No último daqueles textos antigos, eu escrevia amedrontado: “Pense bem no que você vai fazer no próximo fim de semana. Quer dizer, pense bem em como você vai votar no domingo, em quem e por quê.” E eu acrescentava que “não gostaria que o Brasil passasse por um recuo político e ético como o que está sendo prometido pelo provável vencedor e seus apoiadores.” Não deu outra.
Mas não era disso que eu queria falar. Outros jornalistas, escritores e palpiteiros, sobretudo no mundo digital em que tudo pode, estavam e estão fazendo isso com muito mais talento, argumento, empenho e sabedoria. O que eu queria e ainda quero falar é dos quatro anos que se seguirão ao resultado eleitoral de outubro. Durante os próximos quatro anos, um dos dois reinará sobre a população brasileira e é de seu comportamento que devemos cuidar. E para isso precisamos nos preparar.
E aí eu escrevia o que vale até hoje e valerá sempre: “Em primeiríssimo lugar, exigindo que o vencedor respeite a Constituição que nós todos, expressa ou implicitamente, juramos respeitar. Governar sem observar respeito à Constituição é como viver numa selva em que só a violência e o acaso decidem o que deve acontecer.”
Não se trata de mera formalidade que os governantes tratarão de interpretar ao sabor de seus interesses políticos e administrativos. Mas de uma necessidade sem a qual não saberemos como nos mover, as regras sob as quais o país sobrevive com alguma dignidade, identidade e unidade de propósitos, um conjunto de condições sem as quais nada faz sentido, sem as quais não saberemos nunca onde fica o gol adversário e mesmo o nosso. Não levá-la em consideração é declarar-se perdedor antes de o jogo começar.
A cultura do povo que a Constituição deve representar é a soma de seus hábitos e costumes, dos meios que, ao longo do tempo, escolheu para viver. Mas não apenas o jeito majoritário de viver e sim todas as formas que, mesmo minoritárias, não signifiquem prejuízo para o outro.
A verdadeira democracia é aquela que garante à maioria a liderança da sociedade e reconhece o direito das minorias se manifestar e viver do jeito que julgar mais apropriado, saudável e conveniente sem fazer mal a ninguém. Se no discurso dominante não houver pelo menos uma pequena probabilidade de o contrário estar certo, ele será sempre um discurso autoritário que não serve a nosso progresso material e espiritual.
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