O outro ponto era a pequenina varanda que dava para uma mansão absolutamente linda e absolutamente triste. O jardim impecável estendia-se por muitos metros. A namoradeira branca não tinha uma única falha na pintura e os degraus nunca tinham folhas secas. Os empregados cuidavam de tudo, eu via muito bem enquanto estendia minhas roupas no varal.
Eu diariamente me perguntava onde estariam aqueles prováveis netos cuja ausência transformava um lindo jardim florido em um imenso vazio. Passou dezembro, passou janeiro e fevereiro. O frio começou a afastar-se. Os dias mais longos de março e abril aumentavam a melancolia dos brinquedos inertes. Eu detestava olhar para aquilo.
Era o fim da tarde de um sábado de maio. Eu tinha saído cedo para ler debaixo de sol, comer pão de canela e comprar frutas. Subi os quatro andares de escada e assim que abri a porta comecei a ouvir vozes de crianças. Seria possível? Larguei as sacolas no chão da cozinha e corri para a varanda.
Sim, eles estavam lá. Dois meninos correndo e uma menininha de vestido branco que ainda não andava com muita firmeza, mas encontrava-a nas mãos do avô, que finalmente desceu aqueles degraus. Enquanto a avó se aproximava com uma jarra de suco, eu sentei no chão da minha varanda e senti algumas lágrimas inadequadas rolarem.
Lembrei-me do Chico cantando que a felicidade morava tão vizinha que, de tolo, até pensei que fosse minha. Nunca soube os nomes deles, nem onde viviam as crianças. Nunca pisei naquela casa. Nada naquela história me pertencia. Mas percebi que aquela alegria gratuita pela felicidade alheia, ainda que tão inadequada quanto as lágrimas, era das coisas mais minhas que eu já havia sentido.
Ruth Manus
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