Contudo, é curioso perceber como uma defesa pode se trair e entregar seu cliente: auxiliares e advogados do presidente da República acorreram aos microfones para colocar sob suspeição o Procurador Geral da República, Rodrigo Janot. Anteciparam-se e denunciaram que o Ministério Público (MP) poderia trazer informações de última hora, comprometedoras em relação a Temer, com o objetivo de influenciar o TSE. Incrível, não se alega inocência, nem se nega a existência ou veracidade de eventuais denúncias, apenas se contesta o oportunismo de traze-las a público. O pior réu é o réu confesso.
O que se revela é que há um ciclo de desgastes a conta-gotas, onde indícios, áudios e fitas de última hora indicariam bastidores de pressões capazes de botar Michel Temer atordoado, de joelhos. Como se um imaginário capitão Nascimento lhe agredisse e dissesse: ''pede pra sair''. Se o presidente da República pode ser afetado por uma dinâmica assim, é porque não mais governa.
Isto tem importância política, sim. E não há como esconder fatos dessa constrangedora natureza sob a pele fina de um suposto julgamento técnico. A tática governista se limita a ganhar tempo sem resolver a crise, prolongando sua agonia. Nenhum processo nesse campo é apenas jurídico — o impeachment de Dilma já revelara isto. Às vésperas de perder o pescoço na guilhotina, George-Jacques Danton constatara que ''o processo é sempre político''. Nada disso é novo.
Se ministros do tribunal se influenciam ou não por elementos desse tipo, isto é pouco relevante: independente do julgamento, se fatos novos vierem a público o presidente, que está por um fio, ficará à deriva; a situação do governo ainda mais desconfortável. Livrar a cara no Tribunal, apelar, delongar pode até ser fácil, o difícil será recuperar a mínima credibilidade social necessária e, depois, o controle da base parlamentar; fazer reformas.
De modo que, independente do julgamento (ou não) de hoje, a questão consiste em responder como será, afinal, o que restar do mandato de Michel Temer — dure ele mais um ano e meio, mais quinze dias ou quinze horas.
A própria incerteza de concluir o mandato já é tema de apreensão: o que esperar de alguém que não sabe o que será de seu amanhã; se haverá um amanhã? Se isto é ruim nas relações pessoais, o que dizer do presidente da República? Independente do TSE, uma espada pesará para sempre sobre a cabeça do governo; o bafo do medo não cessará, seja ele de Rodrigo Rocha Loures, Eduardo Cunha, ou Lúcio Funaro. A incerteza perseguirá Michel Temer como sombra; não se governa nem a si e nem a um país com temores desse tipo.
Como tubarões, deputados e senadores se movimentam pelo cheiro de sangue que percebem nas águas que os rodeiam. Num Congresso majoritariamente fisiológico, o governo fragilizado nada será além de um refém da desconfiança e do medo; o país restará conduzido por personagens preocupados, antes, com a salvação da própria pele, pendurados num pau de circo chamado ''Foro Privilegiado''. Uma nação não se constrói assim. É mediocridade demais, até para o Brasil destes dias.
Carlos Melo
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