quarta-feira, 26 de abril de 2017

Sim, chefe!

Com as mãos cruzadas nas costas, diante de especialistas no papel de juízes, ansiosos participantes dos realitys shows de quase tudo – cozinha, costura, maquiagem, vida, aventura e até casamento – são testados, aprovados ou reprovados em cadeia nacional de TV e insistentes repetecos on-line.

No meio do caminho há a humilhação. Invariável. Quanto mais grosseiro o jurado, mais fama terá – ele e o programa. O plateia quer porrada. Os realitys atendem a demanda.

Reunidos em grupos, concorrentes são submetidos ao público e a juízes nada dóceis. Por meses, padecem de julgamentos semanais e são impiedosamente eliminados, um a um, até que se chegue ao vencedor, para quem está reservado o céu na terra. Bolada de dinheiro mais as delícias da fama – do acesso aos camarotes vips à repaginagem geral: cabeça, tronco, membros e roupas. Em alguns casos, trabalho novo e cursos no exterior.

No desenrolar dos programas, aos que erram, aos que saem, são reservadas broncas e desqualificação. Como a participação é voluntária, a humilhação está prevista em contrato. É consentida. E expressa no disciplinado: Sim, chefe! Que deve significar sou (um M) agradecido de chegar até aqui e assim ser exposto ao seu implacável julgamento.

Há humilhados que se superam e vão até o fim. Há os que ficam pelo caminho. Mas a todos está reservada alguma fama.

O público é torcida com direito a voto. Nos primeiros tempos, premiavam os bonzinhos, os mais pobres, os mais menos alguma coisa. Mais bicudos ficam os tempos, mais cresce a torcida e a chance de vitória dos malvados.

Jurado mauzão também cai no gosto do público. Diz-se – e filmes mostram - que nas equipes policiais, que atuam para conseguir confissões, cabe a uns o papel de mau, impaciente, violento, e a outros o de bonzinho, que dá água, cigarro, que é compreensivo, protetor, pronto pra ouvir e compreender.

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Os realitys repetem a formula. Espelham a vida. Os jurados suaves se contrapõem aos durões. E segue o jogo. Todos cumprindo seu script.

Neste momento estranho do mundo, as audiências querem mesmo é sangue. No sentido figurado – o das humilhações ou execrações públicas - ou real, do que corre nas veias ou jorra pra além da pele. Lutas, guerras, assassinatos e outras violências gravadas ampliam audiência, likes, rendem compartilhamentos monstros.

Sofrimento diverte. Desgraça também.

Bandido pode ser mocinho, se cair no gosto do público. O mocinho de ontem pode virar o bandido de hoje. E aí, pau nele! É assim nos realitys, que imitam a vida que motiva os realitys. Menu completo.

A tecnologia avança. E a delicadeza encolhe. Que se cuide o diabo porque a concorrência anda grande.

A seara do comportamento vive síndrome de Curupira: caminha como os pés ao contrário. Anda pra trás fingindo andar pra frente. Assim, confunde o presente e embaralha o futuro.

A cena política é reino do capeta da garrafa, já no ponto de levar pras profundezas todas as almas que lhe foram vendidas a peso de ouro.

Mercado e economia são redemoinhos do Saci. Nada brincalhão. Nada a ver com o Pererê. Só no modo enxofre e tridente para não deixar escapar ninguém do inferno das reformas.

Para os participantes involuntários do reality da vida as news são cada dia mais bads. Difícil decidir se vamos de sim, chefe! Ou de pare o mundo que eu quero descer.

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