Gomes e o PT, o candidato tucano acabou levando a melhor.

Como esperado, a vitória não foi sem custo. Abriu flanco para uma saraivada imediata de críticas, não só da parte de candidatos que ficaram à margem da disputa como dos que dela participaram sem sucesso. Houve quem usasse a expressão “escória da política”, quem declarasse que se tratava da remontagem do “condomínio da Dilma” e quem prenunciasse um “novo governo Temer sem Temer”.

Esta última crítica, feita pelo PT, merece reflexão. Gostemos ou não da realidade política que nos cerca, temos de saber conter nossas expectativas sobre o próximo mandato presidencial dentro dos limites do possível. E, por mais pejorativa e eleitoralmente desastrosa que possa parecer, a ideia de um governo Temer sem Temer talvez descreva de forma sucinta os limites do que poderá ser efetivamente possível nos próximos quatro anos.

Basta tentar imaginar, num esforço de análise histórica contrafatual, o que poderia ter sido o governo Temer, sem a tenebrosa conversa do porão do Jaburu, sem as malas e as mochilas de dinheiro e sem a entourage palaciana que tantos problemas lhe trouxe, mas com a mesma capacidade de articulação com o Congresso, para viabilização de uma agenda econômica lúcida e realista, concebida por uma equipe de excelente nível. Seu legado teria sido outro.
Rogério Furquim Werneck 

Nenhum comentário:

Postar um comentário