sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022
Pátria assassina
Dia desses mataram alegria, grávida de quatorze semanas, bala perdida, digo, bala encontrada. O bom senso, que já andava capenga, foi morto a pauladas atrás de um quiosque no Rio de Janeiro ao cobrar o seu sustento. A empatia também foi estrangulada no estacionamento de um supermercado. O afeto saiu pra trabalhar e não voltou mais, não encontraram o corpo até hoje. Ajuntamento na esquina da Assis Brasil com a Sertório, cena forte, compaixão destroçada no asfalto quente, pernas e braços amputados, foi atingida por um carro na contramão, o motorista fugiu sem prestar socorro. Alguém serviu pra boa fé, moradora de rua, um prato de comida misturada com pó de vidro. Gratidão morreu de sede. Coragem suicidou-se. Autoestima pulou do terraço de salto alto, do prédio mais alto, da Avenida Paulista. A generosidade foi vista a última vez, doente, todos os dentes podres, pedindo esmola na Cracolândia. Com a tolerância foi cirrose, nem transplante de fígado a salvou. O carinho adoeceu de repente, foi definhando, definhando, amarelou, perdeu os cabelos, já não se alimentava mais, até que não resistiu. No atestado de óbito do encantamento dizia: morte por causas naturais. Doação afogou-se na última enchente. Compreensão pegou fogo, incêndio criminoso. Esfaquearam a dignidade em plena luz do dia, ninguém fez nada. O respeito perdeu-se por completo, não foi mais visto nem é lembrado. Com o perdão foi latrocínio. Felicidades morreu de saudade. A liberdade está sendo caçada, dois olhos arregalados, esconde-se como pode. Perdão pegou perpétua, tuberculoso, agachado no canto de uma cela fedorenta. A fé teve morte cerebral. A humanidade não encontrou vaga na UTI, não há previsão de melhora. Esperança, entubada, ainda resiste ligada em aparelhos.
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