Nada como um arranca rabo entre doutos da justiça para os brasileiros saberem o que há muito já se sabe em Brasília: a Justiça brasileira está podre por dentro e por fora. O bate boca entre o procurador Janot e o ministro Gilmar Mendes deveria ser louvado com aplausos porque escancara os bastidores desses homens de preto até então intocáveis. O desentendimento, a roupa suja, mostra os interesses econômicos que há por trás do arroubo desses dois senhores. Janot insinua que a mulher de Mendes, advogada, recebe dinheiro de Eike Batista por trabalhar no escritório de advocacia de Sérgio Bermudes, que defende o milionário. Chacoalhado, Bermudes chama Janot de inescrupuloso, mentiroso, ignorante, leviano e sicofanta (caluniador). E como não bastasse, aponta o dedo na ferida: a filha de Janot, Letícia Ladeira Monteiro de Barros, defende a OAS, a Braskem e outras empreiteiras em acordos de leniência envolvidas na Lava Jato.
A virulência com que Bermudes atacou Janot para defender a mulher do Gilmar é cosia rara no meio jurídico. Normalmente os advogados temem criticar juízes, procuradores, desembargadores e ministros do STF com receio de terem seus processos boicotados quando analisados nessas cortes. Não é o caso de Bermudes que se mostrou muito seguro quando apontou seus mísseis em direção a Janot, destratando-o com insultos e impropérios típicos de briga de rua. Esqueceu-se, por um tempo, que o procurador é que está à frente da maior investigação sobre corrupção da história do país e que em torno dele gravita homens sérios e honrados que não estão envolvidos em maracutaias.
Espera-se que Janot responda à altura os desaforos de Bermudes. Mas, para isso, terá que explicar antes por que a sua filha – não se discute aqui o talento da doutora – aceitou defender os interesses de empresas envolvidas na Lava Jato que tem o seu pai como principal acusador. Parece-me um contrassenso. Depois disso bem explicado, o procurador, pelos insultos que sofreu, não deveria apenas ficar na defensiva. Se quiser ainda levantar a moral, terá que provar que a mulher de Gilmar, a doutora Guiomar Mendes, realmente estaria na caixinha de Eike Batista, solto pelo seu marido. Se convencer, admite-se que pode até permanecer à frente da procuradoria. Caso contrário, infelizmente, ele teria que entregar o cargo para não deixar seus auxiliares a duvidarem da sua honradez.
O certo é que os podres da Justiça começam a aparecer. A trombada entre procuradores, juízes e ministros do STF envolvidos no processo da Lava Jato já mostra frutos benéficos para a população. O primeiro deles é a revelação dos bastidores do STF. Como funciona a engrenagem. Sabe-se em Brasília – e isso não é novidade – que muitos dos ministros do STF não vivem apenas dos salários, por sinal, fartos. Alguns deles instalam escritórios e ali alojam filhos, sobrinhos e até amigos para defender causas, muitas delas dentro dos seus próprios tribunais. Não se sabia, portanto, pelo menos até agora, que procuradores também tinham adotado esse método, uma espécie de caixa dois para reforçar o orçamento da família. Ou quem sabe, uma sobra de campanha, como diria alguns políticos maldosos.
Há quem diga que, por causa dessa idiossincrasia, ser julgado no STF é a mesma coisa que chegar ao céu sem passar pelo purgatório.
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