Temer viveu a crise dos caminhões em dois estágios. Atravessou a fase da inação e a etapa da rendição. O presidente deu de ombros para a encrenca ao ser alertado, em outubro de 2017, sobre os riscos da paralisação. Voltou a subestimar o problema quando recebeu dois ofícios ameaçadores nos dias 14 e 16 de maio. “Imagine o Brasil ficar sem transporte por uma semana!”, anotava o primeiro aviso. “O Estado de fragilidade financeira que se encontra o setor (de transportes) é altamente inflamável”, ecoava o segundo.
Cinco dias depois da última advertência, os caminhões foram atravessados nas rodovias. Em 48 horas, o caos estava esboçado. E Temer, depois desperdiçar todas as oportunidades que teve para compreender o problema, amarelou três vezes em uma semana:
1) Na última terça-feira, o presidente pediu “trégua” aos caminhoneiros sublevados, acenando com o tabelamento do diesel por 15 dias.
2) Na quarta-feira, cedeu 12 reivindicações sem obter nenhuma garantia de desobstrução das estradas. O congelamento do diesel passou para 30 dias.
3) Neste domingo, Temer protagonizou uma rendição humilhante. Depois de acionar com atraso os órgãos de segurança, incluindo as Forças Armadas, o presidente içou a bandeira branca e entregou aos grevistas um pacote de vantagens que vira do avesso a própria filosofia liberal do seu desgoverno. Incluiu no embrulho uma mágica que fará sumir do preço do diesel a Cide, o PIS e a Cofins. O truque resultou num desconto de R$ 0,46 por litro. E Temer ainda esticou a vigência do tabelamento do óleo para 60 dias.
Dias depois de ter participado de ato partidário em que o MDB lançou a candidatura do ex-ministro da Fazenda Henrique Meirellles ao Planalto e divulgou um programa de governo ortodoxo, Temer plagiou a heteroxia de Dilma Rousseff. Ao acomodar a política de preços da Petrobras em cima do telhado, interferindo nas relações de mercado da estatal com distribuidores e transportadores, Temer assumiu o risco de ser processado pela antecessora por plágio.
Com sua inação, Temer ignorou os efeitos da gangorra do câmbio e da alta internacional do petróleo no bolso do consumidor. E estimulou os caminhoneiros a sequestrarem a rotina da sociedade. Diante do fato consumado, Temer ficou sem margem de manobra. Não lhe restou senão a opção de pagar o resgate exigido por autônomos e empresários que querem tudo, menos iniciativa privada.
Um dos auxiliares de Temer previa desde sexta-feira que, com mais uma semana de desabastecimento, o asfalto roncaria. E junho de 2018 seria uma reedição de junho de 2013. Um governador praguejava em diálogos privados: “Se o Temer não se acertar rapidamente com os caminhoneiros, não terminará o mandato.” Neste domingo, enquanto o inquilino do Planalto falava na TV, as panelas voltaram a soar nas janelas e varandas.
O governo já havia sofrido uma pane moral em 17 de maio de 2017, quando o grampo do Jaburu escalou as manchetes. Mas muita gente ainda alimentava a ilusão de que Temer seria campeão da austeridade porque patrocinara a emenda constitucional do teto de gastos. Essa lorota ruiu. O que leva um governo a economizar dinheiro é a decisão de não gastar. E sempre que um presidente interfere nas relações do mercado com as empresas privadas e de economia mista, o contribuinte paga contas amargas.
Por ora, o espeto dos caminhoneiros foi orçado em R$ 10 bilhões. É uma exorbitância. Mas a conta será bem mais salgada. O Tesouro Nacional ainda voltará a ser importunado. E o PIB de 2018, cuja previsão oficial já havia deslizado de 3% para 2,5%, começa a ser projetado abaixo dos 2%.
Temer já não dispunha de base parlamentar. Estilhaçou o restinho de confiança que o pedaço mais otimista do mercado ainda nutria por ele. Generalizou-se a sensação de que o Brasil encontra-se irremediavelmente desabastecido de governo.
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