O resultado e o placar deixam uma mensagem eloquente: ao contrário do que tem se dado nos tribunais superiores — onde o Foro Especial tem falado alto —, a Justiça de instâncias inferiores não está disposta a fazer concessões à moderação e à conciliação, ao perdão. O sinal inequívoco é sua disposição punitiva; da busca de seu fortalecimento político e institucional. Provavelmente, também de seu Poder.
Depois, foram as teses gerais de cada um dos desembargadores. Demonstraram que o que mais os tocava era a corrupção sistêmica em que as autoridades, não só do PT, se envolveram. Na existência da corrupção não há novidades, mas foi exatamente neste ponto que morou o centro e o coração da racionalidade dos juízes. O foco da disposição de punir.
Pode-se argumentar a falta de provas; que não se comprovou que o ex-presidente fosse dono ou pelo menos usufruísse do tríplex que, ao final, causou sua ruína. Parece-me que há meandros do Direito que nem o próprio Direito compreende ao certo. OK, pode até ser; formalmente, pode até ser. O caso do sítio, talvez, desse até mais condições de prova. Mas, o fato é que Lula foi condenado pelo conjunto da obra.
Foi punido pelo papel e pelas relações que estabeleceu com os vícios do sistema político, onde, um dia, foi o número um. Teoria do Domínio do Fato, como no Mensalão. ''Tu és responsável por aquilo que cativas''.
Para quem procura olhar para o processo, pelo qual o Brasil está passando, com alguma lucidez e enxergar sem paixão, não há prazer algum na condenação de Lula. Mas é preciso reconhecer que Lula, a maior liderança popular da história do país, e seu partido, que se fundou e se desenvolveu na crítica ética ao sistema político nacional, sucumbiram à tradição clientelista e patrimonialista do Brasil. A questão não foi o tríplex.
Se não força para mudar, Lula e o PT tiveram, pelo menos, a oportunidade de articular estresses e rupturas no sistema político nacional. E não o fizeram. Aliaram-se ao tradicional e arcaico como se esta fosse a única possibilidade e o único modo de fazer política. Lamentável, não por Lula e nem pelo PT. Mas, pela chance perdida. Pela inocência perdida. Pela história perdida.
A pergunta que se fará agora será ''por que apenas Lula''? Disposição em persegui-lo, por tudo o que, um dia, representou? Complô das elites? Ora, não há Comitê Central da Burguesia e nem as elites são organizadas assim. Embora não sejam os únicos, Lula e o PT caíram na rede que ajudaram a tecer.
Mais produtivo, no entanto, será questionar o Foro Privilegiado, exigir seu fim. Apostar que, agora, por onde passou um boi terá que passar toda boiada comprometida. Lutar, sim, mas pela transformação do sistema político, por seu aperfeiçoamento. O maior risco será transformar Lula num mártir apenas por ser o único peixe realmente graúdo fisgado. Outro erro será transformar ''a questão Lula'' no problema central do Brasil, reduzindo o debate eleitoral ao seu azar ou à sua sorte. É preciso olhar para frente, consertar o que está quebrado.
Carlos Melo
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