sábado, 3 de julho de 2021

À prova de blindagem

Nas últimas semanas, a CPI nos tem brindado com as sôfregas tentativas da tropa de choque de Jair Bolsonaro de blindá-lo da acusação de, em plena pandemia, ter feito do Ministério da Saúde um balcão de negócios assassinos. Se Millôr Fernandes estivesse entre nós, diria que, por enquanto, essa blindagem só resultou no rabo escondido, com o gato de fora. Ao ouvir isso, eu, com uma intimidade garantida por 40 anos de amizade, pediria a Millôr para não meter os gatos nessa história. Os animais que a povoam são de outra espécie —os ratos, de que o ratão-mor se cercou nos subterrâneos de seus palácios e do dito ministério.

O verbo blindar nos chegou do alemão “blenden”, através do francês “blinder”. Os ingleses o acolheram como “to blind”. Todos significam a mesma coisa: cegar, ofuscar, embaçar, desbotar. Como as línguas são vivas, blindar gerou também proteger, escudar, defender, revestir, couraçar, tapar. E, numa variante sinistra, tapear, enganar, iludir, ludibriar, entulhar —obstruir.


É no que estão se agarrando os esforçados senadores que defendem Bolsonaro, perdendo todas até agora. E como não perder? Deve ser difícil blindar alguém que, com incrível coerência, cercou-se —subitamente ficou claro— de empresários canastrões, militares suspeitos, juízes oportunistas, ministros das sombras, intermediários de mutretas e agentes de propina, sem falar nos valentões da internet e militantes do ódio, todos deixando suas digitais em tudo que tocam. Como blindar Bolsonaro se os discursos que proferem são desmentidos pelos vídeos e áudios mais comprometedores gravados pela turma do patrão?

A avalanche de suspeitas e denúncias de corrupção só começou. Em breve, não haverá blindagem que chegue, e os aliados de hoje cairão fora para salvar a vida.

Só será triste se, um dia, Bolsonaro for levado aos tribunais apenas como ladrão —não como genocida.

Nenhum comentário:

Postar um comentário