É bom lembrar. No ano passado, ao cabo de campanhas municipais marcadas pela escassez de recursos técnicos, materiais e financeiros, sem militância paga, houve importante renovação e visível encolhimento de alguns partidos. Ficou nítida, então, no resultado das urnas, esta mensagem: "Senhores, por obséquio, abandonem o recinto". De lá para cá, a disposição para a faxina só aumentou.
Congressistas que precisam comprar suas cadeiras alarmaram-se com a falta de dinheiro que marcou a campanha de 2016. A quem extorquirão agora,? De que servirão os usuais requebros e acenos que sugeriam acesso às facilidades do poder? Onde buscarão os milhões que, bem geridos, enchiam as urnas mais indignas no mercado eleitoral? Tudo indica que a conta sobrará para nós, mediante uma tarrafada legislativa que recolherá, sem dó nem piedade, R$ 3,6 bilhões para a campanha deles no ano que vem. É o preço da democracia", afirmam, simulando nobre proteção a um bem superior. Não, não nos tomem por tão ingênuos. Esse é o preço de vossas cadeiras. É a prudente primeira etapa do "Salvemo-nos todos!".
A segunda etapa pode ser resumida como uma bacanal de interesses escusos, indecência que se imaginaria articulada num ambiente sob mortiça luz vermelha. Refiro-me ao aleijão que recebeu o nome de distritão. Ele consiste em transformar em majoritária a eleição proporcional de deputados, na base do cada um por si e o diabo por todos. Elegem-se os mais votados. Porém, para que os atuais detentores de mandato estejam entre os mais votados, diminui-se radicalmente o número de candidatos. O motivo é óbvio: quanto maior o número de candidatos, menos votos para cada um. Se os eleitores querem renovar, feche-se a parta para os novos candidatos. Assim, inverte-se o procedimento usual. Os partidos, comandados pelos seus parlamentares, em vez de buscarem candidatos para ampliar suas nominatas e bancadas, porão a correr os novos pretendentes, assegurando, por falta de alternativa, as cadeiras dos que já têm.
É o mais recente truque da cartola dos corruptos. Corrompe-se a democracia, impedindo que se expresse de modo pleno a firme disposição do eleitorado: "Cavalheiros, abandonem o recinto!". Custo a crer que o STF tolere tão nítida disposição de nossos congressistas de promoverem uma farsa eleitoral. Não perceberá o Supremo aí, o empenho de inibir, por supressão de alternativas, a expressão da vontade dos cidadãos? Não está, a proposta do distritão, em claro antagonismo com princípios essenciais do regime democrático? Será necessário escancarar ainda mais os sinais de má fé legislativa? É sutil a diferença entre a constituinte de Maduro e a reforma política aprovada pela comissão. Ambas estabelecem regras que conduzem a resultados divergentes da vontade social.
Percival Puggina
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