domingo, 12 de março de 2017

O 'monstro'

Li um artigo de José Padilha, em “O Globo”, e dele tiro inspiração, permitindo-me ampliar algumas considerações, ainda supondo que o aumento da confiança no futuro, detectado em vários setores nos últimos dias, cresce na iminência de o “monstro” perder sua força.

Na base do sistema político brasileiro, sustenta José Padilha, opera um ‘mecanismo’ (para mim, um “monstro”) de exploração da sociedade formado por quadrilhas de fornecedores do Estado e partidos políticos que contam quase sempre com o apoio e a omissão dos demais Poderes.

O “monstro” toma conta de todas as esferas públicas: Legislativo e Executivo, dos governos federal, estaduais e municipais, e, ainda, das empresas estatais. Usa de superfaturamento de obras e de serviços prestados, ou meramente fictícios, “legitimados” por contratações aparentemente corretas, mas fraudadas e perversas.


Adota-se qualquer tipo de falsidade, prevaricação, autoritarismo, cooptação, submissão, intimidação, burocracia, conluio, perseguição para se auferir riqueza ilícita. A burocracia, em especial, é o instrumento que o governante adota como biombo para alcançar “legalmente” seu interesse pessoal e o enriquecimento.

Quanto mais evoluída e justa uma sociedade, menor é a burocracia adotada, e maior a transparência, a simplicidade das leis. O Brasil é o exemplo daquilo que não deve ser feito.

Os tentáculos do patrimonialismo abrangem tudo, até medicamentos, prestações de serviços de saúde, merenda escolar, cestas básicas, verbas de filantropia. O sistema do “monstro” é a “pilantropia”, ou cleptocracia.

Claro que a corrupção sempre existiu, e vai de um a cem. Agora se mostrou soberana, arrogante, totalitária, absoluta, além dos cem.

No Poder Legislativo, legisla-se para extorquir, intimidar, burocratizar, para revender facilidades e tudo mais que permita aos delinquentes auferir vantagens injustas.

Legisla-se como legislariam ladrões que cobram pedágio das caravanas. A compra de Medidas Provisórias (MPs) sistematizou-se e impediu que boas propostas fossem adiante; o que é bom para o legislador corrupto não é a boa, mas sim a péssima lei que privilegia, subjuga, favorece, discrimina. As MPs eram compradas e pagas. Os tribunais como o Carf foram a serviço de quem queria extorquir num fácil contexto de falta de claros marcos regulatórios.

Quadrilhas instaladas em tudo dominam e apequenam o país. Inviabilizam o bom e o honesto. Quanto pior a qualidade, melhor para o “monstro”, que mais poderá cobrar. Bastante comum em Brasília alguém questionar: “E eu, o que ganho?”. Sem pagar pedágio, as coisas param.

Um bom projeto não consegue encontrar maioria entre os lobos. O Brasil no cipoal das delinquências.

A definição mais acertada de “empreiteiro” foi dada por um megaempresário, que do setor sabe tudo: “Empreiteiro (grande) é aquele que, para ganhar dinheiro, faz qualquer coisa, até obras”. A Lava Jato certifica como inconteste a fulgurante explicação.

O “monstro” é um delinquente, sem escrúpulos e sem limites. Usa de qualquer oportunidade e brecha, adota a mídia mercenária para perseguir, usa da corrupção irrestrita, da arapongagem e até apela para a supressão da vida, como se deu com Celso Daniel. Mas a maioria das supressões de arquivos vivos é executada desidratando, apagando os alvos com humilhações, infâmias, lançando pedras e escondendo a mão.

O “monstro” se mobiliza em campanhas políticas, vive-as com frenesi, pois do resultado das urnas depende o ganho que terá. Investe como um apostador de roleta. Monta “operações estruturadas” e até bancos para superpropinas e financiamento dos corruptos. Por isso, os bilhões, inverossímeis, são apenas fichas do “monstro” no jogo de exploração. O que for apostado, sabem, voltará centenas de vezes.

Nos últimos 50 anos, as marionetes que ocuparam o poder, quase sempre, eram eleitas pelo “monstro”, que é avesso ao suor e quer ganhar muito, rápido e fácil.

No sistema político brasileiro a ideologia serve de fantasia, de roupagem nas festas do “monstro”.

Ele nunca reclama de aumentos de tributos, farta-se com eles, sabem que deles tirará seu quinhão.

O “monstro” isola políticos não alinhados ao mecanismo, inviabiliza-os eleitoralmente despejando recursos para os alinhados com as quadrilhas. Mesmo ácidos e intragáveis, os cúmplices do “monstro” se reelegem.

A Lava Jato escancarou o “monstro”. Comprovou que detesta candidatos inteligentes, éticos, honestos. Raros são aqueles que se viabilizam nas urnas e exercem um mandato. O Congresso é cada vez mais corrompidamente pragmático e corrupto. O inteligente-ético não tem vez; chegando lá, em breve sentirá que está impotente a força do “monstro”.

A política brasileira acaba sendo mais fácil para as hienas, que conseguem expulsar rapidamente os podres que o “monstro” oferece.

A cada legislatura o trigo perde espaço assumido pelo joio.

Quem sente o dever, quem quer colaborar com a pátria que ama, deverá estar pronto a responder à pergunta feita com intrigante naturalidade: “Por que você almejou chegar a esse cargo?”. E, se a resposta for diferente de explorar os privilégios, será considerado um ET.

Perderam-se os sentimentos de dever, de serviço, de solidariedade, de progresso, de inconformismo com o sofrimento, como fossem de um planeta extinto, não mais desta Terra.

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