À época, não houve escândalos ou corrupção sistêmica patrocinados pelo governo ou pelo partido do presidente. Os tucanos tinham um projeto para o país, faziam jus ao slogan do “Partido das reformas e da decência”.
Mas isso é passado. O PSDB hoje não é a sombra do que foi. Vive a maior crise de sua história. Sem projeto de nação, sem um centro gerador de novas ideias e, com sua pauta ditada a partir dos projetos pessoais de suas lideranças, entrou em parafuso com o agravamento da crise a partir das delações da Odebrecht e da JBS.
Por sua bagagem histórica, a social-democracia estaria capacitada para ser protagonista do que o cientista político Marco Aurélio Nogueira, da UNESP, caracterizou como um desfecho virtuoso da crise terminal do governo Michel Temer: “a fixação de um entendimento comum sobre o day after, por meio da reposição do pacto político devidamente qualificado e aberto à sociedade”.
Em vez disso, nivelou-se por baixo com o PT e o PMDB em muitas questões, sem dar explicações críveis aos seus 51 milhões de eleitores, utilizando-se de expedientes que condenou, quando praticados por adversários. E suas lideranças, mais uma vez, fizeram movimentos erráticos, deixando de apontar um norte para o país.
Na falta de um centro unificador, natural que a confusão se instale nas suas próprias fileiras e se manifestem tendências desagregadoras. Sobretudo porque se cristalizou a precarização da democracia interna por meio de direções unipessoais e imperiais. Um dado revelador: finalmente o diretório nacional do PSDB vai se reunir, após anos sem nenhum encontro.
Em nome da defesa das reformas previdenciária e trabalhista, fez-se prisioneiro do dilema entre ficar ou sair do governo Michel Temer. Perdeu o timing, talvez por excesso de prudência, de tomar uma posição que o qualificasse como protagonista.
Mas cautela, quando em demasia, confunde-se com o medo de tomar atitudes. E essa é a percepção da sociedade sobre o alto tucanato.
Talvez grande erro de cálculo do PSDB tenha sido imaginar que as reformas ainda passariam pelo governo Temer, quando este perdeu inteiramente as condições de levá-las a bom termo. O problema agora é administrar os danos, enfrentar a difícil escolha de Sofia, sabendo que corre o risco de perder de qualquer maneira.
Se sair do governo, como clamam vários diretórios e os “cabeças pretas”, pode ser acusado de oportunista, principalmente se a decisão não vier acompanhada do enfrentamento de seu passivo.
Mas ficar no Titanic é condenar-se à posição de coadjuvante de um governo isolado da sociedade, cuja grande meta passou a ser ter 172 parlamentares na sua base, para inviabilizar, na Câmara Federal, a abertura de processo contra o presidente da República.
Enfraquecido pelas corporações, que golpearam fundo para impedir as reformas modernizadoras, e ainda sujeito a novas revelações, o presidente pode embarcar na aventura de fazer das reformas a sua tábua de salvação, ignorando a correlação de forças no Congresso. O desfecho pode ser catastrófico: a rejeição das reformas pelo Parlamento. Aí sim, elas iriam para as calendas, pois levaria anos para retornarem à agenda política.
O ser ou não ser dos tucanos não levará a lugar nenhum se for equacionado única e exclusivamente pela ótica eleitoral. Para ter coerência com seu passado, o PSDB deveria subordinar seus interesses particulares ao que é melhor para o país: a concertação de uma saída constitucional e rápida, pois Temer não tem mais condições de comandar a transição.
O pior dos mundos é transferir para o TSE as suas responsabilidades, decidindo não decidir.
Sair do governo mantendo firme o apoio às necessárias reformas que o país precisa não será a solução da crise da social-democracia, mas apenas um pequeno passo na sua reinvenção. Para o PSDB, a superação do pior momento de sua história só será possível se enfrentar os desafios de formular um novo projeto para a nação e cortar na própria carne para se reconciliar com seus eleitores e consigo mesmo. A hora é de se ter coragem política.
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