terça-feira, 1 de maio de 2018

Pedir 'esperança' a desempregado é crueldade

Pela lógica, se um presidente da República tivesse que aparecer para os desempregados, não se atreveria a surgir em outra forma que não fosse a de uma carteira assinada. Mas a impopularidade subiu à cabeça de Michel Temer. Quando um presidente ocupa rede nacional de rádio e TV para celebrar o Dia do Trabalho e pede “esperança” a quem está no olho da rua, revela-se ilógico. Quando faz isso apenas três dias depois de o IBGE ter anunciado que o número de desempregados cresceu, atingindo a marca de 13,7 milhões de brasileiros, Temer mostra-se cruel.

Disse o presidente a certa altura: “Você, trabalhador que procura trabalho, não perca a esperança. O Brasil está crescendo, e, a cada dia, estamos criando mais postos e mais oportunidades.” A realidade é bem outra. Os dados do primeiro trimestre reforçam as dúvidas quanto ao fôlego da retomada do crescimento econômico. Em meio às incertezas eleitorais e ao surto de imoralidade, sobram razões para apreensão.


Além de perturbar os desempregados, Temer injetou no pronunciamento do Dia do Trabalho o anúncio de que decidiu aumentar o valor do benefício destinado às famílias que frequentam as franjas da sociedade, sem acesso ao trabalho formal. “Nesse 1º de Maio, o presidente da República não podia deixar de mostrar serviço”, vangloriou-se. “Por isso, anuncio que acabo de autorizar o reajuste do Bolsa Família.” Temer se absteve de mencionar o valor e a data do reajuste.

Mais crueldade: quem ouve Temer fica com a impressão de que o benefício virá mais gordo já neste mês. Na verdade, o reajuste de 5,67% chegará à clientela do Bolsa Família apenas em julho. Os beneficiários xingarão o presidente ao receber o benefício de maio. Voltarão a ofender Temer ao manusear o benefício de julho. E muitos continuarão maldizendo o presidente quando verificarem, em julho, que o aumento elevou o valor máximo do Bolsa Família de R$ 177,71 para R$ 187,79.

Pela lógica, um presidente que não tem o que dizer deveria ficar quieto. Mas a impopularidade tirou Temer do eixo. Foi a segunda vez que o presidente levou a cara ao ar, numa rede nacional, no intervalo de apenas dez dias. No pronunciamento anterior, Temer dedicara-se a se autoelogiar. Revelara-se capaz de analisar quase tudo. Só não foi capaz de fazer o tipo mais precioso de análise: a autoanálise.

Nesta segunda-feira, Temer manteve a cabeça no seu universo paralelo. “Enquanto alguns passam o dia criticando, a gente passa o dia trabalhando”, disse. A julgar pela taxa de reprovação do presidente, a maior esperança acalentada por 7 em cada 10 brasileiros é a de que o tempo voe para que seu governo acabe e Temer possa passar o dia fazendo outra coisa —prestando contas à Justiça, por exemplo.

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