sexta-feira, 7 de novembro de 2025

Por mais apagões digitais, em prol da nossa saúde mental

Havendo uma necessidade atual e premente de repensarmos a nossa sociedade em prol da nossa saúde mental, existem alguns tópicos que merecem reflexão:

– Tudo começa dentro de casa. Antes de vermos políticas transformadas em ódios, já existiram discursos prévios, de generalização, ostracização de tudo o que de mal acontece na nossa sociedade, criando-se bodes expiatórios para as nossas próprias frustrações e fracassos, nos outros. As conquistas são feitas por nós, sozinhos, mas as derrotas têm sempre a mão ou culpa de alguém: este é o pensamento de quem nunca se responsabiliza, e são estes os valores, que de forma consciente ou inconsciente, veiculamos.

– As crianças e jovens de hoje estão a ser educadas pelos adultos de hoje, e como serão os de amanhã? É tempo de pararmos e olharmos para o nosso jardim, a nossa casa. Que valores preconizamos? Quem educa os nossos filhos? Somos nós, o telemóvel, as redes, os youtubers, as perceções erradas da realidade? Antes da escola, sociedade, nós, pais temos que as monitorizar, só depende de nós, a educação começa em casa. As crianças e jovens aprendem por modelagem. Eu não posso exigir que não estejam constantemente agarrados ao telemóvel, ou que não sejam tolerantes e empáticos, se eu como mãe/pai faço exatamente o contrário: “children see, children do”. Não é suposto não conhecermos os nossos filhos, nem os seus ídolos, aquilo que pensam sobre si próprios, sobre os outros, como lidam com isso, com quem se relacionam e o que pensam aqueles com quem se relacionam. Temos que começar já a cuidar do nosso “jardim”, dos que nos rodeiam. Se todos fizerem o seu papel, se não for uma constante demissão de responsabilidades por falta de tempo, o mundo a pouco e pouco será um mundo melhor. Se fazemos o nosso papel, e ainda assim surgem dificuldades, saibamos pedir ajuda, estar alerta, saber ouvir, saber estar. Se eu não sei fazer, admito que não consigo, e peço ajuda também para mim, para o outro. Nós só nos conseguimos controlar a nós próprios, então porque não começarmos pelo nosso “jardim”, pela nossa casa – o que é que eu posso fazer? Em que é que eu posso tornar o mundo melhor?


Há cada vez mais problemas de saúde mental, sim, mas em vez de nos preocuparmos em tentar perceber o porquê e de construir soluções ao nível macro da nossa sociedade, há um aproveitamento das redes sociais em destilar todas as tragédias com parangonas sensacionalistas, com títulos catastróficos que, quando se abre a publicação, nada têm a ver com o assunto. Isto é grave, é provocar ruído, instabilidade, informação falsa. Falta bom senso, toda a sociedade precisava de um banho de sensatez. Falta empatia no meio da desgraça, e uma preocupação genuína em resolver as coisas, não um “não é na minha em casa, o outro é pior que eu, deixa-me empolar as suas derrotas, com a satisfação de que não estou pior do que ele, a mim nada me acontece”…. Mas, atenção! Todos temos “telhados de vidro”, e a qualquer instante, uma “pedra” abala o nosso sistema aparentemente controlado, e obriga-nos a refletir que não somos mais do que os outros. Saibamos ser humildes. Quem realmente tem sabedoria e conhecimento de causa, não precisa de dizer que a tem, nem ostentar que a tem, com sobrancerias demagógicas, é simples na convivência e pretende ajudar genuinamente os outros a alcançar os seus propósitos. Mas vivemos numa era do “cada um por si”, de individualismo e indiferença, da competição, do “xico-espertismo”.

Segundo o Dr. João Paiva (professor da Universidade do Porto), vivemos na era do “dadismo: quem tem mais informação tem mais poder e, a meu ver, é um perigo haver pessoas que usam a informação de forma negativa, pessoas com grande visibilidade mediática, que podem chegar a milhares. Estas pessoas têm por isso responsabilidades acrescidas para não fomentar discórdias, medos e não cair num sensacionalismo de desinformação, medo e desconfiança. Sejamos razoáveis!! É isto que queremos deixar aos nossos filhos, netos, bisnetos? Uma sociedade que alimenta ódios, que se autodestrói?

– Sinto-me incomodada com a crescente falta de empatia na sociedade. A total ausência de empatia é um sinal alarmante, antissocial e de psicopatia. Lembro-me de quando o meu filho mais velho era pequeno, de estar atenta a sinais de empatia e, mais tarde, o pensamento é o mesmo. As notas também são importantes na medida em que deve haver esforço, valorização do trabalho como um meio a atingir um objetivo, mas isso só por si é vazio. Do que vale as crianças e jovens em alguns casos serem excelentes academicamente. Se não têm valores empáticos, que sementes deixarão na sociedade de amanhã?

Todos os pais/mães e profissionais estão em crescimento do ser-se pessoa, somos todos imperfeitos, temos sempre, até morrer, algo a aprender, e saibamos ter essa humildade. Mas o conselho que deixo é estar-se atento, perceber aquilo que os nossos filhos veem, que opiniões têm, como se relacionam com os outros, o que ambicionam e, por muito que seja difícil, e eu bem sei, procurar momentos de puro detox de telemóveis (TODOS, pais e filhos), um apagão forçado como aquele que tivemos, e que tanto nos fez refletir. Como isso reavivou formas de convívio e de estar! É complicado, porque vivemos numa dicotomia em que precisamos da tecnologia e temos forçosamente que a incluir para não ficarmos infoexcluídos, ou se não estivermos nas redes desaparecermos, mas como somos nós enquanto pessoas reais?

Voltando a citar o Dr. João Paiva, de uma forma geral tudo na vida, e neste caso a tecnologia, pode ser boa ou má mediante o uso que lhe damos – pode ser tónica (alimentar-nos de forma positiva) ou tóxica (sendo um veneno). Não deixemos que as tecnologias nos deixem a nós, ou às nossas relações, tóxicos.

Se eu deixasse de ir às redes sociais a minha rede de suporte social “real” morria? A resposta é não! Seria talvez mais verdadeira, obrigava-me a ligar mais, a procurar estar mais presencialmente com o que realmente importa. Porque, caro leitor, aqueles que nos dizem mais, não se preocupe, não desaparecem das nossas vidas, seja um contacto diário, semanal, mensal, ou que seja anual! Por isso fica a reflexão e o exercício para que saibamos parar, e para que usemos as tecnologias a nosso favor e não contra nós e, principalmente, contra as futuras gerações. Não para nos alhearmos, e muito mais para não alhearmos os nossos bens mais preciosos, os nossos filhos! Para que não nos transformemos nuns estranhos nas nossas próprias casas.

Concluindo e citando Eugénio de Andrade: “É urgente o amor (…) É urgente destruir certas palavras, ódio, solidão e crueldade” – eu acrescento, é urgente PARAR e REPARAR – “É urgente o amor, é urgente permanecer.”

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