sábado, 11 de outubro de 2025

Geopolítica dos imperadores

Observamos já há algum tempo o processo de retração do multilateralismo na geopolítica global do Século XXI.

É tempo da saga imperial da China de Xi Jimping, dos Estados Unidos de Donald Trump, e da Rússia de Vladimir Putin. A ascensão do oriente, a decadência relativa do ocidente, e o permanente papel da Rússia como “máquina de pesadelos do ocidente”.

Todos em ritmo de ampliação e defesa dos seus respectivos impérios, sob a égide da guerra de dissuasão dos drones, da Inteligência Artificial e do poder nuclear.

Um contexto da confluência de autocratas e magnatas digitais, como descrito por Giuliano Da Empoli em sua obra mais recente: “A hora dos predadores”.

Trata-se, na prática, da tríade tecnologia, guerra e poder. A sedução do ocidente e do oriente por assim chamados oligarcas tecnológicos das Big Thecs e autocratas carismáticos.

No topo, a busca pela supremacia geopolítica e áreas de influências dos impérios, em movimentos centrípetos na direção dos EUA, da China E da Rússia.

No palco principal, as lideranças de perfis autocratas de Donald Trump, Xi Jinping e Vladimir Putin. Imperadores “in pectore” na lógica da manipulação e da conquista.

Todos com perfis semelhantes. Homens de poder e autoridade. A verticalização do poder e o explícito monopólio (legítimo) da força, colocando as forças armadas na vertical do poder. A defesa permanente da soberania, mais explícita no caso da Rússia do Czar Vladimir Putin.


Vale uma breve pontuação dos perfis destes líderes.

Donald Trump, empresário de perfil transacional, foi catapultado na política americana em 2016 pela lógica das máquinas digitais dos “engenheiros do caos”, nas redes sociais e no ciberespaço. O reforço da polarização política.

É boa hora para ler, ou reler, o livro “Engenheiros do Caos”, também de Giuliano Da Empoli. Ele narra os fatos, eventos e fenômenos que convergiram para a ascensão dos físicos, cientistas e consultores especializados em Big Data, oriundos das premissas da física quântica. Criaram, na metáfora de Empoli, “partidos-algorítmos”, sobrepujando os partidos políticos tradicionais.

Entenderam e canalizaram o espírito da época para a construção do neo-populismo. O nome do jogo é engajamento. Para canalizar o medo, a raiva, o ódio e a cólera. Escolhendo inimigos políticos para calcificar a polarização política, em causação circular. Cultivar a cólera e estimular o narcisismo das “selfies”, para criar sensação de pertencimento, tensionando a polarização política com os seus algorítmos.

Esvaziam a possibilidade de moderação política. Estimulam os extremos. Opção pelo radicalismo. Inspirado em 2016 por Steve Bannon, Trump, assim como Jair Bolsonaro, segue a trilha de Carl Schimitt, citado por Empoli: “a política consiste, antes de tudo, em identificar o inimigo”.

(Parênteses: com a recente abertura de diálogo entre Trump e o presidente Lula, os brasileiros vão poder entender melhor o perfil transacional e imperial do presidente Donald Trump).

Já Xi Jinping, agora também sob a égide das máquinas digitais, dos algorítmos e da militarização do poder político, teve uma trilha de vida sinuosa entre uma infância de privilégios políticos, com seu pai e ao lado de Mao Tsé-Tung, e uma adolescência de duras condições, pois seu pai foi perseguido e preso durante a Revolução Cultural (1966-1976).


Xi Jinping foi enviado para o campo e viveu em duras condições, morando numa caverna. Depois, formou-se em engenharia química e ascendeu na trilha da nomenclatura do Partido Comunista. Entrou para o órgão supremo do poder político na China, o Comitê Permanente do Politburo.

Em 2012 ascendeu ao topo. Tornou-se secretário-geral do PCC. E já em 2013 assumiu a presidência da China. Firmou-se como o líder mais influente do país, a partir do mito do “Sonho Chinês”: prosperidade, força militar e influência internacional. A busca do império chinês e do imperador Xi Jinping.

Ele pode permanecer no poder por tempo indeterminado. Expandiu com determinação, paciência e discrição a influência internacional da China com a ”Iniciativa Cinturão e Rota”, conectando o país a dezenas de outros países com projetos de infraestrutura e comércio.

Com a proverbial sabedoria chinesa de pensar a longo prazo e com visão histórica, Xi Jinping alcançou forte influência na política chinesa e no cenário internacional.

Dialoga bem com Putin e Trump. O avanço do capitalismo e da plutocracia os une, apesar dos recorrentes ruídos de comunicação e demonstrações de força.

Por último, Vladimir Putin. De origem humilde, formou-se em Direito em 1975 e ingressou na KGB, a polícia secreta soviética. Nos anos 1990 mudou-se para Moscou e tornou-se diretor da FSB (ex KGB). Em 1999, tornou-se primeiro ministro do então presidente Boris Yeltsin. Em 2000 foi eleito presidente. Está há 26 anos no poder.

Uma trajetória de poder. De verticalização de poder, de fortalecimento do Estado e de controle dos meios de comunicação e supervisão dos oligarcas empresariais. O Estado acima de tudo e a busca da soberania russa no contexto global. Ampliando a influência russa até a guerra da Ucrânia.

Para os russos, diz Giuliano Da Empoli em “O Mago do Kremlin”, “Putin representa a estabilidade e a grandeza da pátria mãe”.

Como um “Siloviki” – ou seja, um homem da força dos serviços secretos – Putin não só se tornou, segundo Empoli, o mais poderoso e o mais sensato dos “Siloviki”. Ele também construiu uma nova elite, concentrando o máximo de poder e o máximo de riqueza, com oligarcas da sua confiança.

Sua obsessão é lutar contra os separatistas e colocar fim à desintegração da Rússia, diz Empoli.

Guerra, poder e tecnologia. É também a tríade de Putin. Na sua (dele) Rússia como “democracia soberana”.

Os imperadores se entendem no essencial/estrutural.

São contidos pela nova guerra de dissuasão e pela confluência de interesses dos oligarcas digitais e das plutocracias do capitalismo sem rivais.

Movimentos históricos que contém a retomada do multilateralismo na geopolítica global.
Antônio Carlos de Medeiros

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