Em janeiro de 2003, Lula chegou lá. Com 52.793.364 votos, tomou posse no Planalto. Sobreviveu ao escândalo do mensalão, que começou a ceifar o PT, e foi reeleito em 2006. Deixou o governo em 2011 com a aprovação de 83% dos brasileiros, um recorde histórico. Elegeu e reelegeu sua ministra Dilma Rousseff como sucessora.
Para vencer e governar, suavizou a carranca de sindicalista, aparou a barba, vestiu ternos bem cortados. E uniu-se àqueles que chamava de inimigos, a elite empresarial e os “300 picaretas” no Congresso.
Radicalizou o discurso e adicionou toques de messianismo: “Pensarei pela cabeça de vocês”; “Andarei pelas pernas de vocês”. Confiou na parcela de 37% dos eleitores que, mesmo depois da condenação do petista em segunda instância, em janeiro, declarou o voto no ex-presidente.
Lula jogou todas as fichas na força de sua imagem. Entrincheirou-se num símbolo de sua trajetória, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Cercou-se de militantes e antigos aliados que fizeram vigília desde que o juiz Moro decretou sua prisão, no fim da tarde de quinta-feira. Resistir foi a palavra de ordem. Mas as manifestações restringiram-se aos companheiros de sempre. Aqueles que historicamente gravitam em torno do PT. Revezaram-se ao microfone enquanto negociava-se o roteiro para o ato da prisão.
O momento da perda da liberdade é precioso para a construção da narrativa eleitoral. O PT quer apresentar ao país um homem preso e vítima de perseguição política como candidato ao Planalto. Pretende sustentar a ideia de que eleição sem Lula é uma fraude.
O enredo petista, no entanto, esbarrará em obstáculos concretos — novas possíveis condenações em outros processos da Lava-Jato, por exemplo. E, sobretudo, a impossibilidade legal de levar o ex-presidente até a urna, depois que a Justiça Eleitoral negar-lhe o registro da candidatura, por força da Lei da Ficha Limpa.
Há quarenta anos Lula é personagem central no país. Cresceu à frente do PT pregando ética e honestidade. O envolvimento com o mensalão e a Lava-Jato desconstruiu esse discurso e igualou os petistas e seu líder aos demais partidos e políticos que combatiam. Refazer as pontes que os levaram ao poder poderá exigir bem mais do que a imagem do mito encarcerado.
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