É curioso notar o encadeamento da retórica de Celso de Mello. Ele falou de "espectros", um outro nome para assombrações. Mencionou "surtos autoritários", "manifestações de grave intolerância que dividem a sociedade". Citou "delinquentes" que vivem "no submundo digital". Insinuou que essa gente que ele não identifica tem um projeto de poder que ameaça "a República democrática e laica". Depois, disse que o Supremo, a despeito das pressões, não deixará de cumprir o seu papel constitucional.
O ministro precisa dar nome às suas assombrações. Uma coisa é a delinquência, outra bem diferente é o sacrossanto direito à livre manifestação. Se há delinquentes rondando o Supremo, que sejam abertos os inquéritos, com a participação do Ministério Público. Se o que chega ao Supremo são mensagens com críticas à possibilidade de recuo na regra que permitiu o encarceramento da delinquência com pedigree, os ministros que abram os olhos. Que abram, sobretudo, os ouvidos.
O Supremo gosta muito de falar. Mas precisa começar a aprender a ouvir. As punições do mensalão e do petrolão fizeram brotar na alma dos brasileiros uma espécie de mania de justiça, um sentimento civilizatório. Para satisfazer esse sentimento, a Justiça precisa levar às últimas consequências o princípio segundo o qual todos são iguais perante a lei. E esse princípio não estará assegurado se for restabelecido o ambiente em que, acima de um certo nível de renda e poder, ninguém será punido no Brasil.
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