Desejam voltar à era dos showmícios, quando candidatos atraíam o público às praças com a magia musical e, nos intervalos, vendiam alegres utopias, logo desmentidas pela realidade. Quem mais abusou do artifício foi Fernando Collor, na campanha em que derrotou Lula 29 anos atrás.
Na essência, esse bloco partidário que se autodenomina de esquerda protocolou no Supremo uma confissão de impotência para renovar seu projeto, lideranças, meios de se comunicar e a própria mensagem.
O refúgio no túnel do tempo ajuda a dissimular a incapacidade de entender as ansiedades do eleitorado, que não vê uma cisão entre “trabalhadores” e “burguesia”, mas enxerga com nitidez um confronto entre Estado e cidadãos, entre a sociedade e seus governantes — como demonstram pesquisas do PT na periferia de São Paulo.
Em Pernambuco tem-se outro exemplo dessa fuga nostálgica. Partidos e candidatos se transformaram em reféns de dois personagens — um mito e um encarcerado.
Morto há 13 anos, o ex-governador Miguel Arraes paira sobre a cena estadual em que se tornou mítico, depois de dominá-la por mais de cinco décadas. Dois dos três candidatos ao governo estadual disputam sua memória nessa eleição.
De um lado está Paulo Câmara, governador em busca da reeleição pelo PSB. Burocrata do Tribunal de Contas, foi ungido por Eduardo Campos, neto de Arraes, quando deixou o governo em 2014 para se candidatar à Presidência da República (Campos morreu num acidente aéreo).
Na oposição está Marília, 34 anos, neta de Arraes. Vereadora no Recife, rompeu com os primos do PSB e migrou com o sobrenome para o PT. É candidata ao governo contra a vontade da burocracia petista, que deseja sua renúncia. Motivo: uma aliança com o PSB aumentaria em 51% o tempo de propaganda eleitoral do PT (de 171 para 258 minutos).
Paulo e Marília também cultuam Lula, pernambucano do agreste, há mais de cem dias cumprindo pena em Curitiba por corrupção e lavagem de dinheiro. Ao ritual juntou-se um terceiro candidato a governador, Armando Monteiro (PTB), cuja origem remonta às usinas de açúcar e ao sistema financeiro.
À sombra do mito e do cárcere criou-se um impasse entre o PSB dos Arraes e o PT de Lula. Derivou na imobilização de quatro partidos (PCdoB, PDT, Pros e Rede). No fim de semana, o PT adiou suas convenções no Amazonas, Amapá, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Tocantins e Rondônia.
Outros candidatos também preferem o gueto da ilusão e da saudade. Jair Bolsonaro (PSL) transformou sua campanha presidencial em homenagem à tortura e à matança dos adversários, na efusão de sangue patrocinada pela ditadura militar. É o mesmo regime que o julgou por traição à farda, acusando-o como autor de um plano para explodir quartéis no Rio dos anos 80.
Embriagados de nostalgia, eles se abstraem do debate de alternativas reais às agruras do presente compartilhado por 175 milhões de dependentes da combalida rede pública de saúde, e por 13,5 milhões de desempregados que perambulam no inverno das maiores cidades.
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