Há uma altura do ano em que as pessoas começam a falar mais alto, as lojas brilham mais do que o necessário e a playlist do supermercado decide que estamos felizes, mesmo que não estejamos.
Ainda nem chegámos ao Natal, mas já estamos a viver num ensaio geral permanente com luzes ligadas, euforia suposta, expectativas a subir…E nós, no meio disto, a tentar perceber se o que sentimos é espírito natalício ou só cansaço acumulado.
A verdade é que existe um Natal antes do Natal e é aí que muitos de nós começamos a tropeçar emocionalmente. Não porque falte vontade, mas porque sobra pressão. A pressão de parecer animado, disponível, radiante; de estar “no mood”; de corresponder a um entusiasmo que nem sempre é sentido.
Depois, ainda há o Natal que imaginamos e o Natal que realmente temos.
Na imaginação, tudo é bonito, alinhado e afetuoso. Na vida real, o Natal chega com tensões antigas, logísticas impossíveis, saudades de quem falta, famílias que não “cabem” bem na mesma mesa, crianças excitadas, adultos exaustos e relações que sobrevivem em silêncio.
Há magia, sim. Mas também há ruído, cansaço e um aperto silencioso.
Como se não bastasse a exigência emocional, dezembro acrescenta outra: a obrigação de estar feliz.
Clinicamente, chamamos-lhe dissonância emocional, quando o que sentimos não combina com o que achamos que devíamos sentir. Gera culpa, irritabilidade, comparação constante. “Porque é que eu não estou tão feliz como os outros?” Porque talvez os outros também não estejam. Só não dizem.
Nesta espiral de imposições ainda há o consumismo emocional, que nesta época atinge o seu pico.
Compramos para aliviar. Compramos para compensar. Compramos para não sentir culpa. Compramos porque “é só mais um presente”. No final da lista percebemos que na maioria das vezes não compramos coisas, compramos segundos de dopamina. Funciona por instantes, depois passa e ficamos nós… e a fatura.
Tudo isto acontece enquanto tentamos gerir o excesso: tarefas, jantares, planos, expectativas, tradições, comparações.
Não é falta de espírito natalício. É o sistema nervoso a avisar que talvez estejamos a pedir mais do que conseguimos dar.
O que fazemos com este pré-Natal emocionalmente exigente?
Talvez possamos começar por baixar a guarda.
Lembrar que alegria não é obrigatória. Que o Natal perfeito não existe. Que dizer não é saudável. Que presença não substitui amor e presentes menos ainda. E que sentir-nos mais lentos, mais silenciosos ou mais cansados não significa falhar… significa ser humano numa época que pede demasiado.
Entre o Natal ideal e o Natal real existe um espaço possível com menos ruído, mais verdade, menos exigência e mais empatia.
Talvez seja isso que este Natal nos pede. E talvez seja suficiente.

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